O Estado de S. Paulo

LONGA TRAJETÓRIA

Em entrevista, Irene Ravache fala de seu novo espetáculo solo, ‘Alma Despejada’, dirigido por Elias Andreato.

- Júlia Corrêa

Irene Ravache comemora 75 anos de idade estrelando o solo Alma Despejada, escrito por Andréa Bassitt e dirigido por Elias Andreato. Em cena, a atriz vive Teresa, uma senhora que, depois de morta, faz sua última visita à casa onde viveu com a família. O Divirta-se conversou com a atriz, que contou mais detalhes sobre a nova peça.

Como foi seu primeiro contato com o texto?

Eu conheço Andréa já faz um bom tempo; cheguei a produzir um trabalho dela. Sempre falava da vontade de ter um texto para mim, mas que também falasse sobre o Brasil, sem que fosse político ou defendesse algum lado. Um dia, ela chegou com um texto – e era exatamente sobre aquilo que eu queria falar. É muito bom estar no palco para comemorar meus 75 anos e também tantos anos de estrada.

De que forma surgem essas reflexões sobre o País?

À medida que a protagonis­ta relata o que houve com ela e com a família. É uma família de classe média que, de repente, se vê envolvida com tudo o que acontece no País. Ela revela logo no início que está morta e fala das memórias na casa em que viveu, mostrando o quanto isso é importante para ela.

O fato de ela já estar morta permite um distanciam­ento para essas reflexões?

Sim. Ao rememorar a vida dela, isso ocorre de modo bastante lúcido, muito questionad­or: ‘o que aconteceu?’, ‘por que aconteceu?’... Quando a gente está vivendo, muitas coisas nos escapam. O que você hoje tinha como verdade, amanhã, pode não ser.

Tem uma identifica­ção sua com a personagem?

Tem uma identifica­ção muito grande. Por sermos próximas, Andréa, não vou dizer que tenha me retratado, mas chegou muito perto das coisas que eu gostaria de dizer no palco. O fato de a gente falar sobre a morte poderia ser algo pesado, mas não me assusta. Principalm­ente pela forma muito bem-humorada como é apresentad­a. Fizemos algumas leituras; tivemos reações muito interessan­tes. Aliás, a reação das pessoas mais jovens vai ser muito importante para mim. Não é um texto falando sobre a morte. Pelo contrário, fala muito sobre a vida de um modo extremamen­te afetuoso.

Essa leveza foi uma forma que encontrara­m para refletir sobre este momento de polarizaçã­o, em que todos parecem ter tantas certezas? Uma forma não necessaria­mente ligada ao confronto?

Exatamente. Porque não é, em nenhum momento, um texto combativo, que defenda uma ideia. Aliás, ele faz uma coisa que é muito boa do teatro: ele expõe. O espectador vai para casa e pensa sobre aquilo. Uma vez me perguntara­m qual era a função do teatro. Eu acho que a principal função é mostrar. Como você depois vai reagir àquilo, o que vai acontecer, isso vai de cada um... Isso é uma coisa, inclusive, que está nos faltando. Respeitar o que as pessoas pensam, como elas são, por que tiveram determinad­as atitudes.

Como foi o trabalho com Elias Andreato?

Eu me sinto muito à vontade trabalhand­o com Elias. O afeto é a marca registrada dele. Isso, para mim, é muito importante. Eu não tenho tempo para ficar gastando com brigas, deboches ou gritos. Isso não me acrescenta como atriz e como pessoa. Além disso, ele é um ator primoroso. Andréa também é atriz; isso facilitou fortemente a comunicaçã­o nos ensaios. Vamos direto ao ponto, sem arestas, sem discussões inúteis – não é que não se discuta sobre o texto, sobre a vida, sobre tudo o que está acontecend­o. A nossa produção é uma produção de amigos. É um encontro de muito afeto.

ONDE: Teatro Porto Seguro (496 lug.). Al. Barão de Piracicaba, 740, Campos Elísios, 3226-7300. QUANDO: Estreia 4ª (18). 4ª e 5ª, 21h. Até 28/11. QUANTO: R$ 60/R$ 70. 80 min. 14 anos.

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JOÃO CALDAS

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