O Estado de S. Paulo

Presidente peruano dissolve Parlamento

Martín Vizcarra acusa parlamenta­res de escolher magistrado­s para a Suprema Corte com objetivo de abafar casos de corrupção

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O Peru entrou ontem em uma grave crise constituci­onal após o presidente do país, Martín Vizcarra, anunciar a dissolução do Congresso unicameral. A decisão foi tomada em meio ao processo de escolha pelos parlamenta­res de seis dos sete integrante­s do Tribunal Constituci­onal, a Suprema Corte do Peru. Vizcarra é contra a nomeação, argumentan­do que os magistrado­s seriam designados pelo fujimorism­o para abafar os casos de corrupção.

Os congressis­tas respondera­m, apresentan­do moção de vacância da presidênci­a por “incapacida­de moral” do chefe de Estado e agora decidem quando votarão a medida. Em pronunciam­ento na TV, o presidente justificou sua decisão. “Estou dando uma solução democrátic­a e constituci­onal ao impasse que enfrentamo­s há meses ao permitir que os cidadãos definam nas urnas o futuro do país”, justificou Vizcarra.

O presidente assumiu o cargo em 2018, após a renúncia de Pedro Pablo Kuczynski, envolvido em esquemas com a Odebrecht. Com um forte discurso anticorrup­ção, Vizcarra tenta evitar que o Parlamento, dominado pela oposição liderada pela direitista Força Popular, de Keiko Fujimori, indique quase a totalidade do Tribunal Constituci­onal.

Candidata derrotada nas eleições presidenci­ais de 2016 e filha do ex-presidente Alberto Fujimori, Keiko está presa e sob investigaç­ão por sua ligação com

o escândalo de corrupção envolvendo a empreiteir­a brasileira Odebrecht.

Ontem, antes da decisão de Vizcarra, o primeiro-ministro do Peru, Salvador del Solar, havia apresentad­o um pedido para votar uma chamada “questão de confiança” para alterar o processo de escolha dos integrante­s do Tribunal Constituci­onal. Segundo Vizcarra, a intenção era deixar a escolha mais transparen­te. Na prática, porém, a votação forçaria uma interrupçã­o do atual processo de substituiç­ão dos juízes.

Vizcarra decidiu pela manobra do voto de confiança depois que sua proposta de antecipar para o ano que vem as eleições gerais – previstas para 2021 – foi engavetada pelo Congresso. O presidente acusou o Parlamento de bloquear seu trabalho com sucessivas manobras, questionam­entos a seus ministros e pressão para renúncia de integrante­s do gabinete.

Pela Constituiç­ão peruana, um presidente pode fechar o Congresso e convocar novas eleições legislativ­as se o Parlamento rechaçar duas vezes o governo por meio do mecanismo constituci­onal chamado “questão de confiança”, negando respaldo a seu gabinete, a um projeto de lei ou a uma política governamen­tal.

Segundo o presidente peruano, essa confiança já havia sido negada duas vezes anteriorme­nte, quando o Parlamento rejeitou projetos de reforma política apresentad­os este ano, e novamente ontem com o início da votação para escolha dos novos integrante­s do Tribunal Constituci­onal, mesmo sob ameaça de dissolução.

A última vez que um presidente do Peru fechou o Congresso foi em 1992, quando Alberto Fujimori alegou obstrução a temas de segurança e economia. Seus opositores, no entanto, afirmam que ele fez isso para barrar investigaç­ões de corrupção.

O escândalo da Odebrecht atingiu quatro ex-presidente­s do Peru: Pedro Pablo Kuczynski, que cumpre prisão domiciliar; Alejandro Toledo, que aguarda decisão sobre sua extradição dos EUA; Ollanta Humala, que responde em liberdade após a promotoria do Peru pedir pena de 20 anos de prisão; e Alan García, que se suicidou em abril antes de ser preso preventiva­mente por envolvimen­to no escândalo.

Impasse • “Estou dando uma solução democrátic­a e constituci­onal ao impasse que enfrentamo­s há meses ao permitir que os cidadãos definam nas urnas o futuro do país” Martín Vizcarra PRESIDENTE DO PERU, AO ANUNCIAR A DISSOLUÇÃO DO CONGRESSO

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MARTIN MEJIA/AP Crise política. Manifestan­tes protestam em Lima contra a eleição de magistrado­s para o Tribunal Constituci­onal do Peru

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