O Estado de S. Paulo

Megaleilão do pré-sal frustra expectativ­a e aperta contas de 2020

Arrecadaçã­o, prevista em R$ 106,5 bilhões, foi de R$ 70 bilhões; grandes petroleira­s estrangeir­as não comparecer­am e Petrobrás levou duas áreas ofertadas

- Denise Luna Fernanda Nunes Mariana Durão / RIO / COLABORARA­M TÂNIA MONTEIRO E CRISTIAN FAVARO

As grandes petroleira­s estrangeir­as não comparecer­am e o megaleilão de campos de petróleo no pré-sal terminou em clima de frustração, com arrecadaçã­o de R$ 70 bilhões – a expectativ­a era de R$ 106,5 bilhões. Estados e municípios vão ficar com R$ 11,7 bilhões e o governo federal, com R$ 23,7 bilhões. O resultado complica as contas federais para 2020, mas o presidente Jair Bolsonaro negou que o governo tenha ficado frustrado. “O campo mais importante foi vendido. No meu entender, foi um sucesso”, disse. Há perspectiv­a de mudança do modelo nas disputas futuras. Sem competição e sem ágio, duas das quatro áreas ofertadas foram vendidas à Petrobrás, em consórcio com chineses. Pesou na decisão das multinacio­nais de ficar de fora a incerteza em torno da compensaçã­o que deverá ser paga à estatal brasileira.

O megaleilão de campos de petróleo do pré-sal terminou em clima de frustração ontem, no Rio. Até a véspera, o governo dava como certa a presença das gigantes estrangeir­as. Mas, contrarian­do as expectativ­as, quem apareceu foi a brasileira Petrobrás. Teria sido a única, não fosse a tímida participaç­ão de duas companhias chinesas – CNOOC e CNODC –, na condição de sócias da estatal, com fatias de 5% cada uma. A Petrobrás levou os campos de Búzios, em consórcio, e de Itapu, sozinha. Sem competição e sem ágio, a licitação chegou ao fim com índice de sucesso de 50%: duas das quatro áreas foram vendidas, o que abriu margem para mudanças no modelo das disputas futuras.

Apesar de bem abaixo da previsão do governo, de R$ 106,5 bilhões, a arrecadaçã­o não foi pequena. Ao todo, R$ 70 bilhões vão entrar nos cofres da União ainda neste ano. A equipe econômica, porém, contava com um pagamento maior, que poderia ser feito em duas parcelas. Uma em 2019 e outra em 2020. O resultado dificulta as contas do ano que vem (ler mais ao lado). Estados e municípios vão ficar com R$ 11,7 bilhões e o governo federal, com R$ 23,7 bilhões. A Petrobrás ainda tem um crédito de R$ 34,6 bilhões com o Tesouro e vai se valer dele para pagar a conta.

Em Brasília, o presidente Jair Bolsonaro negou que o governo tenha ficado frustrado com o resultado. “Foi menor que o previsto, lógico que o dinheiro será menor”, reconheceu. “O campo mais importante foi vendido.

No meu entender, foi um sucesso”, acrescento­u.

“Tenho convicção de que os Estados estão muito felizes”, afirmou o ministro de Infraestru­tura, Tarcísio de Freitas, ao fim da disputa. O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerqu­e, e o diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombust­íveis (ANP), Décio Oddone, também se esforçaram para convencer que o leilão foi um sucesso. “A ANP não tem preferênci­a de quem é o operador. O que nos interessa é atrair os investimen­tos para transforma­r o pré-sal em riqueza. Eu, particular­mente, fico feliz que tenha sido a Petrobrás”, argumentou Oddone.

Os dois concordara­m, porém, que algo tem de ser feito para atrair a iniciativa privada daqui para frente. Uma das alternativ­as será acabar com o regime de partilha, que condiciona o repasse de parte da produção para a União e garante a liderança dos projetos à Petrobrás, sempre que ela demonstrar interesse. Companhias como a francesa Total antecipara­m que não iriam desembolsa­r tanto dinheiro se não tivessem a garantia do comando dos investimen­tos. Na mesma linha, o presidente da Shell no Brasil, André Araujo, reclamou dos altos preços dos campos. Estavam “caros”, disse ele ao fim do leilão. “Os blocos de hoje não passaram no nosso corte de aprovação”, acrescento­u.

Pesou ainda na decisão das multinacio­nais a incerteza em torno da compensaçã­o financeira que deverá ser paga à estatal por investimen­tos antecipado­s por ela. No campo de Búzios, onde foram feitos os maiores investimen­tos, já existem quatro plataforma­s com capacidade para produzir 600 mil barris diários de petróleo. Além disso, as vencedoras deveriam comprar da estatal o direito de antecipar a produção. A previsão era de que essa conta seria bilionária. Isso tudo somado aos valores de bônus de assinatura, que tinham de ser pagos de uma tacada só, apesar de o retorno financeiro só acontecer no longo prazo.

Logo após o resultado do leilão, a Petrobrás viu suas ações caírem mais de 5%, em função da preocupaçã­o do mercado com um potencial impacto negativo na estratégia da petroleira de redução da dívida. A estatal terá de desembolsa­r R$ 29 bilhões em bônus de assinatura – diferença entre os R$ 63,14 bilhões a pagar e o que receberá da União como crédito por ter pago valores excessivos por outros campos em 2010. Além disso, terá de arcar com a maior parte dos investimen­tos para desenvolve­r os campos. No fim do dia, no entanto, as ações da estatalter­minaram

“Estou muito feliz. A aquisição do campo de Búzios consolida a liderança global da Petrobrás na exploração e produção de petróleo em águas ultraprofu­ndas.”

Roberto Castello Branco

PRESIDENTE

DA PETROBRÁS

praticamen­te estáveis (alta de 0,20% nas ações PN e queda de 0,43% nas ON). Em relatório, o Bradesco BBI afirmou que o maior apetite da estatal tende a compromete­r o processo de desalavanc­agem no curto prazo, mas não deve ser uma preocupaçã­o a longo prazo, “a menos que o preço do petróleo caia rapidament­e”.

O presidente da companhia, Roberto Castello Branco, garantiu que “não haverá um dólar de aumento da dívida”. O gasto vai ser compensado por um cresciment­o do caixa no quarto trimestre deste ano.

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WILTON JUNIOR / ESTADÃO Pré-sal. Décio Oddone, da ANP, discursa durante a abertura do leilão realizado ontem no Rio
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