Inflação sem combustível
Dinheiro curto e muita cautela nas compras continuam freando a inflação, ainda bem abaixo da meta anual de 4,25%. Com desemprego alto e famílias ainda inseguras, empresas têm dificuldade para repassar aumentos. Bens de consumo e serviços pessoais ficaram 0,10% mais caros em outubro, até superando previsões do mercado (mediana de 0,07%). Mas sem susto: a taxa foi a menor para o mês desde 1998 (0,02%), de acordo com os dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). No ano, a variação acumulada ficou em 2,60%. Em 12 meses, em 2,54%. O levantamento é do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Quase com lupa, o gerente do sistema de índices de preços do IBGE, Pedro Kislanov da Costa, encontrou um possível sinal de pressão da demanda no custo da refeição fora de casa: o custo desse item passou de -0,06% em setembro para +0,24% em outubro. Mas a recuperação da demanda, admitiu o economista, continua “lenta e tímida”.
A dificuldade do repasse em ambiente de alto desemprego e demanda contida é confirmada pelos indicadores produzidos pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Entre janeiro e outubro, o Índice Geral de Preços (IGP) aumentou 4,96%, puxado pelos preços no atacado (IPA), seu principal componente, com peso de 60% na formação do conjunto. No ano, o IPA subiu 5,94%, mas os preços ao consumidor só avançaram 2,82%. Em outubro, até recuaram 0,09%, enquanto a inflação no atacado prosseguiu.
O aperto das famílias pode frear só os preços mais dependentes da condição do mercado. Isso fica claro quando se examinam detalhes do IPCA. A inflação foi puxada, durante meses, principalmente pelos preços monitorados, dependentes direta ou indiretamente da intervenção do poder estatal. Esse grupo inclui, entre outros, os preços da energia elétrica, do transporte público, dos combustíveis, dos medicamentos, dos planos de saúde e dos serviços de água e esgoto.
Esses preços variam sem depender da demanda dos consumidores. As contas de eletricidade, por exemplo, sobem ou descem com a variação das bandeiras verde, amarela e vermelha, acompanhando as condições das chuvas e a necessidade maior ou menor de uso das centrais termoelétricas.
Nos 12 meses até novembro do ano passado, quando os monitorados subiram 7,38%, o IPCA aumentou 4,05%. Nos períodos seguintes, até maio deste ano, as altas acumuladas dos preços monitorados foram quase sempre superiores a 6%. O IPCA medido em 12 meses avançou de 3,75% em dezembro até 4,94% em abril e 4,66% em maio. A partir daí começou o declínio. Em outubro, o IPCA de 12 meses ficou em 2,54%, enquanto os monitorados acumularam alta de 2,21%.
Com inflação contida e consumidor cauteloso, o Banco Central (BC) tem prosseguido na redução de juros iniciada no trimestre final de 2016. Em sua última reunião, o Comitê de Política Monetária do BC (Copom) cortou a taxa básica de 5,5% para 5%. Mais um corte de 0,5 ponto poderá ocorrer em dezembro, antes de uma provável pausa. Isso beneficiará de imediato o Tesouro Nacional, pela redução do custo de sua enorme dívida. Poderá beneficiar as empresas, com mais uma redução do custo do financiamento e, talvez, dar um empurrão no consumo.
Um moderado estímulo ao consumidor já resultou da expansão do crédito pessoal, mas com efeitos ainda muito limitados. O modesto incentivo resultante do acesso a contas do Fundo de Garantia (FGTS) e do PIS-Pasep talvez produza algum aumento de compras neste fim de ano. Diretores do BC já expressaram essa expectativa. Economistas da Confederação Nacional do Comércio (CNC) também andaram exibindo algum otimismo quanto aos efeitos desses incentivos, da queda de juros e da extensão dos prazos de pagamento. Sua nova projeção é de crescimento de 4,8% do volume de vendas neste ano. Um pouco mais de entusiasmo dos consumidores será bom para os negócios e, um pouco adiante, para a criação de empregos, sem mexer muito na inflação.