‘Choro pelo meu filho, mas ergo a mão ao céu por minha mulher’
Idoso reconheceu corpo do caçula, que foi à igreja com a mãe; caso retoma debate sobre flexibilizar venda de armas no País
Amparado pelo filho e pelo neto e aos prantos, o aposentado Milton Monteiro, de 71 anos, foi ontem à tarde ao Instituto Médico-Legal (IML) do Cemitério Parque Nossa Senhora da Conceição, em Campinas, para reconhecer o corpo do caçula, Sidnei Vitor Monteiro, morto por um atirador na Catedral Metropolitana da cidade. A mulher do idoso também foi baleada, mas não corre risco de morte.
“Ao mesmo tempo em que choro pelo meu filho, ergo a mão para o céu por minha mulher (Jandira, de 65 anos). Ela parou a bala com a mão e graças a Deus está viva”, contou o aposentado. Ele diz não saber como dar a notícia da morte de Sidnei à mulher, com quem é casado há 50 anos. “Ela falava com ele por telefone dez vezes por dia. Eram grudados.”
Sidnei Vitor era ajudante de eletricista na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e se encontraria com a mãe para ir ao dentista. “Ela é muito católica, decidiu rezar na catedral. Foi aí que aconteceu”, disse Monteiro. A mãe levou um tiro na mão, que havia erguido para tentar se proteger, e a bala ainda atingiu a clavícula.
A empregada doméstica Edna Rodrigues chegou aflita ao IML ontem, em busca de informações sobre a irmã Lourdes, de 79 anos. Ficou aliviada ao saber que ela estava fora de perigo. A idosa foi atingida por um tiro e encaminhada ao Hospital Mário Gatti. “Não vai precisar nem de cirurgia. Graças a Deus. Ela vive na igreja e eu também. Era para estar lá, mas peguei uma faxina. Foi por Deus.”
Armas. O caso ainda reabre a polêmica sobre flexibilizar a venda de armas de fogo no País, bandeira do presidente eleito, Jair Bolsonaro. Major Olímpio (PSL), senador eleito, disse que crimes assim geralmente são com armas ilegais e afirmou que, como está, o Estatuto do Desarmamento fez um “empoderamento” dos bandidos. “Flexibilizar o estatuto é estabelecer regras de controle.” Já o ministro extraordinário da Transição, Onyx Lorenzoni, disse que a tragédia não muda a disposição do futuro governo em liberar a posse de armas e destacou o “direito à legítima defesa”.
Já para o especialista em segurança da Fundação Getulio Vargas (FGV) Rafael Alcadipani, o ataque reforça o risco de armar a população. “Quanto menos arma, menos crime. É o que mostra a maioria dos achados científicos sérios.” Estudos, disse, mais recentes apontam que um crescimento de 1% na circulação de armas pode causar alta de 2% nos crimes em geral. Mais casos. Também em Campinas, há dois anos, outro ataque com arma de fogo deixou 13 mortos. Um homem atirou contra a ex-mulher, o filho e outros parentes durante festa de réveillon e depois se matou.
Em Goiânia, com arma da mãe policial, um adolescente matou dois colegas na escola e feriu quatro no ano passado. E, em 2011, um jovem atirou contra alunos em uma escola de Realengo (RJ), matando 12 crianças.