Descuido com os alunos
Os 3,5 milhões de alunos das escolas públicas de São Paulo correm o risco de começar o ano letivo sem material escolar. Não faltam às autoridades responsáveis explicações de natureza técnica ou jurídica para o despropósito. Mas é inaceitável que o Estado mais rico do País não seja capaz de planejar suas ações sendo conhecida de antemão toda a burocracia que deve ser superada para que a população seja atendida em suas necessidades mais prementes.
Por meio de nota, a Secretaria do Estado da Educação informou que no início do mês a Justiça determinou que nova licitação fosse feita. “Um novo pregão será realizado na próxima terça-feira (hoje) e o contrato deverá ser assinado no dia seguinte”, diz o texto. A questão é que os processos licitatórios deveriam estar concluídos em agosto, no máximo em setembro, para que o material escolar chegasse aos alunos no tempo certo.
Em meados de dezembro, o contrato para a compra de insumos básicos para a sala de aula, como cadernos, canetas, lápis e apontadores, ainda não foi assinado. Como o ano letivo na rede estadual começa no dia 1.º de fevereiro e os fornecedores que vencem as licitações têm prazo de até cinco meses, a contar da assinatura do contrato, para entregar os produtos – a propósito, cabe indagar: por que um prazo tão dilatado? –, é praticamente certo que as crianças e adolescentes voltarão das férias sem material escolar ou suas famílias terão de comprá-lo com recursos próprios.
Não ficou suficientemente claro como a Secretaria do Estado da Educação irá assinar o contrato imediatamente após o novo pregão, haja vista que, de acordo com a lei, se abre um prazo para interposição de eventuais recursos uma vez conhecido o vencedor do certame. Isso pode atrasar ainda mais o processo. No entanto, a secretaria parece confiante. Em nota, disse que o material escolar começará a ser distribuído em janeiro de 2019, antes do início do ano letivo.
O problema não se restringe ao material básico dos alunos, como lápis e borracha. As apostilas didáticas que integram o programa São Paulo Faz Escola, usadas em toda a rede estadual há dez anos, também não serão entregues porque passam por processo de revisão para adequação à nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), aprovada pelo Conselho Nacional de Educação no início deste mês. “Há um grande risco de a aprendizagem dos alunos ficar comprometida”, afirmou ao Estado a educadora Anna Helena Altenfelder, presidente do conselho do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec).
O problema afetará não só os alunos das escolas da rede estadual, mas também os de alguns municípios que são atendidos pelas compras centralizadas pelo Estado. Problemas nos pregões levaram a Justiça a determinar a interrupção do processo licitatório.
Faria bem à sociedade se o sistema de compras por órgãos públicos fosse baseado em critérios que assegurem a higidez no trato dos recursos dos contribuintes e também o cumprimento dos fins a que se destinam tais compras. Há que ter um ponto de equilíbrio em que se preserve a correção dos certames, fechem-se eventuais brechas para a corrupção, mas não paralise a administração pública em um emaranhado de processos burocráticos que parecem servir apenas para o processo em si.
Não haverá solução definitiva para os problemas que se interpõem entre o País que somos e o País que podemos ser sem que se dê à educação a importância fundamental que ela tem para o desenvolvimento, tanto do ponto de vista econômico como social.
Não faltam exemplos de nações que foram transformadas a partir do reconhecimento do papel das políticas educacionais. Nada impede – ou deveria impedir – que o Brasil enverede por este caminho. Há muitíssimo a ser feito nesse campo. Há políticas educacionais de variados graus de complexidade e tempo de implementação e produção de resultados. Nada, no entanto, justifica falhar no que é básico.