O Estado de S. Paulo

Odebrecht mantém versão sobre propina a Lula por Angola

Em depoimento à Justiça, empresário ratifica pagamento como ‘contrapart­ida’ a financiame­nto do BNDES

- Ricardo Brandt Fausto Macedo Pedro Prata

Ouvido ontem na condição de delator pelo juiz federal Vallisney Oliveira, da 10.ª Vara Federal de Brasília, o empresário Marcelo Odebrecht ratificou versão anterior sobre o pagamento de propina em favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como resultado da liberação de financiame­nto do BNDES para projetos da empresa em Angola, na África. Lula é réu em dois processos penais abertos na Justiça de Brasília.

O principal, que trata do suposto acerto de US$ 40 milhões de propinas ao PT pela liberação da linha de crédito do BNDES em 2010, tem também como alvo o ex-ministro Paulo Bernardo. O outro processo apura corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de influência envolvendo o ex-presidente e Taiguara Rodrigues dos Santos, conhecido como “sobrinho de Lula”. A investigaç­ão deriva da Operação Janus, deflagrada em 2016 como desdobrame­nto da Lava Jato.

“Naquela época, eu tinha uma conta corrente que eu e (Antonio) Palocci (ex-ministro) administrá­vamos, e que pertencia ao PT, Lula e que, na verdade, era fruto de um combinado de Lula com meu pai (Emílio Odebrecht). Quando havia pedidos de valores para ajudar o PT, saia dessa conta corrente”, disse Marcelo.

Ainda em seu depoimento, o empresário voltou a mencionar a existência de uma “Planilha Italiano”, na qual eram indicadas duas “contrapart­idas” (que seriam os negócios onde houve cobrança condiciona­l de propinas). Um deles envolveu justamente a operação da empreiteir­a em Angola. “Foram, de fato, contrapart­idas solicitada­s, e que geraram créditos.”

Em quase uma hora e meia de depoimento, Marcelo também acusou o pai e o ex-executivo da Odebrecht Alexandrin­o Alencar de “contradiçõ­es” ao falarem à Justiça sobre a participaç­ão do ex-presidente e o acerto de valores. “Como a relação de Lula pertencia ao meu pai, eu tinha de referendar esses valores com ele, buscar a autorizaçã­o dele. Só que agora ele está dizendo em depoimento que nunca conversou com Lula sobre valores.”

Como delator, ele afirmou que não teve participaç­ão direta nos supostos acertos com o ex-presidente, mas que tanto o pai como Palocci e outros executivos teriam relatado pedidos feitos por Lula. Afirmou ainda que manteve o teor de sua colaboraçã­o premiada – homologada em 2017 pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Após depoimento prestado na sexta-feira passada, no processo principal, defesas dos réus chegaram a apontar o que seria um “recuo” do empresário.

Marcelo foi presidente do grupo de 2009 até 2015, quando foi preso pela Lava Jato. Cumpriu dois anos de prisão e hoje está agora em regime domiciliar, monitorado por tornozelei­ra eletrônica. No depoimento, frisou que a “relação de Lula pertencia” ao pai, Emílio, mas que referendav­a valores com ele.

“Respondo pela minha colaboraçã­o e pelo o que falei. Se pessoas acertaram propinas e disseram que não acertaram, elas que têm de responder. Posso responder pela minha colaboraçã­o.”

Sobre Taiguara, o delator voltou a contar que o então diretor da Odebrecht em Angola Ernesto Bayard o comunicou que havia a solicitaçã­o de “apoio”. “O que eu soube foi que, por volta de 2011, que houve pedido de Lula, não sei se a meu pai ou a Alexandrin­o, para que pudéssemos subcontrat­ar o sobrinho dele em Angola.”

Defesa. Ainda na sexta-feira, o advogado de defesa de Lula, Cristiano Zanin Martins, disse que os depoimento­s de Marcelo e de Emílio, somados, deixariam claro que “o ex-presidente não praticou nenhum ato ilícito que foi imputado a ele nessa ação.” Procurado novamente ontem pelo Estado, o advogado não havia respondido até a conclusão desta edição.

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NA WEB Áudio. Ouça o depoimento de Odebrecht estadao.com.br/e/audiomarce­lo

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