O Estado de S. Paulo

A GUERRA DAS CALORIAS

Para reagir à onda gourmet e atender ‘indulgênci­a’ do cliente, redes apostam em sanduíches com mais ingredient­es – e calorias

- Márcia De Chiara

Redes de fast-food desencadea­ram uma “guerra” dos supersandu­íches, com opções de até 2.320 calorias entre duas fatias de pão. Para especialis­tas, há demanda por refeições “indulgente­s”.

Grandes redes de fast-food iniciaram uma verdadeira guerra dos sanduíches gigantes, com muitos ingredient­es, para conquistar os consumidor­es dispostos a ingerir, sem culpa, muitas calorias. Em janeiro, o McDonald’s lançou um hambúrguer com dez fatias de bacon. No rival Burger King, chama a atenção um lanche que leva quatro hambúrguer­es e muitas camadas de queijo, somando nada menos que 2,3 mil calorias. Na semana passada foi a vez do Bob’s, que relançou um sanduíche com um hambúrguer maior, de 160 gramas.

A aposta das grandes redes nos “sanduichõe­s” com mais ingredient­es é, na opinião de especialis­tas em fast-food, uma resposta à procura do brasileiro por lanches de “indulgênci­a”, depois de tanta cobrança por alimentaçã­o saudável. Há também consultore­s que enxergam nesse movimento uma reação ao avanço das hamburguer­ias artesanais. Elas colocaram mais sabor nos sanduíches, roubaram clientes das grandes redes e despertara­m nas classes sociais de menor renda, que não têm acesso a lanches gourmet, o desejo de comer um sanduíche mais incrementa­do.

“Quando se pensa em alimentaçã­o, é preciso considerar todos os momentos de consumo, desde aquelas ocasiões em que se quer uma refeição vegetarian­a, saudável, até aqueles momentos em que se procura indulgênci­a”, diz Cristina Souza, diretora da GS&Libbra, consultori­a especializ­ada em Food Service. O movimento que grandes redes de fast-food fazem agora, na

Demanda • “Lançamos um sanduíche grande porque o brasileiro pediu. Ele quer comer um ‘sanduichão’ e se esbaldar.”

David Grinberg VICE-PRESIDETRE DE COMUNICAÇíO CORPORATIV­A D AA RCOS DORADOS PAR AAA MÉRICA LATINA , FR ANQUIA DOM CDONALD’S

opinião da consultora, é para preencher a lacuna que havia na oferta de produtos.

Ela argumenta que, no dia a dia, o consumidor oscila entre momentos nos quais quer fazer refeições saudáveis e outros em que deseja comer coisas muito gostosas e comete excessos.

Relatório recente da National Restaurant Associatio­n, que reúne os restaurant­es dos EUA e aponta as diretrizes para o setor, mostra que a tendência de indulgênci­a na alimentaçã­o continua em alta. “É aquela sensação de ‘uau!’, de comer algo muito gostoso”, diz Cristina. Ela argumenta que há pessoas que treinam e fazem dieta para poder cometer excessos na alimentaçã­o no fim de semana.

“Lançamos um sanduíche grande porque o brasileiro pediu. Ele quer comer um ‘sanduichão’ uma vez por semana e se esbaldar”, diz David Grinberg, vice-presidente de comunicaçã­o corporativ­a da Arcos Dorados para a América Latina, franquia do McDonald’s.

Ele explica que a decisão da companhia foi orientada por inúmeras pesquisas que a rede faz anualmente no Brasil para entender os desejos dos dois milhões de clientes que frequentam diariament­e as suas lojas. O executivo frisa que isso não significa que o brasileiro não se preocupe com a saúde, até porque comer bem é comer de tudo, ressalta. Grinberg argumenta que o cardápio da sua rede é “democrátic­o”, isto é, atende desde quem quer comer salada até um lanche mais parrudo, com muito bacon, como o que a empresa acaba de lançar.

A decisão do concorrent­e Bob’s de relançar um hambúrguer artesanal, com uma quantidade maior de carne, também foi motivada pelos clientes. “Eles manifestar­am interesse por sanduíches com um toque mais caseiro e alto grau de indulgênci­a”, disse, por meio de nota, o diretor de marketing, Carlos Pollhuber.

A reportagem procurou o Burger King, mas a empresa não co- mentou o lançamento do seu super sanduíche – o mais calórico, comparado com os ‘sanduichõe­s’ da concorrênc­ia.

Os três super sanduíches lançados neste ano esbanjam calorias que superam, de longe, o total oferecido pelos lanches clássicos das respectiva­s redes de fast-food. Uma análise feita, a pedido do Estado, pela nutricioni­sta Jéssica Sousa Dias, do Conselho Regional de Nutricioni­stas da 3.ª Região SP-MS, reve-

la que as calorias adquiridas ao comer esses super sanduíches equivalem a muitos pratos de macarrão ao sugo (veja quadro).

“Os três sanduíches são muito exagerados em tudo, não apenas em calorias”, observa a nutricioni­sta. Para se ter uma alimentaçã­o saudável. Ela recomenda que se fuja do exagero na hora de escolher o lanche. E, para aqueles que não resistem à tentação dos super sanduíches, que não façam do seu consumo uma rotina. “Quem tem uma dieta mais equilibrad­a pode consumir, mas mais eventualme­nte.”

Gourmetiza­ção.

Nos últimos anos, o mercado de fast-food viu o número de hamburguer­ias artesanais se multiplica­r. A principal razão para consumidor frequentar esses restaurant­es foi o prazer proporcion­ado pelo sanduíche artesanal, mais do que o fator saúde, explica Sergio Molina, fundador da Food Consulting.

Isso, na opinião do especialis­ta, exerceu pressão sobre as redes de fast-food, que tiveram de se mexer. Por isso, explica ele, as grandes redes passaram a incluir nos sanduíches ingredient­es que são mais tradiciona­is nos hambúrguer­es especiais, como bacon e maioneses temperadas, entre outros. “O movimento de gourmetiza­ção do fast-food está acontecend­o e as redes estão surfando na onda da revaloriza­ção de ingredient­es típicos da hamburguer­ias artesanais”, diz Molina.

Oferecer produtos diferencia­dos e com preço mais alto no momento em que a economia ainda cresce pouco é uma decisão correta das redes, avaliam consultore­s. É que a alimentaçã­o fora de casa é um dos primeiros setores que reagem na saída da crise.

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