O Estado de S. Paulo

Abertura comercial ou protecioni­smo?

- AFFONSO CELSO PASTORE

Ogoverno Bolsonaro quer aumentar a abertura da economia ao comércio internacio­nal, e sabemos que enfrentará a oposição de importante­s segmentos do setor privado, e em particular da indústria. No entanto, há evidências de que os países que se abriram ao comércio, elevando importaçõe­s e exportaçõe­s, beneficiar­am-se do aumento da competição colhendo a aceleração do cresciment­o econômico.

Qual seria o melhor modelo? Maior abertura ou maior proteção? Afinal, entre o fim da 2ª. Guerra Mundial e o final da década dos anos 1970, o Brasil teve taxas de cresciment­o econômico superiores a 7% ao ano, benefician­do-se de forte protecioni­smo que levou à industrial­ização pela substituiç­ão de importaçõe­s. Dani Rodrick (Economic Rules, 2015), um economista de sólida formação neoclássic­a, porém pragmático na política econômica, nos ensina que: dependendo do momento histórico e das caracterís­ticas de cada país, são necessário­s modelos diferentes que, quando bem selecionad­os iluminam o caminho, mas quando usados dogmaticam­ente levam a erros danosos.

A melhor resposta às indagações feitas acima vem da comparação do Brasil com a Coreia do Sul. Ambos sempre usaram alguma forma de “política industrial” e, entre 1960 e 1980, tiveram cresciment­o elevado e muito semelhante­s de produtivid­ade média do trabalho. Mas desde o início seguiram modelos muito diferentes.

A Coreia desde logo voltou-se para a promoção de exportaçõe­s, usando subsídios fiscais e creditício­s. Porém, no início dos anos 1960 “eliminou as tarifas sobre importaçõe­s para bens intermediá­rios e insumos utilizados na produção para exportação” e, até 1975, esse foi o “elemento mais importante das políticas de promoção de exportaçõe­s”, com o país se engajando, a partir do início da década dos anos 1970, em programas de liberaliza­ção comercial que nos anos 1980 reduziram a tarifa média ad valorem sobre importaçõe­s de 43% para 13%, e em 1995 para 7,9% (Polónia Rios e Motta Veiga, CDPP, 2018).

Já o Brasil abusou da proteção para gerar a industrial­ização com base na substituiç­ão de importaçõe­s. Nos anos 1950, tinha uma elevada proporção da população empregada na agricultur­a, com baixa produtivid­ade, que se deslocou para a indústria que investia em resposta à elevada proteção. Como a intensidad­e de capital é bem maior na indústria do que na agricultur­a, o aumento da proporção da população empregada na indústria levou ao “milagre” do cresciment­o acelerado da produtivid­ade média da população empregada como um todo, elevando a renda per capita.

Além de voltar-se desde logo para a promoção de exportaçõe­s expondo-se à concorrênc­ia e incentivan­do a eficiência, a Coreia percebeu que a qualidade do capital humano era importante fonte de cresciment­o, e investiu pesadament­e em educação. Não faltaram sugestões para que o Brasil enveredass­e por esse caminho. Naqueles anos, a Universida­de de Chicago já se destacava pelas contribuiç­ões de Gary Becker e Theodore Schultz que propunham que os investimen­tos em capital humano eram importante fonte de cresciment­o econômico. O Brasil ignorou essa recomendaç­ão, preferindo manter os incentivos fiscais e creditício­s reclamados pela indústria, ao lado de toda sorte de barreiras às importaçõe­s, fugindo da competição. Pior ainda, esse movimento se acentuou nos últimos anos.

Os resultados são dramáticos. O FMI publica a renda per capita – ano a ano – para todos os países, medida em PPP (paridade de poder de compra), e expressa em proporção à renda per capita dos EUA. Em 1980, a Coreia tinha uma renda per capita de apenas 17% da dos EUA e bem inferior à do Brasil, que naquele ano já atingia 45% da renda dos EUA.

Em 1991, a renda per capita da Coreia ultrapasso­u a do Brasil, e em 2016 já chegava a quase 70% da renda per capita dos EUA, praticamen­te se igualando à da União Europeia. Neste mesmo ano, a renda per capita do Brasil caía para apenas 25% da dos EUA. Enquanto a Coreia se aproximou da fronteira dos países mais desenvolvi­dos, o Brasil continuou se afastando para baixo. Será que já não passamos da hora de repensar nosso modelo de desenvolvi­mento?

Há evidências de que países que se abriram ao comércio colheram maior cresciment­o

EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL E SÓCIO DA A.C. PASTORE & ASSOCIADOS. ESCREVE QUINZENALM­ENTE

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