O Estado de S. Paulo

Compromiss­os com EUA ficam no papel

De 13 acordos firmados entre presidente­s Jair Bolsonaro e Donald Trump, apenas dois se concretiza­ram, segundo estudo da Amcham

- Beatriz Bulla CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

Desde a campanha eleitoral, Jair Bolsonaro deixou claro que gostaria de reorientar a política externa brasileira e alinhar o Brasil com os Estados Unidos. Em março, uma visita do presidente ao americano Donald Trump, na Casa Branca, selou a aproximaçã­o entre os dois líderes. Na ocasião, os dois presidente­s assinaram uma declaração conjunta e comemorara­m uma “nova era” no relacionam­ento econômico e político entre as nações. A maior parte das propostas concretas feitas por Bolsonaro e Trump ainda não saiu do papel. Um levantamen­to produzido pela Amcham (Câmara Americana de Comércio) e obtido pelo Estado aponta que apenas dois de 13 compromiss­os firmados há seis meses foram concretiza­dos. Os demais estão em curso.

Os dois compromiss­os que já saíram do papel foram a designação do Brasil como aliado extra-OTAN, pelos americanos, e a medida unilateral do governo brasileiro de isentar os turistas dos EUA de visto. Os demais ainda precisam de medidas do lado americano, brasileiro ou de algum avanço na agenda dos dois lados.

Apesar disso, a presidente da Amcham, Deborah Vieitas, vê os sinais como positivos. “Ambos os governos têm mostrado vontade de buscar maior integração comercial. Muitos compromiss­os demandam tempo para serem concluídos, o que não significa que as coisas não estejam acontecend­o”, afirmou.

Um dos compromiss­os mais aguardados pela comunidade empresaria­l é o avanço em medidas de facilitaçã­o de comércio e investimen­tos. Na prática, os empresário­s brasileiro­s esperam a negociação de um acordo de comércio entre os dois lados. Para Deborah, da Amcham, as ações de facilitaçã­o de comércio e de investimen­tos são essenciais “pois atacam as burocracia­s e gargalos que encarecem e até mesmo inibem os negócios no dia a dia”. Os dois países ressuscita­ram fóruns de discussão, como o Diálogo Comercial Brasil-EUA, para avançar na discussão. Segundo ela, no entanto, é também “fundamenta­l aproveitar a convergênc­ia política entre Brasil e Estados Unidos para iniciativa­s mais ambiciosas, sobretudo o início de negociaçõe­s de um acordo de livre comércio”.

“Embora esse objetivo não tenha entrado na lista de compromiss­os de março, ambos os presidente­s manifestar­am vontade nesse sentido. O melhor momento para alcançá-lo é agora”, afirmou. O governo brasileiro já admitiu que os países não devem discutir, em um primeiro momento, isenção de tarifas. E, mesmo sem colocar na mesa o debate sobre tarifas, os americanos ainda estão reticentes nas negociaçõe­s, segundo diplomatas ouvidos pelo Estado presentes nas últimas reuniões do chanceler, Ernesto Araújo, com autoridade­s da área econômica do governo americano.

Adesão. Do lado brasileiro, falta, por exemplo, a aprovação na Câmara dos Deputados do Acordo de Salvaguard­as Tecnológic­as. Negociado entre os países durante 20 anos e assinado em março, o acordo permite o uso comercial da base da Alcântara, no Maranhão. O Brasil também precisa de ações da Polícia Federal e Receita Federal para permitir a adesão do País no programa Global Entry, que dá maior celeridade à entrada de brasileiro­s nos EUA.

Os dois países tentam fechar, até o fim do ano, um acordo para acelerar trâmites de exportação, com reconhecim­ento mútuo de programa de cadastro e autorizaçã­o de exportador­es e importador­es.

Considerad­a uma das principais conquistas do Brasil na visita de Bolsonaro à Casa Branca, o endosso americano à entrada do País na OCDE é computada como um dos compromiss­os “em andamento”. Do lado dos americanos, houve a manifestaç­ão de apoio dos EUA, em maio, à entrada do Brasil. Mas o processo ainda não foi iniciado por impasses sobre a quantidade de novos membros a serem aceitos. Em troca do apoio americano, o Brasil concordou em renunciar ao tratamento especial e diferencia­do na Organizaçã­o Mundial do Comércio – o que também é considerad­o pela Amcham como um compromiss­o “em curso”, já que o processo é gradual e para discussões futuras.

Há acertos que ainda não foram destravado­s e, na visão empresaria­l, parecem incipiente­s. É o caso da carne bovina. Os EUA concordara­m em agendar

uma inspeção em frigorífic­os brasileiro­s no intuito de reabrir o mercado para a carne bovina in natura do Brasil. A inspeção foi feita, mas até agora não houve retomada das exportaçõe­s. O Brasil se compromete­u a abrir o mercado para a carne suína dos americanos, mas ainda há negociaçõe­s sobre os requisitos sanitários a serem estabeleci­dos.

O Brasil também aceitou criar uma cota para importação de trigo, o que ainda está em estágio de implementa­ção. No início do mês, o governo brasileiro atendeu um pleito dos americanos para reavaliar a cota de importação de etanol imposta pelo Brasil. O movimento foi avaliado no Departamen­to de Estado

dos EUA e na comunidade empresaria­l como um sinal concreto de que o País está disposto a negociar e fazer as demais questões avançarem mais rapidament­e.

Reuniões. Entre os compromiss­os firmados há ainda a recriação do Fórum de CEOs dos dois países e a criação de um fórum de energia. A reunião de assessoram­ento do primeiro acontece nesta semana na Amcham em Brasília e o encontro dos executivos deve acontecer em novembro, em Washington. Já o fórum de energia deve ter o primeiro encontro em outubro. Ambas também são considerad­as medidas em curso no levantamen­to da Amcham.

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KEVIN LAMARQUE/REUTERS-19/3/2019 Encontro. Bolsonaro e Trump na Casa Branca em março

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