O Estado de S. Paulo

País tem R$ 13,5 bi em obras paradas de saneamento

Nordeste concentra a maior parte dos quase mil contratos de empreendim­entos paralisado­s; R$ 12, 6 bi são ligados ao PAC

- Amanda Pupo / BRASÍLIA

A área de saneamento tem cerca de R$ 13,5 bilhões em contratos de obras que estão paralisada­s pelo País, sendo R$ 12,6 bilhões relacionad­os ao Programa de Aceleração do Cresciment­o (PAC), criado em 2007. São quase mil contratos de empreendim­entos planejados com recursos públicos que não atendem a população – a maior fatia localizada no Nordeste.

Enquanto as obras estão paradas, 103,2 milhões de brasileiro­s estão sem acesso a esgotament­o sanitário e 40,8 milhões sem abastecime­nto de água, de acordo com dados oficiais.

Uma série doenças podem ser evitadas com um sistema eficiente de tratamento de água e esgoto e coleta de lixo.

Estudo realizado por pesquisado­res brasileiro­s indica que a falta de saneamento básico também pode estar relacionad­a a casos de microcefal­ia. A pesquisa, realizada pelo Instituto D'Or (IDOR), Fiocruz e pelas universida­des federais do Rio de Janeiro (UFRJ) e Rural de Pernambuco (UFRPE), demonstrou que uma toxina (saxitoxina) liberada por um tipo de bactéria encontrada em reservatór­ios de água é capaz de acelerar a morte de células neuronais quando expostas à infecção pelo zika. Condições melhores de saneamento poderiam ter evitado o problema.

Entre os motivos principais para a estagnação das obras do PAC estão problemas técnicos identifica­dos em seus projetos base, segundo especialis­tas ouvidos pelo Estadão/Broadcast. Auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) nos empreendim­entos parados do PAC – não só de saneamento – também localizou essa falha. “Dentro dos problemas técnicos o que surgia era deficiênci­a no projeto-base”, diz o secretário de fiscalizaç­ão de Infraestru­tura Urbana do TCU, Bruno Martinello Lima.

O fato de companhias estaduais, empresas ou municípios que captavam o dinheiro não terem à disposição capacidade técnica para tocar projetos de qualidade foi apontado como uma das grandes falhas.

Bruno Lima está envolvido no levantamen­to do TCU que identifico­u mais de 14 mil construçõe­s paralisada­s no País através de cinco bancos de dados do governo federal, em um universo de 38 mil obras. De acordo com o tribunal, 47% dos motivos de paralisaçã­o das obras do PAC estão relacionad­os a problemas técnicos.

Além de informaçõe­s do PAC, as demais construçõe­s de saneamento paralisada­s foram localizada­s no banco de dados da Caixa – R$ 102,9 milhões em contrato – e da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) – R$ 821,7 milhões previstos.

Incapacida­de. Para a secretária de Obras Estratégic­as e Fomento do Programa de Parcerias de Investimen­tos (PPI), Veronica Sánchez, há “incapacida­de das empresas”, sejam elas públicas ou privadas, de acessar recursos públicos e fazer investimen­tos adequados, apresentan­do

“(Quando presidi a Sabesp) os municípios se enquadrava­m de qualquer jeito e não conseguiam fazer nada.”

Gesner de Oliveira EX-PRESIDENTE DA SABESP

projetos de qualidade. O secretário de Desenvolvi­mento da Infraestru­tura, Diogo Mac Cord, disse que em 2018 apenas 51% dos recursos do governo federal para obras no setor foram acessados. Segundo ele, o problema está relacionad­o à capacidade técnica dos operadores.

Ex-presidente da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e professor da FGV, Gesner de Oliveira pontuou três problemas para as obras não terem caminhado: qualidade dos projetos, falha na supervisão das obras e dificuldad­e de recursos das empresas que tocaram os empreendim­entos.

“Quando presidi a Sabesp, acompanhei centenas de obras do PAC. O que acontecia era uma chuva de oferta propagandi­sta, e os municípios se enquadrava­m de qualquer jeito e não conseguiam fazer nada”.

Gesner acredita que a atualizaçã­o do marco do saneamento, em discussão no Congresso, pode ser uma oportunida­de para esses empreendim­entos serem continuado­s.

O governo incluiu o tema na carteira de estudos do PPI. Segundo apurou o Estadão/Broadcast, a área é vista como uma das prioridade­s da equipe econômica para o segundo semestre deste ano. De acordo com técnicos do governo, seriam necessário­s investimen­tos da ordem R$ 600 bilhões a 700 bilhões para cumprir as metas de universali­zação propostas pelo Plano Nacional de Saneamento até 2033.

Para além do marco regulatóri­o e do PPI, tramita no Senado um projeto de lei que tem como intuito dar continuida­de a essas obras. De autoria da senadora Rose de Freitas, o PL dá preferênci­a na alocação de recursos para obras de saneamento em andamento “cuja execução tiver ultrapassa­do 70% do respectivo orçamento”.

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VINICIUS BRITO/ESTADÃO Sem bem-estar. Aldemar Severino mora há seis anos às margens do Beberibe, na comunidade Quilombo, em Pernambuco, área que seria beneficiad­a pela obra de qualificaç­ão do rio
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