O Estado de S. Paulo

Morador mostra vídeo com confusão e agressões na rua

Ele critica versão policial; outros relatam que vítimas teriam ficado encurralad­as em viela. PM diz que todos os vídeos serão analisados

- Felipe Resk Marco Antônio Carvalho

Espiando por uma fenda da janela, Cláudio Silva (nome fictício) diz ter visto todo o tumulto no baile funk. Frequentad­or de Paraisópol­is, ele relata que sacou o celular e começou a gravar a cena. Na rua, viam-se pessoas gritando e correndo desesperad­as. As que caíram ficaram feridas ou morreram pisoteadas. Também via os PMs durante a ação. Segundo Silva, a versão relatada pelos agentes é falsa. “Os policiais já chegaram atirando”, afirma.

Sob condição de anonimato, Silva diz ter sido responsáve­l por gravar um vídeo de 25 segundos que viralizou pouco tempo depois da ação da PM em Paraisópol­is. As imagens mostram um policial apontando uma arma longa e realizando disparos, enquanto um colega diz para as pessoas irem embora dali. A ação se dá na Rua Ernest Renan, onde acontece o Baile Dz7, o pancadão que era alvo da ação.

O Estado conversou com ele ontem à tarde e constatou que o local da entrevista era o mesmo de onde as imagens haviam sido feitas. No momento da gravação, a rua surge esvaziada e alguns poucos correm, tentando escapar das agressões dos policiais. No fim da gravação, uma mulher anda por uma calçada e é atingida por um golpe de cassetete no braço, mesmo não tendo aparentado qualquer reação agressiva ao que acontecia. Ao contrário, ela parecia tentar fugir da confusão formada.

De acordo com a versão oficial, duas pessoas em uma moto teriam atirado contra uma guarnição da PM e depois tentado se esconder no baile funk. Os tiros teriam assustado os frequentad­ores que, na correria, acabaram caindo e sendo pisoteados.

Silva, no entanto, diz que não foi isso que aconteceu – os próprios PMs teriam cercado os frequentad­ores do baile e dado início ao tumulto. “Ninguém viu essa moto”, afirma.

Outros moradores ouvidos também refutam a narrativa da PM – nas ruas de Paraisópol­is, a tragédia era o assunto mais comentado ontem. O comércio na Ernest Renan, entretanto, funcionou normalment­e.

Ainda de acordo com os relatos, as vítimas ficaram empilhadas em duas vielas, localizada­s uma perto da outra, e foram socorridas por viaturas. No boletim de ocorrência, os PMs alegaram demora do Samu.

Um desses becos começa com uma série de degraus, onde as pessoas teriam tropeçado. Em alguns pontos das vielas, a passagem tem menos de 1 metro de largura. Também há portões instalados na área – como se o quadriláte­ro formasse uma espécie de condomínio. “A gente fecha para que o pessoal do pancadão não incomode”, diz uma moradora.

Outro morador, que está em Paraisópol­is há 40 anos, diz ter testemunha­do o episódio. “Eu ouvi a correria e as pessoas começaram a forçar para entrar na minha casa”, conta. Na porta, há marca de chutes e respingos de sangue. “Quando eu abri, havia um jovem agonizando bem na frente. Nunca tinha visto nada parecido antes.”

No domingo, após a tragédia, o tenente-coronel Emerson Massera, porta-voz da PM, afirmou que todos os vídeos recebidos seriam analisados durante a investigaç­ão para saber se houve excesso por parte dos policiais. Segundo ele, ainda não seria possível dizer se essas imagens eram verdadeira­s.

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TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO Tragédia. Comércio na Rua Ernest Renan, onde jovens morreram, abriu normalment­e

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