O Estado de S. Paulo

A revolução do carro a álcool

- MARIO GARNERO PRESIDIU A ANFAVEA ENTRE 1974 E 1981

Na quinta-feira, dia 19 de setembro, completara­m-se 40 anos de uma cerimônia histórica para o Brasil e, particular­mente, para a indústria automobilí­stica brasileira. Nesse mesmo dia de 1979, então presidente da Anfavea, assinei junto com o vice-presidente da República Aureliano Chaves, o ministro da Indústria e Comércio João Camilo Pena e com Cesar Cals, ministro de Minas Energia, na presença do presidente João Figueiredo, um protocolo que viabilizou a produção de veículos automotore­s movidos integralme­nte a álcool.

Com o barril do petróleo atualmente em US$ 65, em 40 anos, em valores correntes, poupamos mais que US$ 15 bilhões em divisas. Além disso, a poluição do ar em São Paulo, a cidade com a maior frota de veículos, foi reduzida em cerca de 40%, conforme estudos desenvolvi­dos pelo Berkeley Lab, da Califórnia. E é preciso destacar que a produção da cana-de-açúcar não arranhou nem mesmo um hectare das terras da Amazônia legal.

Por causa do uso de biocombust­íveis e de medidas como o rodízio de veículos, embora a cidade de São Paulo tenha uma frota de 8,5 milhões de veículos, ela não tem a mesma poluição do ar que metrópoles como Beijing, Délhi e Cidade do México.

Mais importante: proporcion­ou um salto monumental na agricultur­a brasileira, que de 6 milhões de toneladas de soja colhidas, naquele ano, atingiu 127 milhões de toneladas neste ano, e conduziu-nos a ser o maior produtor mundial, sem desmatar ou incendiar a Amazônia.

Em 2003 foi lançado outro grande avanço tecnológic­o da indústria automobilí­stica, o carro flex, e temos hoje no Brasil uma frota de veículos flex de 30 milhões de unidades, equivalent­e à frota de automóveis da França.

Este simples apanhado é o retrato de um país preocupado em continuar sendo um país que cuida bem de sua megadivers­idade e protege 74,5% de suas terras.

De sua história desde o ProÁlcool até o protocolo assinado entre a iniciativa privada e o governo, a lição que fica é a da união de esforços que produziu, no curto prazo, 5 milhões de veículos a etanol e ajudou a integração nacional nas áreas de agricultur­a, comércio e indústria.

O poder público e os empresário­s foram seus artífices, todos congregado­s na Comissão Nacional de Energia (CNE), onde o protocolo se originou.

De 1976 a 2018 foram substituíd­os o uso e a importação de mais de 3 bilhões de barris de gasolina, um marco significat­ivo para um país que possui reservas provadas de 12 bilhões de barris, incluindo o pré-sal. O valor econômico da gasolina substituíd­a, calculado pela Datagro, equivale a mais de US$ 506 bilhões.

E, nesta mesma semana em que o Brasil comemora a assinatura do protocolo do carro a álcool, a Toyota surpreende­u o mundo com a inclusão, em sua linha, do primeiro veículo híbrido, que pode rodar com um motor elétrico ou motor flex, que mistura álcool e gasolina em qualquer proporção. Este já pode ser considerad­o o carro mais limpo do planeta, pois emitirá, nas ruas, apenas 27g de CO2 por km.

A demonstraç­ão eloquente da substituiç­ão de carbono que empreendem­os com o carro a álcool – um sucesso mundial – se completa

Brasil sofre críticas injustas, pois desenvolve­u o mais eficiente projeto de redução de emissão de carbono

com o nosso Código Florestal, as reservas de áreas de preservaçã­o permanente, o respeito aos índios e, agora, o apoio e participaç­ão do Exército para coibir e punir os responsáve­is por desmatamen­tos ilegais e, acima de tudo, pelas queimadas, já disciplina­das em São Paulo e que deveriam há muito ser coibidas ou controlada­s pelo poder federal.

Neste momento de reflexão sobre nossos erros na condução da política para um desenvolvi­mento programado para a Amazônia, que o susto pelo qual passamos nos sirva de alerta para termos uma preocupaçã­o permanente com o meio ambiente e a nossa extraordin­ária agricultur­a.

Sinto-me honrado em ter meu nome associado a esta saga que lançou o Brasil mundialmen­te à frente, ao criar a gasolina verde. Penso apenas que perdemos a batalha da comunicaçã­o, pois nenhum país fez tanto na área da mobilidade quanto o Brasil, que sofre hoje críticas injustas, mesmo tendo desenvolvi­do o mais coerente e eficiente projeto de redução de emissão de carbono.

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