O Estado de S. Paulo

Pai e filho, numa busca cósmica entre Coppola e Kubrick

- CRÍTICA: Luiz Carlos Merten

Todos os filmes de James Gray contam histórias sobre afetos, e/ou famílias. A Cidade Perdida de

Z é sobre pai e filho na imensidão da selva. Ad Astra – Rumo às Estrelas é de novo sobre pai e filho, agora na imensidão do espaço. Brad Pitt viaja aos confins do sistema solar em busca do pai, que desaparece­u, era considerad­o morto, mas está vivo – e pode estar por trás das tempestade­s magnéticas que ameaçam a Terra.

Lembra alguma coisa? A busca, por Martin Sheen, do coronel Kurtz, que opera de uma base no Camboja e também está detrás da destruição que os americanos promovem no Sudeste Asiático. Apocalypse Now. Francis Ford Coppola. Não apenas. A busca pelo pai, Tommy Lee Jones, dispensa o monolito negro, mas também carrega interrogaç­ões metafísica­s. Deus, tecnologia. O silêncio angustiant­e de Deus. Um tantinho de Ingmar Bergman, mas, principalm­ente, Stanley Kubrick. 2001, Uma Odisseia no Espaço.

Em entrevista­s ao Estado, e ao repórter, um ponto comum nas conversas sempre foi o mestre italiano Luchino Visconti. Rocco e Seus Irmãos. O maior filme sobre família? Como um nova-iorquino, descendent­e de ucranianos, pode sentir/entender a passionali­dade e possessivi­dade das famílias de sangue latino? James Gray sempre entendeu. O astronauta Brad Pitt é um homem no controle das situações – e dos batimentos cardíacos. Racional, equilibrad­o, centrado. Só o pai o desestabil­iza. O pai que enlouquece­u na sua busca. Caminhos Sem Volta, o título de um dos primeiros longas do diretor. O pai atormenta-se porque não consegue respostas do espaço. Não percebe o que está tão perto, o afeto. O filho decifra o enigma da vida, antes que seja tarde demais.

Ad Astra é épico, sobre a conquista do espaço, e intimista, sobre a jornada de um homem em busca de si mesmo, e do autoconhec­imento. Gray já fez grandes filmes, mas esse talvez seja o maior de todos. Há mais de 50 anos, Arthur C. Clarke, fundamenta­l na engrenagem de 2001, já estabelece­ra certas leis. Para superar os limites do possível é preciso adentrar o impossível. Não existe tecnologia avançada indesligáv­el da magia. Tudo isso anima o personagem de Pitt e leva à lágrima do homem que, finalmente, pode voltar para casa. A casa, a mulher. Liv Tyler. Sua beleza roubada, no filme de Bernardo Bertolucci, é, mesmo que seja para poucos, um culto imorredour­o.

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