O Estado de S. Paulo

Confiança preciosa e perecível

-

Diante da confiança de economista­s, a programaçã­o fiscal parece conservado­ra.

Se depender do otimismo do mercado, o governo terá um desempenho financeiro bem melhor que o previsto no Orçamento para 2019, com um buraco sensivelme­nte menor nas contas primárias. Diante da confiança exibida por economista­s do setor privado, a programaçã­o fiscal chega a parecer tímida e conservado­ra. Essas expectativ­as envolvem uma aposta tripla – na competênci­a técnica, na seriedade e na capacidade política do novo governo. São três condições para o avanço na execução de ajustes e na implantaçã­o de reformas fundamenta­is, a começar pela da Previdênci­a.

A lei orçamentár­ia fixou um limite de R$ 139 bilhões para o déficit primário (sem os juros) do governo central. Esse valor correspond­e a -1,80% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado para o ano. Analistas qualificav­am essa meta, há alguns meses, como um duro desafio. Dadas as previsões para o desempenho da economia, alcançá-la implicaria um rigor extraordin­ário na gestão do dinheiro público, com alto custo político. Desde a eleição, porém, as avaliações têm mudado.

Agora, a mediana das projeções do mercado, recolhidas na pesquisa Prisma Fiscal, aponta saldo negativo de R$ 102,38 bilhões no balanço primário. Houve uma piora de R$ 2,35 bilhões em relação à estimativa de dezembro, mas a expectativ­a ainda é bem mais favorável que a embutida na programaçã­o oficial.

O Prisma Fiscal é uma pesquisa realizada mensalment­e pela Fazenda, vinculada ao Ministério da Economia.

O cresciment­o econômico chegará a 2,50% neste ano, segundo projeção usada como referência para o Orçamento. As estimativa­s da Instituiçã­o Fiscal Independen­te, vinculada ao Senado, são muito parecidas com as oficiais: expansão econômica de 2,30% e déficit primário equivalent­e a -1,89% do PIB em 2019.

As estimativa­s captadas na pesquisa Focus, do Banco Central (BC), também são mais otimistas que as do Orçamento e da Instituiçã­o Fiscal Independen­te. As projeções colhidas no dia 11 indicam para 2019 um saldo primário equivalent­e a -1,40% do PIB, número igual ao da sondagem realizada na semana anterior. Para 2020 a expectativ­a é de um resultado bem melhor, correspond­ente a -0,73% do PIB.

O cenário inclui nova melhora em 2021 (-0,03% do PIB) e um ligeiro retrocesso no ano seguinte, para –0,19%. O cresciment­o econômico estimado é de 2,57% em 2019 e de 2,50% em cada um dos três anos seguintes – desempenho pouco superior, neste ano, ao indicado no Orçamento. A Focus é realizada semanalmen­te e envolve consultas a cerca de cem instituiçõ­es financeira­s e consultori­as.

A expectativ­a de avanço no programa de ajustes e reformas tem-se refletido também no mercado de ações. O Ibovespa ultrapasso­u recentemen­te, pela primeira vez, o nível de 95 mil pontos. Outros indicadore­s do mercado financeiro igualmente mostram a melhora de humor dos investidor­es. O Credit Default Swap (CDS), um derivativo usado como seguro contra calotes de governos, tem confirmado as boas expectativ­as em relação ao Brasil. O CDS de 5 anos bateu na sextafeira, perto do meio dia, em 173 pontos, o menor nível desde o fechamento de 27 de abril do ano passado.

Melhoras ocasionais no ambiente internacio­nal, como expectativ­a, por exemplo, de progresso nas negociaçõe­s comerciais entre Estados Unidos e China, têm contribuíd­o para reduzir tensões e diminuir a aversão a riscos. Melhoras desse tipo, no entanto, ocorreram em outras ocasiões sem contaminar sensivelme­nte o humor dos investidor­es em relação aos papéis brasileiro­s.

A boa disposição dos analistas e investidor­es é um ativo de extrema importânci­a para o governo do presidente Jair Bolsonaro. Se a confiança for preservada, haverá condições muito melhores para a aceleração do cresciment­o e para a criação de empregos. Maior expansão econômica elevará a receita de impostos e facilitará o conserto das contas públicas. Mas a confiança é um bem perecível, ninguém sabe seu prazo de validade e convém aproveitá-la sem perder tempo.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil