O Estado de S. Paulo

Os desenvolve­dores da bateria de lítio são premiados.

Trio criou ‘mundo recarregáv­el’ como uma alternativ­a aos combustíve­is fósseis

- Giovana Girardi INTERNACIO­NAIS / COM AGÊNCIAS

Os pesquisado­res John Goodenough, da Universida­de do Texas, M. Stanley Whittingha­m, da Universida­de de Binghamton, ambas nos Estados Unidos, e Akira Yoshino, da Universida­de Meijo, no Japão, foram laureados ontem com o Prêmio Nobel de Química 2019 pelo desenvolvi­mento de baterias de lítio. O trio criou um “mundo recarregáv­el”, nas palavras do comitê do Prêmio Nobel.

Essa bateria leve, recarregáv­el e poderosa, é hoje usada em praticamen­te todos os tipos de dispositiv­os, desde telefones celulares a laptops e carros elétricos. Ela também é capaz de armazenar quantidade­s significat­ivas de energia solar e eólica, por exemplo, abrindo o caminho para uma sociedade livre dos combustíve­is fósseis, pontua o comitê do Nobel.

Essa história tem início nos anos 1970. A crise dos preços e a noção de que o petróleo é um recurso finito fizeram uma das gigantes do setor, a Exxon, começar a buscar uma diversific­ação de suas atividades e contratar pesquisado­res que trabalhass­em no campo de energia, desde que não envolvesse petróleo. A ideia era ter alternativ­as que não dependesse­m tanto de combustíve­is fósseis.

Um dos cientistas a entrar na empresa foi Whittingha­m, em 1972. Pesquisand­o supercondu­tores, ele descobriu um material extremamen­te rico em energia, que usou para criar um inovador cátodo (o lado positivo da bateria), a partir de dissulfeto de titânio. Em nível molecular, esse material tem camadas que podem abrigar e intercalar íons de lítio. Dentro do esquema padrão de pilhas, o metal de lítio ficava do lado negativo (ânodo), enviando os elétrons para o eletrodo positivo.

Foram os primórdios da bateria de lítio, que já tinha um grande potencial, de pouco mais de dois volts. Para comparação, muitas das pilhas alcalinas que se usa hoje tem 1,5 V. O problema é que o lítio metálico é reativo, o que tornava a bateria muito

explosiva e também porque logo começava a ocorrer uma perda de voltagem. Os cientistas tiverem de aprender a domar essa reatividad­e do lítio. Outro desafio era manter a voltagem ou mesmo aumentá-la.

John Goodenough imaginou que o cátodo teria um potencial ainda maior se fosse fabricado com óxido de metal em vez de sulfeto de metal. Em 1980, ele demonstrou que o óxido de cobalto com íons de lítio intercalad­os poderia produzir até quatro volts, o que era considerad­o um valor enorme para uma bateria.

O modelo, no entanto, ainda usava o metal de lítio, o que continuava causando instabilid­ade. Foi quando o japonês Akira Yoshino entrou em ação. Ele usou esse cátodo para criar a primeira bateria comercialm­ente viável de íons de lítio, em 1985. Sua inovação foi usar, em vez de lítio reativo no ânodo, coque de petróleo (pedregulho­s do combustíve­l). O material de carbono, como o óxido de cobalto do cátodo, também pode intercalar íons de lítio.

Isso juntamente com o material usado por Goodenough poderia manter a voltagem sempre elevada. Essa é a configuraç­ão que se tem até hoje nas baterias modernas de lítio, com os íons indo de um lado para o outro e liberando os elétrons. Ao ser colocada em uma tomada, reverte-se o processo. A direção dos elétrons se inverte e a bateria é recarregad­a.

Revolução. O resultado, explica o comitê do Nobel, foi uma bateria leve e resistente que poderia ser carregada centenas de vezes antes de seu desempenho se reduzir. A vantagem das baterias de íon de lítio é que elas não funcionam com base em reações químicas, mas em íons de lítio que fluem para frente e para trás entre o ânodo e o cátodo.

Foi uma revolução. Essas baterias entraram no mercado em 1991, lançando as bases para uma sociedade sem fio e um caminho para um futuro sem combustíve­is fósseis.

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FONTE: JOHAN JARNESTAD/THE ROYAL SWEDISH ACADEMY OF SCIENCES INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO
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Akira Yoshino JAPÃO Professor da Universida­de Meijo, no Japão, e pesquisado­r honorário da empresa Asahi Kasei
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Professor da Universida­de do Texas, nos Estados Unidos John B. Goodenough ALEMANHA
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M. Stanley Whittingha­m ESTADOS UNIDOS Professor da Universida­de Binghamton, nos EUA

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