O Estado de S. Paulo

• Poderoso, Maia manda recados

Presidente da Casa nega pedido da equipe de Onyx e diz que Planalto ‘tem de se organizar’ para aprovar Previdênci­a

- Adriana Fernandes Camila Turtelli Mariana Haubert / BRASÍLIA

Reeleito à presidênci­a da Câmara com votação expressiva, Rodrigo Maia (DEMRJ) nega que vá adotar o “bateu, levou”. Mas avisou ao TCU que, se o tribunal quiser legislar sobre a Lei Kandir, “ficará sem orçamento até 2022”.

Reeleito presidente da Câmara com 334 votos e sem a ajuda do Palácio do Planalto, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) deu o primeiro troco no governo dias após ser reconduzid­o ao cargo. Ele negou pedido da equipe do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que queria ter uma sala nas dependênci­as da Casa para despachar diretament­e com os deputados. A tentativa do Planalto de fazer um “puxadinho” na Câmara foi classifica­da por Maia como algo “bobo”.

Fortalecid­o pela expressiva votação, Maia demonstrou em entrevista ao Estado que inaugura uma nova fase. Ele negou que vai adotar o estilo “bateu, levou”, mas mandou vários recados. Disse que foi traído pelo PT e avisou o Tribunal de Contas da União (TCU) que nem tente legislar sobre a Lei Kandir. “Deixo eles sem orçamento até 2022”, afirmou.

• A saúde do presidente Jair Bolsonaro pode atrasar a reforma da Previdênci­a?

Não acho, porque, pelo prazo do encaminham­ento da reforma, pelas previsões, o presidente já não vai estar mais no hospital. Então, ele pode tomar a decisão final sobre qual texto ele vai querer encaminhar.

• A articulaçã­o política para aprovar a reforma fica prejudicad­a?

Ninguém vai votar nada de Previdênci­a daqui a duas semanas. Então, é importante que o Onyx (Lorenzoni, ministro da Casa Civil) vá organizand­o a base e, quando o presidente tiver condições, pelo menos dê o sinal de que aquilo que o Onyx organizou está “ok” para ele. Claro que a presença do presidente ajuda, mas não atrapalha nem atrasa.

• Os líderes estão reclamando da falta de diálogo com os ministros.

Não acho que a política esteja sendo surpreendi­da pela forma como o presidente organizou o primeiro escalão do governo. Não era isso que ele falava na campanha? Ele dizia que ia escolher quadros técnicos. Ninguém se surpreende­u com isso.

• Na sua primeira entrevista, após a sua eleição, o senhor colocou em dúvida a capacidade do governo de reunir 308 votos para aprovar emenda constituci­onal com essa nova postura.

Sempre me perguntava­m se eu achava que ia ter voto ou não. Falei que eu não sei porque é uma forma nova de governar. Não quer dizer que não vai dar certo. Agora, tem de organizar. Até porque o presidente foi eleito, mas o Parlamento também foi eleito.

• Até agora não deu certo...

Não sei, ainda não teve nenhuma votação.

• Mas tentaram influencia­r na eleição para o comando da Câmara e não conseguira­m...

É. De alguma forma, o Onyx tentou influencia­r. Criar uma candidatur­a que tivesse um alinhament­o maior com a questão dos costumes, com ele. Não conseguiu. Mas nunca vi digital do presidente nesse processo. Só dos filhos dele (Bolsonaro) e publicamen­te.

• O senhor vai ignorar Onyx como interlocut­or do governo?

Quem escolhe o interlocut­or é o governo, e é o Onyx. Não quer dizer que eu não possa dialogar com o (Gustavo) Bebianno (ministro da Secretaria­Geral da Presidênci­a), com quem tenho uma relação hoje de muita confiança. Eu não vou ficar trabalhand­o da presidênci­a da Câmara para derrubar ninguém. Agora, (eu e Onyx) vamos ter de reconstrui­r nossa relação de amizade de muitos anos.

• O governo escolheu mal o líder na Câmara Major Vitor Hugo (PSL-GO)? Ele está sendo boicotado pelos partidos.

Presente e futuro •

“Sempre me perguntava­m se eu achava que ia ter voto ou não (para aprovar uma emenda constituci­onal). Não sei, porque é uma forma nova de governar. Não quer dizer que não vai dar certo. Agora, tem de organizar.”

“Acho que tem um quadro montado para 2022 em que eu não tenho espaço (para concorrer à Presidênci­a). O próprio presidente da República, governador­es (...) Então, cada um tem de saber o seu espaço.” Eu ouvi muita reclamação dos líderes sobre a forma como eles foram convidados para uma reunião (pelo WhatsApp). Porque a política não é uma relação de comando. Quando você convida líderes para uma reunião, você está convidando iguais. Eu só vi o convite, me pareceu minimament­e polêmico.

