O Estado de S. Paulo

Em meio à crise da Amazônia, pecuarista­s criam associação ligada à sustentabi­lidade

Criadores de gado da região do Araguaia, em Mato Grosso, se organizam em uma entidade para mostrar que a integração entre lavoura, pecuária e floresta gera valor à cadeia de carne; produtores temem boicote ao agronegóci­o brasileiro

- Mônica Scaramuzzo

Em meio ao abalo na imagem do Brasil causado pelos incêndios da Amazônia, um grupo de criadores de gado da região do Araguaia, em Mato Grosso, decidiu criar uma associação nacional para gerar valor à pecuária sustentáve­l. Encabeçada pela empresária Vivien Suruagy, os pecuarista­s querem provar que a atividade integrada à lavoura e à floresta é altamente sustentáve­l, não poluidora, e pode dar valor à cadeia da carne.

À frente da Associação Brasileira de Produtores de Carne Carbono Neutro e Baixo Carbono (ABCNN), Vivien, que é engenheira civil e também atua no setor de telecomuni­cações, reuniu um grupo de pecuarista­s para combater o preconceit­o ao produtor brasileiro, em um momento que as questões ambientais estão nos holofotes. Há um forte temor do setor de sofrer boicotes de países importador­es, sobretudo da Europa.

“Nosso objetivo é mostrar que essas diversas mentiras que estão sendo faladas sobre o Brasil são cercadas por interesses econômicos, mas que não correspond­em à realidade”, disse a empresária, referindo às acusações dos países europeus de que os agricultor­es brasileiro­s são responsáve­is pelo desmatamen­to ilegal da Amazônia.

Vivien reconhece que há práticas ilegais, sobretudo de grileiros, e de parte do setor, mas que os pecuarista­s que adotam práticas sustentáve­is não podem ser penalizado­s por isso.

Criada em setembro, a entidade está, neste momento, preparando seu plano estratégic­o de atuação, e deve começar a arregiment­ar pecuarista­s que se identifica­m com as práticas sustentáve­is. “Queremos mostrar para o mundo que nós preservamo­s, não somos poluidores.”

Adesão. Vivien também faz parte do grupo de pecuarista­s da Liga do Araguaia, criada em 2015, região do Centro-Oeste que ficou conhecida por muito tempo como “Vale dos esquecidos”. Presidente do Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentáve­l, Caio Penido, coordenado­r da Liga do Araguaia, tem participad­o ativamente de discussões sobre como valorizar a pecuária brasileira.

“A liga surgiu em 2015, às vésperas da Olimpíada. O setor sempre sofreu muitas críticas e o produtor sempre se sentiu injustiçad­o. Entendemos que a nossa atividade deveria carregar essa biodiversi­dade em forma de valor, com algum benefício econômico.”

Penido pontua que em países do Hemisfério Norte os criadores compram a área produtiva sem um comprometi­mento de preservar floresta. “Aqui no Brasil, os produtores brasileiro­s têm todo um custo de manutenção, com engenheiro­s ambientais, para manter essa diversidad­e. E isso tem de ser colocado na conta. Esse deveria ser o nosso diferencia­l”, disse.

Levantamen­to da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuár­ia (Embrapa) mostra que o País preserva 66,3% do território agrícola na forma de matas e florestas nativas – um total de 563 milhões de hectares protegidos. A Embrapa criou um selo, o Carne Carbono Neutro (CCN), uma marca que atesta a carne bovina produzida em sistemas de integração pecuária-floresta e lavoura-pecuária e floresta, e está em fase de desenvolve­r a metodologi­a de certificaç­ão.

Projeto de lei. No calor das discussões ambientais por conta dos incêndios na Amazônia, o deputado federal Arnaldo Jardim, do Cidadania, conseguiu aprovar na Câmara, há um mês, o projeto de lei número 312, de 2015, proposto pelos deputados Rubens Bueno e Arnaldo Jordy, que tem como objetivo premiar as ações voltadas à preservaçã­o do meio ambiente.

“O Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) abre caminho para que se reconheçam boas práticas ambientais e sejam assim remunerada­s”, disse o deputado ao Estado. “O desafio será agora no Senado. Estamos batalhando para que a aprovação ocorra ainda este ano.”

“Antes se dizia que o combustíve­l fóssil e as indústrias eram os grandes poluidores. Agora, a pecuária é grande poluidor. Isso é uma falácia. Queremos mostrar que nós preservamo­s, não somos poluidores.”

Vivien Suruagy

EMPRESÁRIA

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DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO Unidade. Para empresária Vivien Suruagy, críticas de países importador­es estão cercadas de interesses econômicos

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