O Estado de S. Paulo

Cláusula que pode dar à Boeing 100% do negócio gera incômodo

Contrato entre as duas empresas prevê opção de compra dos 20% da Embraer pela companhia americana

- BRASÍLIA / F.N. e T.M.

O acordo que cria a nova empresa entre Boeing e Embraer prevê que os norte-americanos poderão, no futuro, comprar a fatia minoritári­a dos brasileiro­s e ter até 100% do negócio de aviação comercial. A cláusula foi mal recebida em Brasília e atrasou as negociaçõe­s. Se uma investida da Boeing fosse feita atualmente, autoridade­s dizem que a transação seria barrada pelo Palácio do Planalto.

Pela proposta, nos dez anos seguintes ao acordo, a brasileira tem a garantia de negociar os papéis pelo valor do negócio ajustado pela inflação dos Estados Unidos. Como a nova empresa é avaliada em US$ 5,26 bilhões, a fatia de 20% da Embraer vale hoje US$ 1,052 bilhão. Após os dez anos, qualquer oferta será feita com “valor justo de mercado”.

Uma das autoridade­s que acompanhar­am a negociação explicou que as conversas atrasaram pela reação crítica do Palácio do Planalto a esse trecho. Para o governo, preocupa a possibilid­ade de que o documento já preveja as condições para que os americanos tenham até 100% da nova empresa no futuro – o que oficialmen­te acabaria com o negócio de aviação comercial da empresa de São José dos Campos.

A autoridade brasileira reconhece que a Boeing poderá avançar sobre as ações da brasileira na empresa voltada à aviação comercial. A fonte lembrou, no entanto, que “é claro que o governo brasileiro pode barrar essa operação”. Isso ocorreria porque o Planalto manterá o poder de veto previsto pela chamada “golden share”.

Ao governo, as empresas rechaçam qualquer intenção de uso dessa cláusula. A opção prevista em contrato, argumentar­am as fabricante­s, seria quase como uma “formalidad­e”, já que essa opção costuma ser incluída em grandes contratos desse tipo. Às autoridade­s em Brasília, as duas empresas disseram ainda que atualmente não há interesse em exercer essa opção de negociação adicional.

Cargueiro. Já as condições sobre a nova empresa para comerciali­zar o cargueiro KC-390 foram bem recebidas pelo Brasil. Negociador­es do governo classifica­ram como “suficiente e adequada” a divisão do negócio com 51% do capital com a Embraer e 49% com a Boeing. Essa divisão deixa o Brasil em condições de vetar qualquer decisão sobre os rumos do negócio.

Além disso, o governo reconhece que, se o porcentual no negócio voltado ao cargueiro fosse maior, haveria necessidad­e de maior desembolso para aumentar a participaç­ão da Embraer – o que não interessar­ia aos brasileiro­s. Outra fonte elogiou o desenho do negócio de defesa ao lembrar que a Embraer e o governo brasileiro gastaram muito com o projeto do cargueiro, e o foco agora está em negociar o produto.

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SERGEI GRITS/AP Nicho. Jato da Embraer: Boeing de olho em aviões médios

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