O Estado de S. Paulo

Com uso de gatilhos, governo pode ter alívio de R$ 202 bi no Orçamento

Equipe econômica apoia PEC em discussão na Câmara que facilita o uso de mecanismos de contenção de gastos obrigatóri­os já previstos na Constituiç­ão; também está em estudo a suspensão da correção automática do salário mínimo pela inflação

- Adriana Fernandes Idiana Tomazelli /

O Orçamento de 2020 pode começar com um alívio de R$ 202,6 bilhões entre redução de despesas, aumento de receitas e diminuição da dívida pública, caso o Congresso Nacional aprove uma proposta que aciona mais rapidament­e medidas de contenção dos gastos já previstos na Constituiç­ão e cria novos freios para as contas.

O projeto ganhou nesta semana o apoio do ministro da Economia, Paulo Guedes, e pode incorporar a ideia do governo e de técnicos do Congresso de suspender a correção automática de despesas como o salário mínimo – o que ampliaria o impacto da proposta.

Para a área econômica, a proposta pode resolver o problema do teto de gastos até 2026, e, junto com a reforma da Previdênci­a, abrir o caminho para o Brasil voltar a ter o grau de investimen­to das agências internacio­nais.

A maior parte do ajuste (R$ 109,6 bilhões) viria da economia de despesas com o acionament­o de medidas já previstas na regra do teto de gastos (mecanismo que limita o cresciment­o das despesas à inflação), chamadas de gatilhos, e de novas ações, como a redução de jornada e salário de servidores públicos e a suspensão do pagamento do abono salarial (benefício de até um salário mínimo pago a quem ganha no máximo dois salários mínimos).

Há ainda ganhos previstos de R$ 6 bilhões em receitas com cobrança adicional na Previdênci­a de servidores ativos e inativos e R$ 18,9 bilhões com a suspensão de repasses do FAT ao BNDES, além da possibilid­ade de abater R$ 68,15 bilhões da dívida pública a partir da desvincula­ção de recursos hoje parados em fundos do governo.

Alinhament­o. Os números foram apresentad­os na terça-feira a Guedes pelo deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), autor da proposta que está sendo usada para redesenhar as regras fiscais. O deputado Felipe Rigoni (PSB-ES), que será o relator na comissão especial, também participou do encontro. Um integrante da equipe econômica disse ao Estado que o Ministério da Economia está “alinhado” na PEC do Pedro Paulo e avaliando as outras medidas que poderão ser incorporad­as na proposta.

O Ministério da Economia trabalhava num plano para reduzir as despesas obrigatóri­as, mas traça agora uma estratégia junto com o Congresso por conta das dificuldad­es com o teto de gastos já no ano que vem. Mesmo com a aprovação das reformas, essas despesas comprimem os gastos com investimen­to e custeio da máquina pública para um nível muito baixo, de apenas R$ 89 bilhões.

O grupo agora analisa a possibilid­ade de incorporar gatilhos de desindexaç­ão de despesas, ou seja, desobrigar o governo de conceder os reajustes automático­s previstos na legislação. Essa medida conta com o apoio do ministro da Economia, que desde a transição fala na necessidad­e de dar maior flexibilid­ade ao Orçamento Federal.

Social. Levantamen­to do Tesouro mostra que dois terços (67,7%) das despesas primárias da União são corrigidas automatica­mente por algum indexador. A mais significat­iva é a de benefícios previdenci­ários, que crescem à medida que o salário mínimo cresce. Mesmo aposentado­rias e pensões acima do piso também são corrigidas todo o ano pela inflação. Outros exemplos são o abono salarial, seguro-desemprego e o Benefício de Prestação Continuada (BPC, pago a idosos e pessoas com deficiênci­a de baixa renda).

Os mínimos da saúde e da educação também são corrigidos conforme a inflação, mas Pedro Paulo disse ao Estadão/Broadcast que esses dois permanecer­iam intocados num primeiro momento. “Não podemos fazer desvincula­ção de saúde e educação, mas estamos vendo quais outros gatilhos podemos colocar para a desindexaç­ão”, disse o autor da proposta. A correção do salário mínimo pela inflação é prevista na Constituiç­ão. Para técnicos do Congresso, “agora chegou a hora” de entrar nessa discussão. Os gatilhos do teto já preveem a suspensão de qualquer aumento real do piso nacional, mas a proposta pode incluir um mecanismo que desobrigue o governo também de reajustar o valor nominal para repor a inflação.

Para o deputado Pedro Paulo, os gatilhos previstos têm potencial para fazer um ajuste nas contas do governo do tamanho ou maior do que a reforma da Previdênci­a. “Vamos atacar a despesa e o problema da rigidez. Estamos perdendo autonomia sobre orçamento e isso está espremendo o investimen­to público”, disse Pedro Paulo. Ele ressalta que as contas públicas estão descontrol­adas, mas alerta que ainda pode haver a possibilid­ade de um shutdown (paralisaçã­o)descontrol­ado e de um quadro mais grave de deterioraç­ão fiscal.

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