O Estado de S. Paulo

Parque Nacional Lauca

Entre lagoas e lhamas

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Toda simpática, a lhama é a criatura mais pop do grupo. Pelagem fofa como a de um poodle que acabou de sair do pet shop, um sorriso de canto de boca que parece saudar o visitante. A alpaca também tem o corpo recoberto de lã e, por isso, o mesmo aspecto gorducho – mas o pescoço e o focinho são mais curtos. A vicunha é a mais delicada de todas: compacta, delgada, quase uma prima do Bambi de Walt Disney. O guanaco fica no meio do caminho entre a alpaca e a vicunha – é o único que tem a cara preta.

Depois de um dia inteiro no Parque Nacional Lauca, com as explicaçõe­s de um bom guia, fica fácil entender quem é quem. O contato com esses animais, todos membros da família dos camelídeos, está entre as experiênci­as mais marcantes da visita. Da janela do carro, o zoom da câmera nem sempre consegue capturar os detalhes dos bichos que surgem ao redor da estrada. Mas há vários trechos, como nas ruínas do povoado de Parinacota, em que é possível avistá-los bem de perto, pastando ou bebendo água em lagos. E, de perto, eles são ainda mais adoráveis.

Mas há mais para ver. A paisagem é dominada pelo Lago Chungará, de cerca de 15 quilômetro­s quadrados de extensão, com águas em tom esmeralda que podem estar parcialmen­te congeladas, a depender da época do ano. Ao seu redor, impõemse dois vulcões gêmeos sem atividade, Parinacota (cujo cume, a 6.340 metros, é o ponto mais alto do parque) e Pomerape, sempre cobertos de neve. Em uma das extremidad­es, o lago deságua em várias pequenas lagoas, cercadas por rochas vulcânicas, as Lagunas Cotacotani. Mais de cem espécies de aves, de gaivotas e taguas até flamingos corde-rosa, podem ser vistas por ali.

Portas abertas. É um cenário contemplat­ivo, que pede uma degustação demorada – o que não combina com bate-volta. Até porque, a 4.590 metros de altitude, é preciso entender e aceitar que o corpo passa a funcionar em outro ritmo. Com o ar mais rarefeito, o fôlego fica curto; se você tentar se movimentar na velocidade de sempre, vai se sentir como se estivesse correndo uma maratona.

O parque se espraia por uma área de 138 mil hectares, sem fronteiras delimitada­s ou cobrança de ingresso. A partir de Putre, são pouco mais de 30 km de distância. Você vai percorrend­o a Carretera 11, rumo à fronteira com a Bolívia e, de repente, sem maior aviso, surgem os vulcões e o lago à sua esquerda.

O caminho tem alguns mirantes onde se pode estacionar com segurança e apreciar a vista. Eles são a única estrutura para o visitante: não há sinal de banheiro, lanchonete ou posto de gasolina – por isso, é preciso trazer tudo o que é necessário para passar o dia. Os guias sabem disso – e vêm prevenidos.

Vocação mochileira. Putre não é mais que um punhado de ruas. Algumas casas de pedra talhada, uma praça, o posto bancário que faz as vezes de casa de câmbio. San Pedro de Atacama também era assim há 25 anos – pelo menos é o que garantem os que frequentav­am o vilarejo antes de ele se transforma­r em destino concorrido.

Ao lado dos dois únicos hotéis do povoado de 2 mil habitantes, há vários albergues. Vale registrar que Putre foi um dos poucos lugares no meu giro pelo norte do Chile em que encontrei outros viajantes, todos com o mesmo perfil: mochileiro­s interessad­os em destinos de aventura.

Em frente à praça, uma loja vende xales, ponchos, cachecóis e pashminas feitos com lã de diversos tipos. A mais nobre é a de alpaca: fina como seda e, ao mesmo tempo, tem a maior resistênci­a térmica, o que garante proteção contra os ventos gelados que cortam Lauca. A título de comparação, enquanto um poncho de lã de ovelha custa 18 mil pesos (pouco mais de R$ 100), uma peça similar de alpaca chega a 95 mil pesos (R$ 560).

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