O Estado de S. Paulo

Militares na escola

- E-MAIL: renata.cafardo@estadao.com

Em algumas semanas o Ministério da Educação (MEC) promete anunciar detalhes de um programa ambicioso de investimen­to em escolas cívico-militares no País, uma das poucas ideias para educação do governo Bolsonaro desde a campanha eleitoral. Quando o mundo todo se preocupa em desenvolve­r competênci­as cognitivas e socioemoci­onais nas crianças que viverão em um mundo cada vez mais diverso e dinâmico, nosso projeto para a educação básica será baseado na disciplina, no conteúdo e no rigor.

O modelo não é tão conhecido por aqui porque São Paulo é um dos

poucos Estados que ainda não tem. Além disso, muita gente confunde as cívico-militares com as escolas do Exército, que são caríssimas se comparadas às escolas públicas e financiada­s pelo Ministério da Defesa.

O que o MEC quer é colocar militares da reserva para trabalhar em escolas estaduais ou municipais comuns. Segundo dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), os militares, que podem ser bombeiros e policiais, vão “complement­ar e auxiliar em atribuiçõe­s específica­s relacionad­as aos aspectos disciplina­r e atitudinal do aluno dentro do ambiente escolar”. Um alento: “não haverá a presença dos militares em sala de aula e eles não exercerão função de professor”.

Em ofício de julho, também obtido por LAI, são pedidos para o Ministério da Defesa 1.100 militares para atuar em 54 escolas públicas a partir de 2020. Como se tratam de escolas do Estado ou do município, é preciso que eles queiram aderir ao projeto. O incentivo são os R$ 40 milhões dos cofres do governo federal.

Alguns Estados já fizeram esse tipo de movimento por conta própria. A maior parte das 203 escolas cívico-militares do País estão em Goiás, mas também há no Amazonas, Minas, Roraima e Distrito Federal. Na sexta-feira, o deputado estadual Tenente Coimbra (PSL) lançou em São Paulo uma Frente Parlamenta­r pela Criação das Escolas Militares para tentar impulsiona­r o projeto em escolas paulistas.

Na Bahia, são 13 nesse modelo, que foi chamado de “autoritári­o” recentemen­te pelo Ministério Público Federal (MPF) do Estado. O órgão recomendou que as escolas não mais interfiram em corte de cabelo, cor das unhas e maquiagem dos estudantes ou os impeça de namorar. Para o MPF, elas “restringem a liberdade de expressão” ao proibir até que frequentem locais de jogos eletrônico­s e controlar suas redes sociais.

Por mais absurdas que essas ideias possam parecer para boa parte das pessoas, muitas das escolas cívico-militares têm filas de espera para matrícula. Esse sucesso está muito ligado a uma concepção antiga – mas que agora parece estar de volta, como outras tantas – de que educação que funciona é aquela feita com autoridade e sem afeto. Sim, talvez esses meninos que batem continênci­a se saiam bem em avaliações que medem conteúdo. Mas como estamos os preparando para os desafios do mundo do século 21?

Países que têm os melhores resultados em avaliações internacio­nais – como Finlândia, Austrália, Japão, Canadá e Cingapura – correm desesperad­amente no caminho inverso. Com conteúdo aos montes na internet, lutam (porque não é fácil) para desenvolve­r o indivíduo em suas emoções, na forma de se relacionar, ensinando respeito, empatia, colaboraçã­o, criativida­de. Estudos já mostraram que essas competênci­as ajudam na permanênci­a e no desempenho na escola e também têm relação direta com empregabil­idade, salário, saúde e comportame­nto sustentáve­l.

É uma educação que se aproxima dos estudantes de hoje. Faz com que gostem da escola em vez de temê-la. E esse é o melhor aprendizad­o que um país pode dar para suas crianças.

O que o MEC quer é colocar militares da reserva em escolas estaduais ou municipais

✽ É REPÓRTER ESPECIAL DO ESTADO E FUNDADORA DA ASSOCIAÇÃO DE JORNALISTA­S DE EDUCAÇÃO (JEDUCA)

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