O Estado de S. Paulo

No Rock in Rio, Espaço Favela é a novidade

Música. Líderes de projetos sociais explicam pontos positivos e negativos de novo palco

- Guilherme Sobota

O Espaço Favela, nova área do Rock in Rio que terá mais de 30 apresentaç­ões durante os sete dias do evento (27 a 29 de setembro e 3 a 6 de outubro), reservará espaços para que 18 empreended­ores mostrem e vendam seus trabalhos para o público do festival. Todos eles com origens em favelas no Estado do Rio. Alvo de críticas nas redes sociais, o espaço ganhou a defesa de alguns líderes de projetos sociais e culturais com sede em favelas no Rio.

Para o diretor da ONG Atitude Social, projeto no Morro Dona Marta, zona sul do Rio, Robespierr­e Ávila, essa será uma oportunida­de de artistas e empresário­s mostrarem seus trabalhos para um público diferente. “As comunidade­s são muito ricas culturalme­nte, mas às vezes a própria imprensa reproduz mais a morte do que iniciativa­s de moradores e coletivos”, critica.

Nas redes sociais, as principais críticas ao Espaço Favela citam os casos de violência registrado­s no noticiário e apontam que muitos dos moradores das favelas não teriam condições de adquirir os ingressos para o festival (uma entrada inteira, para um dia, custa R$ 525).

Para Ávila, porém, essa confusão de raciocínio­s sempre existiu, e extrapola o âmbito do festival. “Isso é um problema antigo. Sempre foi separado, favela e asfalto. A cultura procura justamente acabar com essa divisória. Enquanto existir essa separação, a favela segue entrando pela porta dos fundos do Rock in Rio, mas esse me parece um primeiro passo.”

Ele explica, ainda, que o uso do termo “favela” não deve ser encarado como um problema. “Seria inadequado usar Espaço Comunidade, porque aí realmente as pessoas moram ali, etc. Mas ‘favela’ é uma palavra que já está no coloquial das pessoas, uma palavra do cotidiano.” Ele ainda compara a iniciativa do festival com o turismo comumente praticado na cidade. “Turista faz isso também. Vem, compra um pacote para ver os pontos principais, mas aí algumas pessoas querem tocar instrument­os na ONG, beber no bar da favela, conhecer as pessoas. É paradoxal.”

A fundadora da ONG Semente do Futuro, de Bangu, Selminha, tem uma leitura parecida. “Acho o máximo (o Espaço Favela

do Rock in Rio)”, explica. “O fato de levar os talentos de dentro da favela para lá. A favela é um mar de cultura, de fraternida­de, mas é estigmatiz­ada como um local do qual não sai nada, em que as pessoas são aborrecida­s. Isso não é a verdade.”

Já o diretor do Projeto Morrinho, da favela Pereira da Silva no bairro das Laranjeira­s, Cirlan Oliveira, não se mostrou muito entusiasma­do com a iniciativa do Rock in Rio. “O investimen­to no festival é imenso, são empresas com enorme poder aquisitivo. Por que só agora eles abriram esse espaço?”, questiona. Ele não quis inscrever sua ONG – que trabalha com artes visuais, empreended­orismo e educação – no programa da parceria do festival com o Sebrae, que selecionou os expositore­s.

“Favela é favela, Rock in Rio é Rock in Rio”, disse. “Pode ser uma oportunida­de grande para esses artistas e empresário­s (que estarão no festival), mas nós temos que ter essa malícia. Qual é o interesse? Temos que saber ver os dois lados.”

Em entrevista na época em que o projeto foi apresentad­o, o curador Zé Ricardo afirmou que a intenção é mostrar artistas com origens nas favelas para um público amplo. “A ideia não é dar voz, eles já têm vozes, a ideia é revelar novos talentos das comunidade­s e como desdobrame­nto abrir uma conversa com a sociedade sobre a maneira de olhar as favelas”, afirmou.

Entre as atrações anunciadas para o Espaço, estão o rapper carioca BK, a Orquestra Maré do Amanhã, a festa Heavy Baile com Tati Quebra Barraco e MC Carol, o grupo de rap Abronca, o rapper Delacruz, e a Roda de Samba Festa na Raça. O Espaço Favela também receberá três apresentaç­ões diárias do grupo de teatro Nós do Morro, com 40 componente­s da companhia, sempre a partir das 14h50.

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WILTON JUNIOR / ESTADÃO Montagem. Espaço Favela receberá mais de 30 apresentaç­ões; criação da área causou controvérs­ia nas redes sociais

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