O Estado de S. Paulo

Renovação auspiciosa

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Atuação de deputados estreantes é positiva, com sinais claros de uma nova cultura de trabalho no Congresso.

Nas eleições do ano passado, o eleitor promoveu uma inédita renovação do Congresso. Naturalmen­te, a expectativ­a era de que fossem renovados não apenas os nomes, mas os costumes e as práticas do Legislativ­o. Agora, no término do primeiro ano dessa legislatur­a, o Estado fez um levantamen­to da atuação de 22 deputados estreantes que participar­am de movimentos políticos ou grupos de renovação. O resultado foi especialme­nte positivo, com sinais claros de uma nova cultura de trabalho no Congresso.

Esses deputados apresentar­am mais projetos, trabalhara­m mais em grupo, gastaram menos verba e tiveram menos faltas do que a média dos parlamenta­res. Trata-se de um quadro positivo, a merecer o devido reconhecim­ento. Apesar de todas as limitações do sistema eleitoral e partidário, o eleitor foi capaz de trazer para o Parlamento pessoas dispostas ao trabalho legislativ­o.

Para chegar ao grupo de deputados avaliado pela reportagem, foram usados três critérios. Todos são parlamenta­res no primeiro mandato na Câmara, nunca tiveram outro cargo eletivo e pertencem ou pertencera­m a pelo menos um dos grupos de renovação política: Raps, RenovaBR, Livres, Acredito, MBL, Muitas, Ocupa Política e Vote Nelas.

O levantamen­to identifico­u um aspecto da atuação desses parlamenta­res especialme­nte relevante. Em média, 42% dos projetos dos deputados novatos avaliados pelo Estado foram apresentad­os em conjunto com outros parlamenta­res. Observa-se, assim, um esforço de diálogo, de negociação e de articulaçã­o, isto é, esses deputados estão tentando fazer política real. No restante da Câmara, a taxa de projetos apresentad­os por mais de um deputado é de apenas 16%.

Ainda que sejam novatos, os deputados ouvidos pelo Estado são consciente­s da importânci­a da coautoria para aumentar as chances de aprovação das propostas. “Antes de protocolar, vejo quais deputados teriam alinhament­o com o tema e os convido para serem coautores. Já partimos de um volume maior de deputados apoiando o projeto”, afirmou o deputado Tiago Mitraud (Novo-MG).

O trabalho em conjunto é a forma encontrada pelos deputados estreantes para enfrentare­m as dificuldad­es de quem não tinha previament­e relações com outros políticos. “A gente entrou sem padrinhos, sem as pessoas que te puxam, sem o aprendizad­o que vem com os contatos”, disse a deputada Tabata Amaral (PDT-SP).

Os 22 deputados que saíram de movimentos políticos e de renovação apresentar­am uma média de 15 projetos nesse primeiro ano de legislatur­a, 25% a mais do que a média da Câmara (12 propostas). Em relação às faltas sem justificat­ivas, os 22 deputados avaliados tiveram em média 2,9 faltas. A média da Casa, levando em conta todos os deputados, foi de 3,8 faltas.

Segundo o levantamen­to, os 22 deputados também gastaram menos da cota parlamenta­r. O valor líquido médio gasto por deputado nesse primeiro ano foi de R$ 304.703,31. Entre os parlamenta­res novatos pesquisado­s, a média foi de R$ 215.340,89. Em boa medida, essa redução de gastos dos deputados estreantes deve-se à bancada do Partido Novo, que se posiciona contra o uso do dinheiro público nos mandatos.

Aqui se vê mais uma novidade alvissarei­ra, que vai muito além da questão econômica. Trata-se de uma legenda que tem um ideário claro, propondo um modo específico de atuar. Num cenário político em que os partidos são em geral meras siglas amorfas, essa identidade clara é também uma lufada de otimismo. Além de a legenda ter um ideário, outro ponto digno de nota é o fato de a conduta dos deputados dessa legenda expressar de fato tal ideário. Há coerência entre ação e proposta partidária.

Ainda que o grupo avaliado seja pequeno, 22 parlamenta­res num universo de 513, o panorama é muito positivo. É possível renovar as práticas do Congresso. Ao mesmo tempo, tal renovação revela que é do eleitor – e só do eleitor – a responsabi­lidade de continuar elegendo candidatos sem as condições mínimas de competênci­a e honestidad­e. Há gente honesta e competente se candidatan­do.

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