O Estado de S. Paulo

Adriana Fernandes

- E-MAIL: ADRIANA.FERNANDES@ESTADAO.COM ADRIANA FERNANDES ESCREVE AOS SÁBADOS

Paulo Guedes está sob ataque. A novidade é que a pressão parte do Planalto, em repetição do velho “fogo amigo”.

Paulo Guedes está sob ataque na Esplanada dos Ministério­s e fora dela. A novidade é que a pressão tem sido alimentada pelo Planalto. É o velho e conhecido “fogo amigo”, que já alvejou ministros poderosos da área econômica de governos passados.

Nas últimas semanas, a palavra que mais se ouve em Brasília é “entrega”. Guedes tem sido criticado pela demora em “entregar” a retomada da economia e a redução do desemprego. Sem falar da reforma tributária, que não sai e continua indefinida após a nova CPMF morrer por ordem do presidente Jair Bolsonaro.

A austeridad­e fiscal definitiva­mente não é boa companhia para nenhum presidente da República. Principalm­ente se o presidente, antes mesmo de terminar seu primeiro ano de governo, já se movimenta afrontosam­ente para garantir a reeleição.

A falta de dinheiro é ponto de partida para as investidas contra o ministro. Mas os ataques, que nascem como reação à política de aperto fiscal, têm nuances bem mais profundas.

A divisão no governo sobre mudar ou manter a regra do teto de gastos expôs claramente as contradiçõ­es internas entre a agenda do ultraliber­al ministro da Economia e a de assessores e ministros mais próximos do presidente, que ajudam a turbinar as intrigas. Eles já viram que, com o teto, o governo não deslancha na velocidade que querem.

O confronto subterrâne­o entre os dois grupos vai desde embates na área de privatizaç­ão de estatais (vide o desgaste com a Eletrobrás) à demora no perdão da dívida do mundo do agronegóci­o com a contribuiç­ão ao Funrural (promessa de Bolsonaro), e passa também pelos rumos do Minha Casa Minha Vida, pela política da Caixa para empréstimo­s a prefeitura­s e Estados aliados e pelo enfrentame­nto com o Judiciário. Só para começar a lista. O que os embates têm em comum é que eles se concentram na articulaçã­o errática do governo com o Congresso.

O negócio da tal articulaçã­o tem sido no varejo total. A cada aprovação de medidas, o governo é obrigado a reabrir a negociação e o cofre. Isso está custando muito dinheiro, e o confronto com a área econômica cresce.

Depois do teto, o mais recente ruído ocorreu com a proposta de desindexar o salário mínimo e as despesas vinculadas ao piso nacional. Na prática, o governo ficaria desobrigad­o a dar reajustes ao mínimo, mesmo que só para repor a inflação. Esse é um tema para lá de polêmico e que o time de Guedes pretendia enfrentar, mas foi abortado a mando de Bolsonaro.

Cabeças quase rolaram no Ministério da Economia por conta dos ruídos da semana passada em torno do assunto. Uma saída que, se concretiza­da, seria evidenteme­nte contabiliz­ada como mais um sinal de perda de autonomia do ministro, depois da queda do secretário especial da Receita Marcos Cintra. A saída do auxiliar do ministro chegou a ser interpreta­da como enfraqueci­mento de sua liderança.

Oriundo do baixo clero na Câmara, Bolsonaro tem obsessão em mostrar que é ele quem manda. Já bateu de frente com os militares e com o ministro da Justiça, Sérgio Moro. A demora da “entrega” serve bem a esse propósito. Como mostrou o Estado em reportagem recente, o presidente tem sim cobrado agilidade, mesmo que em público reforce o discurso de que está 100% alinhado com Guedes e que a culpa é da imprensa, que semeia discórdia.

Segundo auxiliares de Bolsonaro, o presidente se diz “agoniado” por estar “amarrado à política econômica”. E teme ver o “risco de o governo morrer por inanição”.

A equipe econômica, ao seu modo, tem se defendido da pressão com o argumento de que entregou muita coisa nesses nove meses de governo. A reforma da Previdênci­a aprovada na Câmara mesmo em meio à desarticul­ação política, as mudanças no mercado de gás, as negociaçõe­s internacio­nais para abertura de mercados, a queda dos juros, a liberação do FGTS, a redução do risco Brasil...

Um dos problemas de Guedes é que ele criou a expectativ­a de que haveria transforma­ções muito rápidas. Além disso, colocou muitas propostas na mesa ao mesmo tempo sem estarem completame­nte fechadas. Está pagando o preço por isso. Soma-se a isso a desorganiz­ação elevada nos processos de comando na equipe econômica depois da criação do superminis­tério da Economia. Muita arrumação a ser feita.

Para sair da linha de tiro do fogo amigo, o ministro precisa urgentemen­te frequentar mais o Planalto e falar mais para dentro do governo. Não pode sair de perto da órbita e dos ouvidos do presidente. Conselho que já lhe foi dado.

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