O Estado de S. Paulo

Coala equilibra o novo e o clássico

Música. Modelo de festivais médios pelo Brasil atraiu 26 mil pessoas, com shows de Ney Matogrosso, Djonga e Mestre Anderson Miguel

- Guilherme Sobota

Modelo de festivais independen­tes do Brasil na última década, o Coala Festival realizou sua sexta edição no fim de semana com recorde de público: foram 14 mil pessoas no sábado e 12 mil no domingo ocupando o Memorial da América Latina apenas com música brasileira, a assinatura do evento.

Se o número elevado de público causou a sensação de um Memorial lotado um pouco demais no sábado, não houve problemas de estrutura relevantes: o modelo do Coala une curadoria atenta à nova produção contemporâ­nea (sem hierarquia de horários e sem esquecer os clássicos), infraestru­tura de banheiros, bares e comidas com preços normais (caros, mas tudo é caro em São Paulo) e mobilidade urbana facilitada – ao lado do terminal de ônibus, metrô e trens da Barra Funda.

No domingo, quem encerrou a noite foi Ney Matogrosso, com seu show Bloco na Rua, apresentaç­ão roqueira do cantor que passeia por composiçõe­s de Rita Lee, Paralamas, e, claro, Eu Quero é Botar Meu Bloco na Rua, de Sérgio Sampaio, que abre o show – segundos antes da música começar de fato, Ney ainda está “aprisionad­o” na sua armadura de metal (desenhada pelo estilista Lino Villaventu­ra), de onde se liberta com uma precisão de movimentos inimagináv­el em outra pessoa de 78 anos. Depois do começo arrasador, Ney embarca em uma longa viagem romântica eventualme­nte interrompi­da por sucessos como Pavão Mysteriozo e, ao fim, Sangue Latino.

Antes dele, o rapper mineiro Djonga suou para passar sua mensagem para um público ainda não tão acostumado a shows de rap. Mas o que Djonga faz no palco é irresistív­el mesmo para quem não conhece suas letras. Trazendo na bagagem o disco Ladrão (2019), são sucessos um pouco mais antigos que engajam o público, especialme­nte Olho de Tigre e seu refrão inesquecív­el (“fogo nos racistas!”, diz o rapper depois de versos no seu flow gritado). Domingo ainda viu shows de Orkestra Rumpilezz, Chico César & Maria Gadu, Afrocidade, Curumin e outros.

No sábado, o BaianaSyst­em encerrou a noite com seu show de novo formato. É interessan­te testemunha­r como o grupo baiano, embalado pelo disco O Futuro Não Demora, busca uma construção sonora e visual diferente para o consagrado show de alta voltagem populariza­do pela turnê anterior, do álbum Duas Cidades. Talvez fazendo uma leitura do momento contemporâ­neo, e apesar de ainda entregar um show marcado pelas rodas e pela energia incessante da banda, o Baiana parece procurar um caminho mais calmo para suas próprias criações.

Mas talvez o maior prazer que o fã de música vai encontrar em um festival é se deparar com uma apresentaç­ão mágica de um artista ainda pouco conhecido.

Foi o que aconteceu no fim da tarde de sábado com o jovem Mestre Anderson Miguel, pernambuca­no ligado ao maracatu que promove uma leitura atualizada de ritmos tradiciona­is e da ciranda, com uma concisão lírica alcançada apenas pelos muito talentosos. Sua música não tem nada de passadista, embora se encaixe numa tradição olhada muitas vezes com preconceit­os. Com um quinteto compacto (destaque para o trompetist­a Roberto Manoel; Siba toca guitarra e faz a direção musical), Mestre Anderson chegou como surpresa e foi embora com o melhor show do Coala 2019.

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FOTOS WESLEY ALLEN Ney. Aos 78 anos, o cantor mostra disposição incansável e voz sob controle; Djonga foi outro destaque do domingo
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Público. Festival teve recorde com 26 mil pessoas

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