‘Heathers’ trata de bullying e suicídio
Musical inspirado em filme dos anos 1980 fala de temas atuais como violência da vida adolescente e assédio no ensino médio
Em uma época em que temas indigestos, como bullying e suicídio de adolescentes, são felizmente discutidos abertamente, a estreia da versão nacional de Heathers, o Musical ajuda a estimular o debate por meio da arte. Escrito por Kevin Murphy e Laurence O’Keefe, o espetáculo é baseado no roteiro de Daniel Waters para o filme de Michael Lehmann de 1988 que, no Brasil, se chamou Atração Mortal. Se não foi um sucesso de bilheteria e de crítica, ao menos serviu para consolidar a carreira de Winona Ryder e Christian Slater, além de abrir portas para outros produtos do gênero de mais sucesso, como Meninas Malvadas (2004), as famosas Mean Girls.
Heathers revela-se um musical de prazeres culposos ao acompanhar uma turma do ensino médio dos Estados Unidos, nos anos 1980 – lá, destacam-se três garotas, conhecidas como Heathers, que são as mais populares e temidas figuras do colégio, que insultam e menosprezam os inteligentes e os sensíveis, mas, mesmo assim, são alvo de inveja de quase toda a escola. Como Verônica Sawyer, garota que, em seu último ano no curso, decide entrar no seleto grupo das Heathers, abrindo mão, assim, de seus escrúpulos.
O que torna a história realmente polêmica é a figura de JD, rapaz que surge para seduzir Verônica a fim de convencêla a dar cabo de um plano macabro que a livraria do bullying: eliminar as Heathers, disfarçando o assassinato como se fosse suicídio – é importante lembrar que Verônica é ótima falsificadora de caligrafia, o que ajudaria a dupla a criar falsas cartas de despedida.
No filme Atração Mortal, JD, vivido por Slater, além de matar as Heathers, tenta liquidar também a própria Verônica e explodir a escola antes de finalmente se matar. Esse desvio de caráter estava presente ainda em uma série que a Paramount preparou no ano passado, intitulada justamente Heathers. Quando o programa estava para estrear, no entanto, em junho do ano passado, a emissora foi obrigada a adiar por conta das mortes acontecidas no mesmo ano, na escola de Parkland, na Flórida, depois que um exaluno assassinou 17 pessoas.
“O musical preserva o que seria justificável em uma história dessa, ou seja, a sátira, o sarcasmo, até o que seria um desserviço”, conta o ator Diego Montez, que vive JD, na montagem dirigida por Fernanda Chamma, que acaba de estrear no teatro Viradalata. “Hoje, há um culto em todo mundo a Heathers e isso se reflete aqui.”
De fato, há dois anos, quando descobriu que Fernanda iria ver alguns espetáculos em Londres com a intenção de adquirir os direitos autorais, Montez a incentivou a assistir às Heathers. “Mas não consegui e o assunto parecia enterrado quando, meses depois, descobri que os direitos estavam disponíveis no Brasil”, conta a encenadora, também conhecida pelo talento no trabalho de coreografia de inúmeros espetáculos.
Em sua concepção, a montagem brasileira quebra a tradição em que a atuação se limita ao palco, originando cenas a partir da plateia. Mais que isso: em todas as sessões, haverá lugares disponíveis dentro do palco, para os espectadores que comprarem um ingresso especial. “Eles deverão chegar com 40 minutos de antecedência e serão instruídos a participar de determinadas cenas”, explica Daniela Stirbulov, que também assina a direção.
Para manter o frescor de um clima estudantil, a produção nacional é formada por dois grandes elencos, que se revezam nos espetáculos – principalmente nos papéis das Heathers e também no de JD, pois Montez grava cenas da novela Bom Sucesso, o que o impede de ter mais disponibilidade. “É um personagem fascinante: sedutor mesmo praticando tanta maldade”, explica o ator.
Também Verônica é um desafio para a atriz Ana Luiza Ferreira, especialmente na área vocal. “A partitura é empolgante e exige muito do elenco por não ser óbvia”, comenta.