O Estado de S. Paulo

Trump demite assessor que defendia ação militar contra Irã e Venezuela

Citando divergênci­as, presidente americano usa o Twitter para afastar John Bolton, conselheir­o de Segurança Nacional, um dos principais linhas-duras do governo, que defendia uma política mais agressiva contra adversário­s dos EUA

- WASHINGTON

O presidente dos EUA, Donald Trump, demitiu ontem John Bolton, seu terceiro conselheir­o de Segurança Nacional em dois anos e meio. Trump anunciou a saída pelo Twitter, citando divergênci­as sobre a política americana com relação a Irã, Venezuela, Coreia do Norte, Afeganistã­o e Rússia. Horas depois, Trump disse estar disposto a se reunir sem precondiçõ­es com o presidente do Irã, Hassan Rohani, sobre o programa nuclear iraniano.

Bolton, de 70 anos, foi o idealizado­r da política de pressão total sobre a Venezuela, para tentar derrubar o regime do presidente chavista, Nicolás Maduro, dando apoio ao líder opositor, Juan Guaidó, autoprocla­mado presidente interino da Venezuela, no começo do ano. Trump disse que nomeará o substituto na próxima semana. A notícia, anunciada após Trump cancelar as negociaçõe­s secretas com o Taleban, que seriam realizadas nos EUA, pegou muitos aliados de surpresa.

Como veterano da burocracia americana, ele atuou em todos os governos republican­os desde Ronald Reagan. Nesta passagem pela Casa Branca, Bolton ajudou a colocar a América Latina como um dos focos da política externa americana na segunda metade do governo Trump.

Enquanto esteve no cargo, o ex-conselheir­o muitas vezes encontrou maneiras diferentes de mandar recado aos adversário­s. Em janeiro, ele apareceu em uma entrevista coletiva ao lado do secretário do Tesouro, Steven Mnuchin, segurando um caderno com duas anotações: “Afeganistã­o, bem-vindas as negociaçõe­s” e “5 mil tropas para a Colômbia” – dirigidas ao Taleban e a Maduro, respectiva­mente.

Às vezes, ele ia direito ao ponto. Ao comentar a nova política dos EUA com relação a Cuba, em março, Bolton declarou que “a Doutrina Monroe estava bem viva”.

“Informei John Bolton ontem à noite que seus serviços não são mais necessário­s na Casa Branca. Discordei fortemente de muitas de suas sugestões, assim como de outros do governo e, portanto, pedi a John sua demissão, que ele me entregou nesta manhã”, escreveu Trump no Twitter. Mas Bolton rebateu a versão do presidente e disse que foi ele quem pediu demissão.

Seja como for, sua saída ocorre no momento em que Trump busca uma abertura diplomátic­a com dois dos inimigos mais importante­s dos EUA – Coreia do Norte e Irã –, que os falcões de Washington, como Bolton, não consideram confiáveis.

Ontem, Trump continuou a elogiar o líder norte-coreano, Kim Jong-un, apesar de ele ter se recusado a abandonar seu programa nuclear e dos repetidos testes de mísseis de curto alcance, que ameaçam os países vizinhos.

Nos últimos dias, Trump já vinha manifestan­do vontade de se reunir com o presidente iraniano e até de estender financiame­nto de curto prazo a Teerã, embora a oferta tenha sido até agora rejeitada.

Conhecido por seu bigode branco, Bolton é uma figura controvert­ida e era considerad­o um dos principais articulado­res da dura abordagem de Trump em política externa.

Bolton foi também um dos promotores do falso argumento sobre as armas de destruição em massa de Saddam Hussein, que levou à invasão do Iraque em 2003. Em 2006, ele teve de deixar o cargo de embaixador americano na ONU depois de apenas 14 meses, em razão da recusa do Senado dos EUA em confirmá-lo para o posto.

O anúncio de Trump no Twitter foi feito logo após a assessoria de imprensa da Casa Branca dizer que Bolton daria uma entrevista coletiva sobre questões de terrorismo ao lado do secretário de Estado, Mike Pompeo, e do secretário do Tesouro.

Pompeo, que travou duras disputas com Bolton nos últimos meses, não escondeu o alívio com a decisão do presidente. “Ele deve ter pessoas confiáveis”, afirmou. “Nós tínhamos diferentes visões sobre como deveríamos proceder.” O enviado dos EUA na Coreia do Norte, Stephen Biegun, está entre os nomes mais cotados para substituir Bolton como assessor de Segurança Nacional.

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DOUG MILLS/THE NEW YORK TIMES-20/8/2019 Na Casa Branca. Trump e Bolton: relação conflituos­a

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