Os juros de um dígito vieram para ficar?
Especialistas falam sobre a realidade brasileira e como lidar com o dinheiro nesse contexto inédito
OBrasil está sob um cenário novo, onde predominam os juros de um dígito – projeta-se que a Selic (juro básico da economia) se acomode em 4% ou menos até o final de 2020, uma realidade que muitos brasileiros vão experimentar pela primeira vez. A novidade vem amparada pelas conjunturas externa e interna. Neste último caso, sobressai a regra do teto de gastos, aprovada em 2016, período em que os juros começaram a cair graças à perspectiva de ajustes no gasto público federal. Aliada a isso, a aprovação pelo Congresso da reforma da Previdência também reforça a ancoragem. “Em termos gerais, falamos de um país que iniciou uma agenda de consolidação fiscal, e este é o pano de fundo para a taxa de inflação e, assim, para a taxa Selic em patamares mais comparáveis com o resto do mundo. O Brasil pode finalmente se beneficiar da inflação mundial mais baixa”, avalia Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos.
É possível confiar nessa nova realidade? Para responder à pergunta, é preciso levar em conta a capacidade de o Brasil crescer com robustez. Os marcos regulatórios passam uma mensagem positiva aos empresários, mas ainda insuficiente. “Crescer pouco deixa o País vulnerável a choques. Quanto aos juros de um dígito, ainda que o Banco Central precise rever a Selic, é pouco provável que a taxa volte aos patamares antigos, garantindo maturidade, o que é importante para uma sociedade que tem o juro baixo como valor. Isso foi compreendido pela classe política”, diz Zeina.
“No passado, a queda de juros gerava pressão inflacionária, e esse sintoma não existe hoje, não apenas pela alta taxa de desemprego e ociosidade na indústria, mas porque está em curso uma série de reformas importantes, que impacta diretamente os contratos de trabalho, evitando repassar aos salários as alterações da inflação”, afirma José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos e professor da PUC-Rio. “As empresas racionalizam sua produção, diminuem custos e evitam reajustar preços”, continua. Outro fator fundamental, na visão do economista, é ter um Banco Central que corta subsídios e diminui o tamanho do BNDES, reduzindo a pressão inflacionária. “É algo permanente. Trata-se de um regime mais forte do que aquele de anos atrás, voltado para um sistema fiscal sustentável. Se isso se mantiver, entramos numa trajetória positiva de longo prazo.”