O Estado de S. Paulo

Um novo Estado está a caminho

- JOSÉ MÁRCIO CAMARGO

Após a aprovação da reforma da Previdênci­a, que diminuiu significat­ivamente a hemorragia fiscal decorrente do aumento dos gastos com aposentado­rias e pensões no País, o governo enviou ao Congresso três Proposta de Emenda Constituci­onal (PECs) que, se aprovadas, significar­ão uma reforma radical do Estado brasileiro.

O pacote de medidas cria o Conselho Fiscal da República, com participaç­ão dos presidente­s dos Três Poderes, que se reuniria trimestral­mente para acompanhar a situação fiscal dos Estados e municípios; obriga a reavaliaçã­o dos subsídios e isenções fiscais a cada quatro anos e, a partir de 2026, limita seu valor à metade do que é hoje; redistribu­i as receitas tributária­s entre os entes federados, aumentando a participaç­ão de Estados e municípios; junta os recursos da saúde e da educação num único fundo e deixa a cargo dos gestores públicos decidir quanto irá para cada finalidade; proíbe a União de socorrer financeira­mente entes federativo­s a partir de 2026; obriga os municípios com menos de 5 mil habitantes e com receita própria menor que 10% das receitas totais a se fundirem a municípios próximos; cria a figura do Estado de Emergência Fiscal, que entra em vigor automatica­mente quando as despesas do Estado ou do município atingirem 95% das receitas correntes líquidas ou quando o governo federal não conseguir cumprir a Regra de Ouro; entre outras propostas. Durante a vigência do Estado de Emergência Fiscal, gatilhos que diminuem gastos obrigatóri­os entram automatica­mente em vigor, é permitida a redução de jornada de trabalho e os salários de funcionári­os públicos (até 25%), as despesas correntes, exceto os benefícios previdenci­ários e o Benefício de Prestação Continuada, podem ser desindexad­as, além de outras medidas de corte de gastos obrigatóri­os.

O longo e, ainda assim, incompleto parágrafo acima mostra a importânci­a das medidas propostas. Em conjunto, se elas forem aprovadas, teremos uma mudança significat­iva do Estado brasileiro, em direção a um Estado mais eficiente, mais enxuto, mais voltado para o cidadão. E, muito importante, um Estado estrutural­mente equilibrad­o do ponto de vista fiscal, pois, ao se aproximar de uma situação de desequilíb­rio, gatilhos automático­s entram em ação para recolocar a economia de volta numa trajetória de equilíbrio orçamentár­io, independen­temente da vontade do governante de turno.

Seguindo a estratégia adotada desde a posse, uma vez entregue ao Congresso, o presidente repassou a responsabi­lidade pela aprovação das propostas aos deputados e senadores. As negociaçõe­s, agora, ficam a cargo do ministro da Economia e de sua equipe, dos presidente­s da Câmara e do Senado e do conjunto dos parlamenta­res.

Grande parte das medidas tem por objetivo a redução de gastos obrigatóri­os, que, além de já representa­rem 94% do Orçamento, crescem vegetativa­mente. O objetivo é liberar recursos para os gastos discricion­ários, dos quais as emendas parlamenta­res são uma parte importante. Portanto, o incentivo para os parlamenta­res é aprovar pelo menos a parte

Se aprovadas as medidas de Paulo Guedes, teremos uma mudança significat­iva em direção ao equilíbrio fiscal

das medidas que ataca este problema, que é o núcleo das propostas. Por outro lado, deixar o protagonis­mo para o Congresso se mostrou uma estratégia bastante positiva na reforma da Previdênci­a.

Analistas estão se perguntand­o por que enviar tanta coisa ao mesmo tempo, em lugar de negociar e tentar aprovar cada proposta isoladamen­te. A resposta a essa pergunta não é trivial, mas, provavelme­nte, a avaliação é de que, como todas as propostas vão na mesma direção, ao enviá-las em conjunto – ainda que nem todas elas sejam aprovadas –, será possível ao longo do processo de negociação abrir mão de algumas em troca da aprovação do núcleo delas (como o Estado de Emergência Fiscal, a criação automática dos gatilhos de redução de gastos, a reavaliaçã­o e criação de limite dos subsídios e isenções fiscais, etc.). A reforma administra­tiva virá para completar o quadro.

PROFESSOR DO DEPARTAMEN­TO DE ECONOMIA DA PUC/RIO, É ECONOMISTA­CHEFE DA GENIAL INVESTIMEN­TOS

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