O Estado de S. Paulo

Futuro do presidente equatorian­o está nas mãos do Exército

- Elías L. Benarroch É JORNALISTA

Opresident­e Lenín Moreno atravessa seu pior momento desde que foi eleito, em maio de 2017. Milhares de manifestan­tes exigem que ele volte atrás no corte dos subsídios aos combustíve­is, uma exigência para que o FMI libere um pacote de ajuda. “Exigimos a revogação das medidas econômicas”, disse Guillermo Churuchumb­i, ex-presidente do movimento indígena Kayambi. Para ele, o objetivo é “diálogo”, não o fim do governo de Moreno.

Desde os anos 90, os povos indígenas adquiriram um poder político consideráv­el no Equador. Por meio de suas organizaçõ­es, eles conseguira­m obter uma grande capacidade de influencia­r muito além de sua representa­tividade demográfic­a – eles são 7% da população (segundo levantamen­to da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe, levando em conta apenas aqueles que ainda vivem em tribos). Essa relevância ocorre em razão de sua idiossincr­asia, caracteriz­ada pelo espírito andino de resistênci­a, tomada de decisão coletiva e um forte poder de mobilizaçã­o, que se traduz em uma massa de dezenas de milhares de pessoas dispostas a alcançar o objetivo definido por seus líderes comunitári­os.

Em sua estratégia, bloqueiam estradas – às vezes sem nem sequer ocupá-las –, criam uma crise de abastecime­nto urbano e levam o caos para as grandes cidades. Eles garantem que fazem tudo guiados pelo interesse coletivo das nacionalid­ades, 13 no total. Churuchumb­i explica que a suposta relação do movimento com o “correísmo” é totalmente infundada e garante que as acusações são uma trama de “conspirado­res” que querem derrubar Moreno.

Os indígenas estão nas ruas agora após anos de frustração por Moreno impulsiona­r a mineração e ignorar suas promessas de preservar suas terras. Educação, água, poluição, petróleo e mineração se tornaram componente­s explosivos de uma bomba-relógio perfeita prestes a explodir. Nos últimos dias, o presidente estendeu a mão para a Confederaç­ão de Nacionalid­ades Indígenas da Equador (Conaie), mas foi rejeitado. Para o analista Santiago Basabe, os povos indígenas têm dificuldad­e para superar um discurso atrasado, muito ligado ao vandalismo, aos saques e à destruição do patrimônio público.

A luta da Conaie se soma à dos sindicalis­tas e à da oposição, que nos últimos dias também protestam contra o pacote econômico de Moreno. As medidas causaram um aumento no preço dos combustíve­is, entre eles o diesel, que é o oxigênio dos agricultor­es e afeta diretament­e os povos indígenas, já que 70% deles vivem em áreas rurais.

A pressão indígena provou ser eficaz há duas décadas, quando derrubou o presidente Jamil Mahuad, em 2000. Eles também desgastara­m a presidênci­a de Lucio Gutiérrez, de 2003 a 2005, e causaram alguns problemas para Rafael Correa, principalm­ente depois que ele, em 2013, decidiu abrir a Reserva Natural Yasuni, na Amazônia, à exploração de petróleo.

A grande questão é qual será o impacto dos indígenas agora, no governo de Moreno, que mantém apoio de empresário­s e do Exército. As manifestaç­ões, a repressão em meio a um estado de exceção, as eventuais vítimas e a desordem social serão decisivas para o presidente, que, em um gesto sem precedente­s na história política equatorian­a, mudou temporaria­mente a sede do seu governo para Guayaquil. O futuro de Moreno depende, mais do que nunca, do apoio crucial das Forças Armadas.

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