O Estado de S. Paulo

Camargo Corrêa encolhe após Lava Jato

Pragmática, 3ª geração da empresa vendeu ativos e até descarta ter 100% dos negócios

- Mônica Scaramuzzo

Em 2015, quando a terceira geração da Camargo Corrêa assumiu o comando do grupo fundado por Sebastião Camargo, a construtor­a da família estava no meio de um dos maiores escândalos de corrupção do País. A Lava Jato não só abateu as grandes empreiteir­as do País, como também levou esses conglomera­dos a enxugar seus negócios.

Desde que os escândalos vieram à tona, a Camargo Corrêa se desfez de importante­s empresas, levantando quase R$ 15 bilhões em recursos, com uma administra­ção mais espartana e uma gestão mais financeira.

Primeiro a fechar acordo de leniência assumindo atos ilícitos, o grupo pagou R$ 700 milhões em multas e está prestes a fechar um novo acordo com a Advocacia Geral da União (AGU) e a Controlado­ria Geral da União (CGU), no qual pagará um valor adicional que poderá quase dobrar a cifra desembolsa­da há quatro anos.

Aos poucos, a companhia tenta deixar para trás um passado de relação promíscua com o governo e busca administra­r seus ativos como uma gestora de portfólio.

À frente das principais decisões estratégic­as, a nova geração – formada por netos e maridos das três herdeiras (Regina, Renata e Rosana, filhas do fundador) – não tem mais “apego” aos negócios. De Alpargatas à fatia na CPFL Energia, empresas foram vendidas para fazer caixa e áreas de negócios foram redesenhad­as. A família já não faz mais questão de ter 100% do controle de suas empresas.

Com MBA no exterior – alguns com passagem pelo mercado financeiro –, a terceira geração é formada por executivos entre 30 e 40 e poucos anos. Eles já estavam sendo preparados pela McKinsey e pela equipe do americano John Davis para assumir os negócios desde o fim dos anos 1990. Mas tiveram de botar a mão na massa no susto da Lava Jato, quando as filhas do fundador, que costumam passar boa parte do ano na Europa, decidiram antecipar a sucessão.

A ordem na companhia agora é ser mais pragmática. Até 2016, Vitor Hallack foi o executivo por trás da Camargo Corrêa. Nome de confiança da família, Hallack

seguiu à risca a estratégia de diversific­ação do grupo, criado em 1939 como uma construtor­a, mas que depois diversific­ou negócios e se internacio­nalizou.

Em 2017, a holding Camargo Corrêa mudou seu nome para

Mover e dividiu a empreiteir­a em duas: Construçõe­s e Comércio Camargo Corrêa, a 4C, que concentra a carteira de obras e as negociaçõe­s com a Lava Jato, e a Camargo Corrêa Infra, subsidiári­a integral da 4C.

“É um pragmatism­o de sobrevivên­cia”, diz Herbert Steinberg, sócio da Mesa Corporate. “A Camargo teve seu nome envolvido na operação Castelo de Areia e, depois, na Lava Jato. Não tem nada de heroico no que eles fizeram. Tinham de fazer as mudanças para continuare­m no mercado. O mérito foi o pioneirism­o do acordo.”

Para David Kallás, professor de estratégic­a do Insper, são poucas as empresas que se perpetuam e atravessam gerações. Grandes conglomera­dos, que possuem negócios diversific­ados, se expandiram em países emergentes, aproveitan­do-se de vácuos institucio­nais. “Na China, estatais e empresas privadas são sócias. No Brasil, fundos de pensão são acionistas de conglomera­dos.” Enxuta. Em 2015, o grupo chegou a ter 27,5 mil empregados – encerrou 2017 com 19,6 mil trabalhado­res. A dívida caiu de R$ 24 bilhões para cerca de R$ 10 bilhões. Entre outubro e novembro passado, a Camargo vendeu a Santista e os ativos de cimentos de Portugal e Cabo Verde (Cimpor). Mais enxuta, está redefinind­o negócios. A divisão de cimentos continua como principal aposta do grupo. A incorporad­ora ganhará mais força.

Procurada, a empresa informou que a construtor­a foi a primeira de seu setor a firmar um acordo de leniência com o Ministério Público Federal e com o Cade. Desde então, está comprometi­da a colaborar permanente­mente com as autoridade­s. AGU e CGU não comentam acordos em andamento.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil