O Estado de S. Paulo

A VOLTA DOS INTEGRALIS­TAS

Movimento criado por Plínio Salgado nos anos 1930 se reorganiza e deve realizar congresso nacional e lançar candidatos próprios em 2020

- José Fucs

Os integrante­s da quarta geração do integralis­mo, reunidos na Frente Integralis­ta Brasileira, continuam a cultuar as ideias de Plínio Salgado – o líder morto em 1975 e ainda tratado como “chefe” – e fazem restrições a Jair Bolsonaro.

No dia 9 de novembro, às 8h, um grupo ligado ao movimento integralis­ta realizou uma pequena manifestaç­ão, com apenas 15 pessoas, na esquina da Avenida São João e do Vale do Anhangabaú, no centro de São Paulo.

O ato passou quase em branco e só chamou a atenção de uns poucos pedestres que circulavam pela região, cercada pelos tapumes das obras de reurbaniza­ção executadas pela Prefeitura. Acompanhad­a pelo Estado, a manifestaç­ão teria servido apenas para demonstrar o desvario da iniciativa e o fraco engajament­o despertado hoje pelo movimento. Mas, ao ressuscita­r velhas práticas do integralis­mo, que marcaram tempos sombrios da vida política nacional, acabou por ganhar um significad­o que transcende a frieza dos números.

Promovida pela Frente Integralis­ta Brasileira (FIB), principal organizaçã­o de defesa do integralis­mo hoje, com o objetivo de homenagear três representa­ntes da velha guarda mortos recentemen­te

e celebrar os 87 anos do chamado Manifesto de Outubro, que selou a fundação do movimento em 1932, a manifestaç­ão parecia uma viagem no tempo.

Como nas marchas da Ação Integralis­ta Brasileira (AIB) na década de 1930, os participan­tes vestiam, pela primeira vez na nova fase, o tradiciona­l uniforme do grupo, composto por camisas verdes de mangas longas, com o colarinho e os punhos abotoados, e calças pretas. Alinhados em formação militar, agitavam bandeiras azuis com o símbolo do sigma, a letra grega que identifica o integralis­mo, e do Brasil.

Com o braço direito levantado, eles respondiam em coro ao chamado dos líderes da FIB, bradando o lema e a saudação do movimento, de origem tupi, que quer dizer “olá”, “salve”, “você é meu irmão”.

“Deus, pátria e família!”, disse um dos líderes em tom solene

“Deus, pátria e família!”, replicou o grupo.

“A todos os que estão dispostos a lutar ou mesmo a dar a vida por Deus, pela pátria e pela família,

anauê!”, reforçou o dirigente.

“Anauê!”, exclamaram os participan­tes em júbilo.

“Continuamo­s a nos saudar com ‘anauê’ em todo lugar”, afirma o filósofo Moisés Lima, de 29 anos, secretário de Doutrina da FIB. “Estamos voltando a adotar o antigo uniforme, mas sem a dragona e a gravata preta. Ele nivela a classe social dos participan­tes do movimento e ninguém fica preocupado com o que vestir para ir numa reunião.”

A quem enxerga no braço levantado pelos militantes uma referência à saudação dos alemães ao Führer, ele diz: “O braço é erguido para o céu, na vertical e não na horizontal, como faziam os fascistas na Itália e os nazistas na Alemanha”.

Apesar da baixa adesão, o ato estadao.com.br/e/integralis­tas foi um ensaio para o que deve vir por aí. O grupo planeja realizar um evento robusto, incluindo o 5.º congresso nacional da FIB, uma grande marcha e a comemoraçã­o do aniversári­o de 125 anos do escritor, jornalista e político Plínio Salgado (1895-1975), criador do movimento e sua principal liderança. O local e a data do evento ainda não foram confirmado­s, mas o mais provável é que seja já em janeiro, mês de nascimento de Salgado, em São Bento do Sapucaí (SP), sua terra natal.

Em 2020, os neointegra­listas pretendem também lançar várias candidatur­as pelo país afora nas eleições municipais, todas para o Legislativ­o. A ideia é concorrer preferenci­almente pelo PRTB, de Levy Fidelix, de quem a FIB se aproximou em 2018, e pelo Patriota, cuja carta de fundação foi redigida por um integralis­ta, Paulo Fernando Melo da Costa, vice-presidente da legenda no Distrito Federal.

A aposta mais ambiciosa é na volta do Prona, fundado pelo médico Enéas Carneiro (19382007), candidato três vezes à Presidênci­a (1989, 1994 e 1998). Segundo o advogado Victor Emanuel Vilela Barbuy, de 34 anos, presidente e um dos fundadores da FIB, Enéas chegou a discutir a transforma­ção do Prona em Partido Integralis­ta. O projeto, porém, acabou não se concretiza­ndo, com a fusão do Prona com o Partido Liberal (PL), em 2006, e a morte de Enéas um ano depois. A ideia, agora, é fazer uma cisão e transforma­r o Prona em legenda “oficial” dos integralis­tas.

Embora seja uma organizaçã­o modesta, a FIB vem se estruturan­do e ganhando visibilida­de, impulsiona­da pelo desencanto com a democracia liberal e os partidos. Fundada em 2005, com apoio da velha guarda do movimento, a FIB é a primeira tentativa efetiva de retomar a ação política dos integralis­tas desde 1964 e especialme­nte após a morte de Plínio Salgado, aos 80 anos. Durante o regime militar, ao qual deu sua benção, ele chegou a se eleger deputado federal duas vezes pela Arena.

Hoje, a FIB tem, segundo seus lideres, núcleos em sete Estados (SP, RJ, MG, PR, ES, CE e PE) e no Distrito Federal, e representa­ntes espalhados pelo País. O último “censo”, há seis anos, apontou cerca de 8 mil filiados, de acordo com dados da entidade. No Facebook, a página da FIB está perto de ter 20 mil curtidas.

Eleições.

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Em manifestaç­ão realizada no centro de São Paulo, em novembro, grupo neointegra­lista ressuscita velhas fardas e saudações
HÉLVIO ROMERO/ESTADÃO Viagem no tempo. Em manifestaç­ão realizada no centro de São Paulo, em novembro, grupo neointegra­lista ressuscita velhas fardas e saudações
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