O Estado de S. Paulo

EM WASHINGTON, BOLSO VAZIO, MAS BARRIGA CHEIA

Servidores fazem fila para refeição gratuita oferecida por premiado chef espanhol

-

Ochef de cozinha José Andrés, um espanhol responsáve­l por restaurant­es estrelados de Washington, decidiu usar um projeto fundado para ajudar pessoas em situação de pobreza extrema para atender servidores federais que estão sem receber pagamento em razão da paralisaçã­o parcial do governo americano.

Ao considerar “um outro tipo de desastre” o fato de 800 mil funcionári­os estarem sem trabalho, Andrés abriu um restaurant­e temporário em Washington, na quarta-feira, para oferecer refeições para os funcionári­os federais levarem para casa. As filas dobraram o quarteirão.

No primeiro dia, o time de Andrés ofereceu 4,4 mil refeições das 11 horas às 18 horas – o dobro do estimado. No segundo, foram 5,5 mil. O cardápio inclui sopa, refeição ou sanduíche, além de frutas e café, tendo opções veganas disponívei­s.

Desastres. O trabalho é feito por um time do World Central Kitchen – que em tradução livre significa Cozinha Central Mundial –, projeto criado pelo chef de cozinha, em 2010, para atender sobreviven­tes do terremoto que atingiu o Haiti.

Depois do furacão Maria, em 2017, em Porto Rico, Andrés e sua equipe ofereceram mais de 3,6 milhões de refeições para a população local. De lá para cá, ele levou o projeto a outros lugares, como um abrigo em Tijuana, no México, usado temporaria­mente como lar de imigrantes que tentam cruzar a fronteira rumo aos EUA.

Um de seus restaurant­es de Andrés em Washington ganhou duas estrelas no Guia Michelin e ao menos quatro receberam o selo Bib Gourmand, do mesmo guia, que avalia restaurant­es de boa qualidade a preços acessíveis. Um deles, o mexicano Oyamel, já recebeu Barack e Michelle Obama para jantar.

A 300 metros do Oyamel e na região onde Andrés concentra cinco casas, o chef abriu a cozinha temporária para receber os servidores federais sem salários.

A escolha do local teve uma estratégia: exatamente na metade do caminho entre a Casa Branca e o Capitólio, que protagoniz­am o impasse em torno do orçamento americano responsáve­l pela paralisaçã­o.

Culpa. Sharon Johnson, servidora da Justiça federal, está trabalhand­o sem receber salário. Ela foi todos os dias no almoço, durante esta semana, no restaurant­e itinerante de Andrés. “Nenhuma das minhas contas do mês foi paga”, afirma. Ao lado de outras duas colegas do Judiciário federal, Sharon faz coro quando é questionad­a sobre qual dos envolvidos na paralisaçã­o é culpado pela situação atual: “o número 45, claro”, respondem. “Número 45” é uma forma de se referir a Trump sem mencionar o nome do presidente, que é o 45.º a ocupar a Casa Branca. “Os EUA não têm de construir um muro”, afirmou Sharon.

Sanduíches. Diane Lynne é servidora da agência federal de proteção ambiental e também foi almoçar no restaurant­e de Andrés após saber da iniciativa pelo noticiário. “Não posso pagar o aluguel. Não tenho como pagar minhas contas. O José Andrés é incrível, todos seus restaurant­es estão dando sanduíches de graça”, afirmou Lynne.

Antes de abrir o restaurant­e itinerante, quando surgiram as primeiras notícias de que a paralisaçã­o do governo americano estava afetando os salários dos servidores, Andrés começou a distribuir sanduíches em seus restaurant­es em Washington. A cozinha temporária deve funcionar até que os servidores voltem a receber salários.

 ?? BEATRIZ BULLA/ESTADAO ?? Alívio. Sharon Johnson (E) com amigas na fila do restaurant­e de Andrés, em Washington
BEATRIZ BULLA/ESTADAO Alívio. Sharon Johnson (E) com amigas na fila do restaurant­e de Andrés, em Washington

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil