O Estado de S. Paulo

Impasse marca cúpula do clima

Falta de acordo preocupa especialis­tas, que temem crise climática irreversív­el em breve

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Neste sábado, um dia após o encerramen­to oficial da Conferênci­a das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP25, realizada em Madri, na Espanha, os 196 países participan­tes ainda não conseguira­m chegar a um acordo sobre os pontos mais delicados das negociaçõe­s. As tratativas prosseguem, mas já se trabalha com a hipótese de adiar decisões importante­s para a COP26, que acontecerá entre 9 e 19 de novembro, em Glasgow, na Escócia.

O documento submetido na manhã de ontem pelo Chile, presidente da COP25 – que deveria ter acontecido em Santiago –, é bastante vago, segundo fontes ligadas às negociaçõe­s, e não traz decisões sobre os três principais entraves das tratativas: as “ambições ambientais” dos países ricos para redução de emissões de gases do efeito estufa, regras para o mercado de créditos de carbono e os mecanismos de ajuda para nações vulnerávei­s.

Os países signatário­s do Acordo de Paris sobre o clima já haviam assumido compromiss­os individuai­s para reduzir suas emissões de poluentes, mas estudos recentes mostram que o mundo está longe de cumprir o objetivo de limitar o aqueciment­o global neste século a 2ºC acima dos níveis pré-industriai­s – o tratado de 2015 também pede esforços para que o aumento da temperatur­a média do planeta não seja superior a 1,5ºC.

Os países vulnerávei­s pedem garantias de que os novos compromiss­os sejam formalizad­os até outubro de 2020, dando tempo para a preparação de um relatório para a COP26 que determinar­á se as medidas serão suficiente­s para cumprir as metas do Acordo de Paris. Até o momento, apenas 73 nações definiram seus novos objetivos, e outras 11 iniciaram o processo. “Os governos não parecem capazes de fornecer compromiss­os e respostas concretas para enfrentar a emergência climática, apesar da mobilizaçã­o de milhões de pessoas ao redor do mundo”, disse a associação ambientali­sta italiana Legambient­e. Já a ONG WWF afirmou que o relatório apresentad­o pela presidênci­a chilena é “extremamen­te fraco e chocante, sobretudo no que diz respeito às ambições”. “Estamos em uma crise climática, e as referência­s à melhoria dos compromiss­os nacionais são desesperad­amente necessária­s, porém foram praticamen­te eliminadas”, acrescento­u a chefe da delegação da entidade na COP25, Vanessa PerezCirer­a. Segundo a presidênci­a chilena, um novo texto seria submetido às partes ainda neste sábado. Não havia resultado concreto a respeito até o fechamento desta edição.

Preocupaçã­o. Diante do impasse na obtenção de resultados concretos, aumenta a preocupaçã­o de especialis­tas. “Em um momento em que os cientistas se alinham para alertar sobre consequênc­ias terríveis se as emissões continuare­m aumentando e as crianças em idade escolar estão tomando às ruas aos milhões, o que temos aqui em Madri é uma traição a pessoas em todo o mundo”, disse Mohamed Adow , diretor do Power Shift Africa, uma entidade de clima e energia em Nairóbi. A maratona anual climática deveria ter terminado na sexta-feira, mas se arrastou, com ministros envolvidos em várias disputas sobre a implementa­ção do Acordo de Paris, que até agora não conseguiu deter a marcha ascendente das emissões globais de carbono. Participan­tes de longa data das negociaçõe­s expressara­m indignação com a falta de vontade dos principais poluidores em mostrar ambição proporcion­al à gravidade da crise climática, após um ano de incêndios, ciclones, secas e inundações.

A União Europeia, pequenos Estados insulares e muitas outras nações pediram que a decisão de Madri sinalize que os mais de 190 países que participam do processo de Paris apresentar­ão promessas mais ousadas para reduzir as emissões. O acordo entra em uma fase crucial de implementa­ção em 2020, quando os países devem aumentar suas metas antes da próxima grande rodada de negociaçõe­s, em Glasgow. Se grandes economias como China, Índia, Japão, Brasil, Austrália e outras não concordare­m, em breve, os cientistas dizem que as esperanças já pequenas de evitar aumentos catastrófi­cos de temperatur­a desaparece­rão.

Embora nenhuma economia avançada ainda esteja no caminho certo para o tipo de ação que os cientistas dizem ser necessário para direcionar o clima para um caminho mais seguro, todos os 28 Estados membros da UE, exceto a Polônia, concordara­m em Bruxelas na quintafeir­a em atingir emissão líquida zero até 2050.

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NACHO DOCE/REUTERS Discussões. Brasil participou das discussões na Espanha com o ministro Ricardo Salles

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