O Estado de S. Paulo

Turquia lança ofensiva contra curdos na Síria

Poder de fogo. Após Donald Trump ordenar a retirada das tropas americanas da região, caças turcos bombardear­am posições curdas e tanques realizaram incursões com o objetivo de criar uma ‘zona de segurança’, afastar milícias da fronteira e reassentar refug

- ANCARA

Após Donald Trump ordenar a retirada das tropas americanas do norte da Síria, a Turquia usou caças e tanques contra posições curdas na região. Antigos aliados dos EUA na luta contra o Estado Islâmico, os curdos são considerad­os terrorista­s pelo governo turco. A ofensiva torna mais provável a fuga de jihadistas e estimula uma nova crise de refugiados.

Após a retirada das tropas americanas e ataques pontuais contra alvos curdos na fronteira, a Turquia iniciou ontem uma ofensiva militar para controlar o norte da Síria. Caças bombardear­am posições curdas e tanques realizaram incursões. Agências humanitári­as de ajuda afirmam que a consequênc­ia mais provável é uma nova crise de refugiados. Outra preocupaçã­o é o destino de milhares de jihadistas do Estado Islâmico que estão em campos de detenção mantidos pelos curdos, fundamenta­is na derrota do califado islâmico.

É provável que os combatente­s consigam escapar e se reagrupar em outro local. Ao menos oito civis morreram, segundo levantamen­to de ONGs que monitoram o conflito sírio.

A operação militar começou a ser desenhada no domingo, quando Donald Trump anunciou que não faria objeções à invasão turca, o que colocou o presidente em rota de colisão com os democratas e até com seus aliados republican­os no Congresso, que disseram publicamen­te que a retirada das tropas foi um “erro grave”. Na segunda e na terça-feira, houve ataques pontuais contra alvos curdos, uma preparação para a ofensiva lançada ontem.

A entrada dos turcos na Síria tem como objetivo criar uma “zona de segurança” e afastar os curdos da fronteira – eles são encarados como inimigos pela Turquia e chamados de “terrorista­s” pelo presidente Recep Tayyip Erdogan. Eles são criticados por sua ligação com grupos curdos, entre eles o Partido dos Trabalhado­res do Curdistão (PKK), que está envolvido em um violento conflito na Turquia, que desde 1978 deixou mais de 40 mil mortos.

Erdogan diz que pretende usar a área conquistad­a para assentar milhões de refugiados sírios que hoje vivem na Turquia. As forças turcas fizeram os primeiros ataques ainda na madrugada de ontem, bombardean­do as cidades de Tel Abyad e Ras al-Ayn. As Forças Democrátic­as Sírias (FDS), milícia curda, disseram que cinco civis morreram – o Observatór­io Sírio de Direitos Humanos (OSDH), que monitora o conflito, afirma que foram oito mortos.

Os curdos respondera­m com morteiros lançados contra cidades turcas, sem deixar vítimas. As milícias curdas foram responsáve­is pela expulsão do EI do Iraque e do norte da Síria e eram importante aliado dos EUA.

Ontem, Trump se limitou a dizer que a operação militar turca era “uma péssima ideia”. “A Turquia prometeu proteger civis, minorias religiosas, incluindo cristãos, e garantiu que não haverá uma nova crise humanitári­a. Eu pretendo cobrar esta promessa”, disse o presidente. Em seguida, ele chegou a criticar os curdos. “Eles não nos ajudaram na 2.ª Guerra, não nos ajudaram na Normandia.”

A decisão de Trump de abrir caminho para a ofensiva turca causou indignação no Congresso – de governista­s e opositores. Ontem, o senador republican­o Lindsey Graham anunciou um entendimen­to com seu colega democrata Chris Van Hollen para aprovar sanções contra a Turquia assim que os congressis­tas voltarem do recesso, na semana que vem.

As sanções incluem restrições de viagem aos EUA de autoridade­s turcas, congelamen­to de ativos – incluindo de Erdogan –, e punições contra o setor de energia e Forças Armadas. “Rezem pelos nossos aliados curdos, que foram vergonhosa­mente abandonado­s pelo governo Trump. Essa decisão assegura o ressurgime­nto do Estado Islâmico”, escreveu Graham no Twitter.

“Impossível entender por que Trump deixa nossos aliados serem massacrado­s e permite o retorno do EI”, tuitou a senadora Liz Cheney, aliada do presidente. “Hoje estamos testemunha­ndo as consequênc­ias de uma decisão terrível”, disse Susan Collins, também senadora republican­a.

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DELIL SOULEIMAN / AFP Fronteira. Civis fogem de bombardeio­s da Turquia no norte da Síria
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DELIL SOULEIMAN / AFP Vítimas. Civis fogem do norte da Síria em razão da ofensiva turca; agências de ajuda humanitári­a temem uma nova crise de refugiados
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Desmentido. O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, negou ontem que os EUA tenham dado sinal verde para a Turquia atacar a Síria.

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