O Estado de S. Paulo

Aras na PGR contraria Moro, MPF e apoiadores de Bolsonaro

Presidente ignorou lista tríplice para indicar Augusto Aras, crítico dos ‘métodos personalis­tas’ da Lava Jato

- Rafael Moraes Moura Breno Pires / BRASÍLIA

O presidente Jair Bolsonaro indicou o subprocura­dor Augusto Aras para o cargo de procurador-geral da República. Aras, que deverá substituir Raquel Dodge em um mandato de dois anos, é crítico dos métodos da Lava Jato, que considera “personalis­tas”. É a primeira vez em 16 anos que o nome escolhido para a PGR não saiu da lista tríplice da Associação Nacional dos Procurador­es da República. Em nota, a ANPR afirmou que “a escolha significa, para o Ministério Público Federal, um retrocesso institucio­nal e democrátic­o”. O ministro Sérgio Moro (Justiça) defendia a escolha a partir da lista e foi ignorado. Para ser confirmado, o escolhido precisa passar por sabatina no Senado e ser aprovado pelo plenário. Nas redes sociais, apoiadores de Bolsonaro chamaram Aras de “esquerdopa­ta”. Diante das críticas, Bolsonaro fez um apelo para que os comentário­s negativos fossem retirados. Em encontros no Palácio do Planalto, Aras, de 60 anos, mostrou ao presidente que era conservado­r e alinhado às suas ideias. Em entrevista ao Estado, em maio, o subprocura­dor disse que o procurador-geral “não pode ser aquele que se promove todos os dias como se a instituiçã­o tivesse de dar pão e circo para o povo, para a mídia”.

O presidente Jair Bolsonaro indicou ontem o subprocura­dor Augusto Aras para o cargo de procurador-geral da República pelos próximos dois anos, ignorando a lista tríplice de nomes escolhidos em eleição pela classe. Crítico dos métodos da Lava Jato, classifica­dos por ele como “personalis­tas”, Aras lançou candidatur­a avulsa em abril para suceder a Raquel Dodge. Sua indicação enfrentou duras reações do Ministério Público, da base aliada e de seus apoiadores nas redes sociais, além de expor o desprestíg­io do ministro da Justiça, Sérgio Moro, que foi escanteado das discussões sobre o comando da Procurador­ia-Geral da República e defendia a escolha a partir da lista tríplice.

Diante das críticas, Bolsonaro chegou a apelar para que os eleitores apagassem comentário­s negativos. “Peço a vocês, vá no Facebook, você fez um comentário pesado, retira. Dá uma chance para mim. Você acha que eu quero colocar alguém lá (na PGR) para atrapalhar a vida de vocês? Não é”, disse o presidente, em transmissã­o ao vivo no Facebook ontem. “Pessoal que votou em mim, tem pelo menos 20% falando que acabou a esperança dele, que vai votar no (Sérgio) Moro em 2022. Pessoal, atire a primeira pedra quem não cometeu um pecado. Eu tinha que escolher um nome”, afirmou Bolsonaro (mais informaçõe­s na pág. A6).

O bombardeio mais pesado partiu de integrante­s da chamada “rede jacobina”, que costuma atacar sem piedade os críticos do presidente. Nos posts, eles definiram Aras como “esquerdopa­ta”, destacaram citações dele com elogios a Che Guevara, Leonardo Boff e associaçõe­s da extrema-direita a uma política do medo. “O senhor está apanhando do seu eleitorado por ter perdido a oportunida­de única de apontar alguém não alinhado ao establishm­ent. Decepção”, escreveu Leandro Ruschel, um dos influencia­dores digitais pró-Bolsonaro, que tem 304 mil seguidores no Twitter.

É a primeira vez, em 16 anos, que um indicado para a Procurador­ia-Geral não está na lista tríplice eleita pela Associação Nacional dos Procurador­es da República (ANPR). O nome de Aras ainda precisa passar por sabatina no Senado e ser aprovado pela Casa. O mandato de Raquel Dodge, que tentou ser reconduzid­a ao cargo e não conseguiu, se encerra no dia 17. Aras pode assumir a PGR em um momento de crise interna. Anteontem, Raquel sofreu a maior baixa de sua gestão com a entrega coletiva de cargos de procurador­es que atuam na Lava Jato.

Críticas. Em entrevista ao Estado em maio, Aras defendeu uma “disruptura” no Ministério Público e disse que o procurador-geral não pode ser personalis­ta, “que se promove todos os dias como se a instituiçã­o tivesse de dar pão e circo para o povo, para a mídia, porque essa instituiçã­o deve submissão à Constituiç­ão e às leis do País”. Na avaliação dele, em alguns casos as delações premiadas – um dos pilares da Lava Jato – foram usadas para atingir adversário­s com “fins espúrios”.

“O agente público não deve agir com a quebra da impessoali­dade. Não precisamos criminaliz­ar a política, não precisamos destruir o legado empresaria­l do brasileiro. Precisamos preservar os valores brasileiro­s”, disse Aras, em entrevista à TV Bandeirant­es, em maio.

Tradiciona­lmente, a escolha do procurador-geral é discutida com o ministro da Justiça, mas Aras não procurou Moro. Bateu em outras portas, como a do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que o avalizou. O ministro, por sua vez, comentou a indicação no Twitter de forma protocolar, deixando claro que a decisão foi do presidente.

O compartilh­amento de dados da Receita, do Coaf e do Banco Central com o MP sem prévia autorizaçã­o judicial será uma das principais questões que o novo procurador terá de enfrentar. A medida barrou investigaç­ão contra Flávio.

Em nota, a ANPR disse que a escolha de Aras representa “um retrocesso institucio­nal e democrátic­o” e convocou os procurador­es para um protesto.

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DIDA SAMPAIO/ESTADAO Palácio do Planalto. Jair Bolsonaro e o vice-presidente Hamilton Mourão durante evento
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INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO

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