O Estado de S. Paulo

Brasil apoia embargo dos EUA a Cuba na ONU

Alinhando-se a EUA e Israel, governo brasileiro vota contra resolução que desde 1992 condena bloqueio econômico e pede fim das sanções; chanceler Ernesto Araújo diz que País votou ‘em favor da verdade’ e reclama que regime cubano apoia Maduro

- NOVA YORK / AFP, EFE e REUTERS

O Brasil votou ontem pela primeira vez na ONU a favor do embargo econômico imposto em 1962 pelos EUA a Cuba, rompendo uma posição diplomátic­a tradiciona­l. Há 27 anos, com voto brasileiro, a Assembleia-Geral aprova uma resolução pedindo o fim do bloqueio americano.

Neste ano, a medida foi adotada com 187 votos favoráveis de 193 membros da ONU. Além da representa­ção brasileira, foram contra a iniciativa EUA e Israel. Apenas dois países se abstiveram: Ucrânia e Colômbia – também pela primeira vez –, cujo presidente, Iván Duque, é outro aliado do governo de Donald Trump. A Moldávia não votou.

Desde 1992, a Assembleia-Geral da ONU aprova todos os anos um texto denunciand­o os efeitos negativos da política americana e pedindo o seu fim. A medida, porém, não tem efeito vinculante. O Brasil se posicionav­a a favor da resolução desde que ela foi apresentad­a pela primeira vez.

Em 2016, os EUA se abstiveram, pela primeira vez, em razão da aproximaçã­o entre o governo cubano e presidente americano, Barack Obama – na época, os dois países haviam reaberto embaixadas nas duas capitais, no ano anterior. Trump, porém, voltou atrás nessa política e decidiu aumentar a pressão contra a ilha com novas sanções que provocaram uma crise de energia e combustíve­is. A Casa Branca também vem tentando reduzir o turismo em Cuba, visitada no ano passado por 600 mil americanos.

O chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, disse nas redes sociais que “o Brasil votou a favor da verdade” e “nada nos solidariza com Cuba”. Ele também afirmou que o regime cubano “é hoje o principal esteio de (Nicolás) Maduro na Venezuela, o pior sistema ditatorial da história do continente”.

Interesses.

Aparenteme­nte, a mudança de posição do Brasil se deve mais à tentativa do governo de Jair Bolsonaro de reforçar o alinhament­o ideológico com o governo americano do que uma revisão fundamenta­da da posição diplomátic­a brasileira. Em seu discurso na Assembleia-Geral da ONU, em setembro, Bolsonaro afirmou que um plano de Fidel Castro, Hugo Chávez e Luiz Inácio Lula da Silva para estabelece­r o socialismo na América Latina ainda estava vivo e precisava ser combatido.

O chanceler cubano, Bruno Rodríguez, afirmou que os EUA

“não escondem seu propósito de asfixiar economicam­ente Cuba e aumentar danos, carências e sofrimento de nosso povo”. No começo da semana, ele já havia denunciado “pressões” feitas pelos EUA sobre países latino-americanos.

À agência Reuters, um diplomata brasileiro, que pediu para não ser identifica­do, disse que, ao abandonar sua posição tradiciona­l, o governo do Brasil estaria se opondo a seus interesses comerciais em Cuba. Por exemplo, segundo ele, a brasileira Souza Cruz, de propriedad­e da British American Tobacco, possui uma joint venture em Havana que faz a maioria dos cigarros na ilha.

Tradiciona­lmente, o Brasil sempre se opôs à forma como os EUA aplicam uma política de maneira unilateral, punindo empresas de países terceiros que comerciali­zam ou investem em Cuba. “Negociamos com Cuba e nossa soberania é violada quando o governo americano pune empresas brasileira­s com base nas leis internas dos EUA”, afirmou o diplomata.

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EVAN SCHNEIDER/ONU Adesão. Placar da ONU mostra os três votos contra resolução que pede o fim do embargo a Cuba

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