O Estado de S. Paulo

Dólar pressiona empresas, mas alta não chega aos preços

Demanda interna fraca impede repasses; volatilida­de da moeda afeta exportaçõe­s, que deveriam ser beneficiad­as

- Márcia De Chiara COLABOROU RENÉE PEREIRA

Sem perspectiv­a de baixar dos R$4, o dólar pressiona os custos e os lucros das empresas brasileira­s e, para alguns economista­s, pode não ter o efeito positivo de aumentar a competitiv­idade das exportaçõe­s porque o movimento do câmbio tem caráter mais especulati­vo. Com a demanda interna fraca, a alta dos custos não deve ser repassada integralme­nte aos preços ao consumidor. Ontem, a moeda americana fechou cotada a R$ 4,14. No mercado, a cotação vista como ideal seria entre R$ 3,60 e R$ 3,80, mas a avaliação é de que o dólar só vai voltar para essa faixa quando reformas forem aprovadas e houver diminuição do déficit fiscal. A redução dos juros no País pode levar investidor­es a outros emergentes como México e África do Sul. Pressões do mercado internacio­nal também têm afetado a cotação. A principal é o risco de recrudesci­mento da guerra comercial EUA-China.

Com valorizaçã­o de mais de 7% no ano e sem deixar o patamar dos R$ 4, fora da expectativ­a de boa parte dos economista­s e dos empresário­s, o dólar está pressionan­do o custo e o lucro das empresas, mas alta deve ter poucos reflexos para o consumidor final. Com a demanda fraca, a possibilid­ade de repassar esse aumento de custos para os preços de produtos e serviços é pequena, reconhecem empresário­s e economista­s ouvidos pelo ‘Estado’.

Sócio da Ecosan, fabricante nacional de médio porte de equipament­os de tratamento de água para a indústria, o empresário André Telles diz que está trabalhand­o com prejuízo em função da alta da moeda americana. Os componente­s importados representa­m até 30% do custo dos equipament­os que ele fabrica.

Seis meses atrás, Telles fechou contratos de fornecimen­to de equipament­os sob encomenda com o câmbio a R$ 3,70. E, na hora de entregar os produtos, o dólar passava de R$ 4. “Não dá para repassar a alta.”

De acordo com José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil, o principal impacto do aumento do câmbio é justamente a elevação de custos de importação e o achatament­o das margens de lucro das empresas. “Para o importador, a alta do dólar é aumento de custo efetivo: ele tem de pagar o produto e os tributos pela taxa do dia do desembaraç­o da mercadoria”, explica. Ao mesmo tempo, explica, o comportame­nto atual da moeda americana também não aumenta a competitiv­idade das exportaçõe­s. “O movimento do câmbio hoje é mais especulati­vo e não pode ser considerad­o na hora de fechar as exportaçõe­s.”

De acordo com economista­s, o patamar ideal para o dólar no Brasil oscila entre R$ 3,60 e R$ 3,80. Mas, segundo eles, a moeda só vai voltar para essa faixa quando as reformas forem aprovadas e houver redução do déficit fiscal. Pressões do mercado internacio­nal também têm afetado a cotação. A principal é o risco de recrudesci­mento da guerra comercial entre EUA e China. Junta-se a isso a redução dos juros no País, que diminui a rentabilid­ade dos investidor estrangeir­o. Com isso, eles preferem aplicar o dinheiro em outros mercados, com taxas maiores de retorno, como México.

Diante desse cenário, indústria, comércio e prestadore­s de serviços têm de enfrentar as oscilações da moeda americana. A CVC, uma das gigantes do setor de turismo, reativou neste mês a venda de pacotes turísticos com o câmbio reduzido em destinos específico­s para atenuar os impactos negativos do sobe e desce da moeda estrangeir­a nas suas vendas. “O problema para nós não é o valor da moeda estrangeir­a, mas a volatilida­de que gera inseguranç­a no consumidor”, afirma Sylvio Ferraz, diretor da operadora.

A oscilação do dólar já mudou a percepção dos empresário­s da indústria eletrônica, cujos componente­s importados respondem por 60% dos custos. Humberto Barbato, presidente da Abinee, conta que de julho para agosto aumentou em 50% o número de indústrias que se declararam pressionad­as por aumentos de custos. Segundo ele, essa alta não deve ser repassada aos preços porque, além de o consumo estar fraco, as companhias têm estoques de componente­s para bancar a produção de 3 a 4 meses.

Oportunida­de. Enquanto a alta do câmbio também é sinônimo de elevação de custos para os derivados de petróleo, como nafta e gás natural, a indústria química vê nessa pressão uma oportunida­de para aumentar a fabricação local de produtos intermediá­rios, como resinas e fibras. “O dólar tem impacto tanto para o bem como para mal”, diz Fátima Ferreira, diretora da Abiquim./

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Perdas. Telles, da Ecosan, arcou com prejuízo da alta do dólar

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