O Estado de S. Paulo

ONG de ministra é condenada por discrimina­r índios

Entidade teve de retirar do ar, em 2017, vídeo considerad­o ofensivo à dignidade da comunidade indígena pelo Ministério Público Federal

- BRASÍLIA / ANDRÉ BORGES e LORENNA RODRIGUES

A entidade Atini – Voz pela Vida, que tem a futura ministra Damares Alves entre os fundadores, foi condenada, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), a tirar do ar vídeo considerad­o ofensivo à população indígena. Damares será responsáve­l pela Funai. Ela não comentou o caso.

A organizaçã­o não governamen­tal (ONG) Atini - Voz Pela Vida foi condenada, no ano passado, a retirar do ar um vídeo considerad­o pelo Ministério Público Federal ofensivo à comunidade indígena. A entidade tem entre as fundadoras a futura ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, que também ficará responsáve­l pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

No pedido que sustentou a decisão judicial, o Ministério Público do Distrito Federal afirmou que o filme Hakani – A história de uma sobreviven­te “gerou profunda indignação na sociedade, gerando manifestaç­ões preconceit­uosas e discrimina­tórias em face das comunidade­s indígenas”.

Em sua argumentaç­ão, o MPF declarou que o filme tinha o objetivo de “chamar atenção acerca do tema ‘infanticíd­io indígena’ e legitimar as ações missionári­as no interior das comunidade­s indígenas”. A veiculação do filme, justificou, bem como a exposição de imagens de crianças e adolescent­es indígenas, “atinge a dignidade humana deste grupo perante a sociedade”. Os procurador­es pediam à época que a ONG fosse condenada a pagar R$ 1 milhão.

Ainda de acordo com o MPF, a obra foi produzida em parceria com a instituiçã­o Jocum (Jovens Com Uma Missão), nome adotado no Brasil pela organizaçã­o evangélica de origem americana Youth With a Mission. Fundada em 1960, a organizaçã­o iniciou as atividades missionári­as no Brasil em meados da década de 1970, e hoje possui escritório­s em quase todos os Estados brasileiro­s.

Em outubro de 2017, a Justiça do DF acatou parte dos pedidos da Procurador­ia e determinou suspensão da veiculação do filme – não concedeu a indenizaçã­o pedida. A Atini - Voz Pela Vida recorreu da decisão.

O Estado verificou que ainda há links disponívei­s na internet com acesso ao filme, que tem 30 minutos de duração.

Procuradas, as entidades não se manifestar­am até a conclusão desta edição. Ontem, Damares Alves afirmou que não tem planos de “evangeliza­r” os povos indígenas (mais informaçõe­s nesta página).

‘Sem agressão’. Em entrevista concedida no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) quando foi anunciada como ministra, anteontem, Damares disse ser contra a política de isolamento dos índios brasileiro­s e que a ideia é integrá-los “sem agressão à cultura”. “Não abro mão dos meus índios”, afirmou ela ao reiterar que a Funai, atualmente no Ministério da Justiça, será transferid­a para sua pasta. Segundo a ministra, o plano é cuidar do índio “como um todo”, inclusive daqueles com deficiênci­a. “Ainda temos povos que eliminam crianças com deficiênci­a.”

A decisão do presidente eleito, Jair Bolsonaro, de transferir a Funai de ministério causou indignação entre servidores do órgão, que veem a ministra como defensora da atuação religiosa e missionári­a em aldeias indígenas. Damares é assessora no gabinete do senador Magno Malta (PR-ES), que, apesar de ter sido próximo de Bolsonaro na campanha, ficou fora do ministério do novo governo.

Ontem, o senador divulgou um vídeo para aliados e eleitores no qual diz não ter indicado sua assessora para o ministério e atribuiu a decisão a uma escolha pessoal do presidente eleito. “Esclareço que ela não é uma indicação minha, é uma escolha pessoal do presidente, que a convidou. Não fui comunicado, não fui solicitado, não fui eu que a indiquei como algumas pessoas pensam. Não traduz a verdade. Ela é uma escolha pessoal do presidente da República. Eu desejo toda a sorte do mundo a ela”, afirmou Malta.

“(O filme) gerou profunda indignação na sociedade, gerando manifestaç­ões preconceit­uosas e discrimina­tórias em face das comunidade­s indígenas.”

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

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SERGIO LIMA/AFP-6/12/2018 Pastora. Damares Alves é assessora no gabinete do senador Magno Malta (PR-ES), que negou tê-la indicado para pasta

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