Negros têm mais dificuldade para se eleger, diz IBGE
Maioria da população do País, pretos e pardos são só 24,4% dos deputados federais e 28,9% dos estaduais, mostra pesquisa
Embora correspondam a mais da metade dos habitantes do País, os brasileiros negros permanecem sub-representados no Legislativo. Em 2018, pretos e pardos eram 55,9% da população, mas apenas 24,4% dos deputados federais e 28,9% dos estaduais eleitos. Dos vereadores que se elegeram em 2016, 42,1% eram pretos e pardos.
Os dados são do Estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Parlamentares ouvidos pelo Estado atribuem a sub-representação de negros à falta de incentivos.
O porcentual de candidaturas de pessoas pretas ou pardas, no entanto, chegou, no ano passado, a 41,8% para cargos de deputado federal, a 49,6% nas eleições para deputado estadual e a 48,7% para vereador.
“Assim, não é possível atribuir a sub-representação desse grupo populacional unicamente a uma ausência de candidaturas, pelo menos no que tange às eleições legislativas proporcionais de 2014 a 2018”, afirmou o IBGE, em nota.
A distribuição dos recursos para as candidaturas pode ser uma pista. O estudo mostrou ainda a discrepância entre o valor arrecadado pelas candidaturas de pessoas brancas e a de pessoas pretas ou pardas. Enquanto 9,7% das candidaturas de pessoas brancas a deputado federal tiveram arrecadação igual ou superior a R$ 1 milhão,
A deputada federal Talíria Petrone (PSOL-RJ) defendeu a instituição de cotas para negros no Congresso Nacional. entre as candidaturas de pessoas pretas ou pardas, apenas 2,7% tiveram esse mesmo montante. “As candidaturas de pretos ou pardos são menos representativas entre candidaturas com mais recursos”, disse a analista da Coordenação de População e Indicadores Sociais do IBGE, Luanda Botelho.
Considerando todas as candidaturas legislativas que dispuseram de receita igual ou superior a R$ 1 milhão, apenas 16,2% eram de pessoas pretas ou pardas. De acordo com o IBGE, estudos sobre eleições no Brasil já mostraram que a escassez de dinheiro é um dos fatores que diminuem as chances de sucesso eleitoral de uma candidatura.
“Outro elemento determinante para o sucesso seria o candidato já possuir cargo parlamentar, o que constitui, portanto, mais uma dificuldade para um grupo sub-representado reverter esse quadro”, disse o IBGE.
Incentivos. Para o deputado federal Orlando Silva, presidente do PC do B em São Paulo, além da dificuldade para obter recursos, pois, em geral, negros e pardos são candidatos mais pobres, há, ainda, a ausência de suporte partidário. “A maioria dos partidos não dá o apoio necessário para lideranças e subestimam a importância de ter entre seus quadros principais os negros”, afirmou. “Com isso, o perfil dos parlamentos brasileiros acaba sendo dissociado do mundo real.”
Questionado sobre como melhorar a representação, o parlamentar disse que esse é um dilema do movimento negro. “O nosso principal desafio é ter uma agenda concreta que permita a ampliação da participação dos negros. Carecemos de uma bandeira propositiva”, afirmou Silva, citando, por exemplo, que as cotas não são unanimidade dentro do próprio movimento negro. “Temos de fazer um debate político com os partidos para garantir investimento na formação de lideranças negras e garantir investimento das siglas na campanha de negros”, disse o deputado.
Na avaliação da deputada federal Talíria Petrone (PSOLRJ), os espaços dentro do poder têm sido historicamente negados para negros e negras no Brasil. “O racismo é estrutural e, por isso, organiza as outras relações sociais. A história explica a ínfima participação na política”, afirmou ela.
A parlamentar disse que, com a sub-representação de negros nos parlamentos, as especificidades e demandas da sociedade não são totalmente contempladas. “Temos a maior mortalidade materna, pobreza, desemprego, mortes (patrocinadas) pelo Estado. Precisamos dar visibilidade para essas dores e fortalecer a luta antirracista dentro e fora do Congresso. O racismo no Brasil é invisível, fica escondido no mito de uma democracia racial, da lógica da miscigenação”, afirmou.
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