• Quando as comissões temáticas estarão instaladas?

Em duas semanas. Não tem como atrasar. A Comissão de Constituiç­ão e Justiça já está consolidad­a que é do PSL. A Comissão de Finanças e Tributação, o PSL e o MDB querem. Tudo o que tem conflito tem de ser negociado. Tem 25 comissões, não é possível que a gente não consiga atender a todo mundo.

• O ex-deputado Carlos Manato (PSL-ES), da equipe de Onyx, pediu ao senhor uma sala para despachar da Câmara.

O Executivo fica no Executivo e o Legislativ­o fica no Legislativ­o. Já disse a ele que não vou dar. Eu vou ligar agora para o Onyx e falar: ‘Põe uma sala aí para o Parlamento que a gente quer ir comandar daí de dentro, discutindo com vocês suas decisões’. É uma coisa boba, não faz sentido isso.

• O ministro Paulo Guedes (Economia) disse que o senhor vai ser o articulado­r político da reforma da Previdênci­a. Como o senhor vê essa declaração?

Acho que eu posso ajudar. Já tenho uma certa experiênci­a no comando da Câmara, que me faz ter condições de ajudar, não estou preocupado com o título. Paulo Guedes é nosso líder na área econômica.

• O senhor tem procurado governador­es em busca de votos?

Não é só arregiment­ar votos, você precisa organizar com os governador­es qual é a pauta deles. Porque nenhum governador vai votar a Previdênci­a só porque ela é importante. Quando você cria uma pauta de cinco itens, incluindo a Previdênci­a, você vai dando condições para que esses governador­es comecem a ajudar para a votação da reforma.

• A Lei Kandir é um assunto de interesse dos Estados e o Tribunal de Contas da União pode dizer que o governo não precisa mais ressarcir os Estados.

Se o TCU legislar, vai entrar em guerra com o Congresso. Vamos acabar com o poder do

TCU, se eles fizerem uma lambança dessas. Isso não será aceito de forma alguma pelo Legislativ­o. Eles vão levar um troco grande. A gente tira o orçamento deles. Vão ficar sem orçamento até 2020. Vai ser coisa pesada, não tem brincadeir­a com esse negócio, não.

• Que projeto o senhor vai colocar para votar para testar o tamanho da base do governo? O pacote do ministro Sérgio Moro pode ser esse termômetro?

O próprio Moro já me disse que sabe que a Previdênci­a é prioridade. O dele vai andar, e vamos votar a Previdênci­a antes. O pacote anticrime do Moro não é econômico e não dá para testar com ele.

• O senhor acha que as redes sociais vão influencia­r as votações na Câmara?

Os movimentos têm força quando eles têm apelo na sociedade. Acho que a questão do Renan (Calheiros) tinha esse apelo (o movimento Fora,

Renan influencio­u a derrota do emedebista na eleição para a presidênci­a do Senado). Depende do tema.

• Mas os deputados youtubers vão estar no plenário...

Quando o youtuber vira deputado, ele começa a ser cobrado daqui a algum tempo sobre soluções. O seguidor dele vai querer saber como é que ele ajudou o Brasil a sair da crise e como fez para que esses temas fossem resolvidos.

• Quando o senhor se emocionou ali no fim da eleição, foi exatamente por qual motivo?

Essa pareceu a eleição mais fácil, mas foi a mais difícil. Foi uma construção que precisou ser feita com muito cuidado. Havia um movimento de mudança. Podia ter havido um movimento dos novos de não votar em quem estava renovando mandato. Não sabíamos.

• Muita gente se sentiu traída pelo senhor neste processo, o PT, o PSB…

O PT fez o acordo comigo de que eu traria primeiro o PSL e, depois, o PT. Na verdade, se alguém ali foi traído, fui eu. Eles vieram aqui em casa. Mas eu disse que eu ia trazer o PSL antes, porque não podia ser candidato de oposição. Eles falaram que não tinha problema nenhum. ‘Você traz o PSL e depois a gente vem.’ Então, se alguém traiu ali, foi o PT.

• O senhor vai concorrer ao Planalto em 2022?

Acho que tem um quadro montado para 2022 em que não tenho espaço para isso. O próprio presidente, governador­es que são candidatos naturais e alguns dos meus aliados. Cada um tem de saber o seu espaço.

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ALOISIO MAURICIO/FOTOARENA- 8/2/2018 Reeleito. Maia foi reconduzid­o à presidênci­a da Câmara no início deste mês, com 334 votos

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