Não aprenderam nada
Um perfil dos caminhoneiros mostra as mesmas posições equivocadas da greve de 2018.
Um perfil dos caminhoneiros traçado pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) mostra que eles mantêm as mesmas posições equivocadas que os levaram à greve de maio de 2018. Isto é uma má notícia, porque mostra que nenhuma lição foi aprendida por esses profissionais, apesar do trauma causado pelo movimento, que paralisou setores importantes do País, de 10 a 21 de maio do ano passado, afetando direta ou indiretamente a vida de toda a população. A pesquisa Perfil dos Caminhoneiros 2019 foi feita com autônomos e empregados de frotas, entre 28 de agosto e 21 de setembro do ano passado, praticamente três meses depois do fim da greve, com tempo suficiente para que eles refletissem sobre o fundamento e as consequências de seus atos. Suas posições são, portanto, bem firmes. “A pesquisa deixou clara a realidade enfrentada pelos profissionais nas nossas rodovias: renda mensal baixa, insegurança e elevado preço do combustível são os grandes problemas”, afirma o presidente da CNT, Clésio Andrade. É importante conhecer essa realidade, mas faltou acrescentar que, para ter uma visão exata do problema, é também indispensável procurar entender o que dela decorre.
A renda média líquida dos caminhoneiros é de R$ 4,4 mil, sendo a dos autônomos de R$ 5 mil e de R$ 3,7 mil a dos empregados de frotas. Eles trabalham em média 11,5 horas por dia, 5,7 dias por semana. Queixam-se, e neste ponto com razão, da insegurança nas estradas, e 64,6% dizem ter sido vítimas de assaltos e roubos. Não se pode dizer que seja uma vida fácil, mas ao mesmo tempo não se deve esquecer que 57% desses profissionais que já possuíam uma profissão antes afirmam que sua situação financeira melhorou quando passaram a ser caminhoneiros.
O problema começa quando se confirmam – eles já foram proclamados publicamente durante a greve, como era natural – os motivos que eles apontam para o movimento: o elevado preço do combustível e o baixo valor dos fretes. E esta é uma convicção solidamente firmada, pois essas reivindicações continuam sendo apresentadas, principalmente a redução do preço do combustível (51,3%) e, surpreendentemente em quarto lugar, o aumento do valor do frete (26,2%), vindo à frente dele mais segurança nas estradas (38,3%) e juros mais baixos para o financiamento dos veículos
Dessas quatro reivindicações, a única que não comporta discutir é a segurança, pois é sabido o risco que correm os motoristas nas estradas, especialmente os caminhoneiros. E apesar disso o poder público nunca deu ao problema uma resposta satisfatória.
Quanto ao preço do combustível e ao valor do frete, o governo não tem que se envolver nisso. A experiência demonstra sobejamente que toda vez que isso ocorre os resultados são desastrosos. Quem tem de resolver essa questão é o mercado. Se ele não dá uma solução que satisfaz aos caminhoneiros, ou a qualquer outra categoria profissional que esteja em posição semelhante, cabe-lhes mudar de ramo. É o risco do negócio. Por isso foi um erro do ex-presidente Michel Temer, que a patrocinou, e do Congresso, que a aprovou, a Lei 13.703/18, que possibilitou a fixação de um piso para o frete. O preço do combustível também foi baixado artificialmente.
As autoridades cederam à chantagem dos caminheiros, que ainda se sentem com força para insistir em novas concessões, inclusive do Supremo Tribunal Federal (STF), de cuja decisão – que não se sabe quando sairá – depende o futuro do valor dos fretes.
O principal motivo por se ter chegado a essa situação foram as concessões feitas àqueles profissionais durante os governos da presidente cassada Dilma Rousseff, que lhes facilitaram a compra de caminhões. A abundância de oferta desses veículos levou inevitavelmente à baixa do valor dos fretes, de que agora se queixam os caminhoneiros. Eles nada aprenderam, pois 27,4% continuam pedindo juros mais baixos para financiamento de seus veículos.