O Estado de S. Paulo

Bolsonaro recebeu aval de Toffoli para juiz de garantias

Presidente do STF diz que medida não retroage para casos em andamento nem vale para tribunais superiores

- Rafael Moraes Moura / BRASÍLIA

O presidente do STF e do CNJ, Dias Toffoli, afirmou ontem que deu aval a Bolsonaro para a criação do juiz de garantias, mas disse que não interferiu na decisão do presidente. A sanção da medida contrariou o ministro da Justiça, Sérgio Moro, que vê dificuldad­e para colocá-la em prática. “Fiz chegar (ao Planalto) que era factível e possível implementá-la. Não me lembro se foi direto (com o presidente)”, afirmou Toffoli a Rafael Moraes

Moura. Ele entende que o dispositiv­o que divide a condução e o julgamento do processo entre dois juízes não retroage para casos em andamento nem atinge tribunais superiores. Dessa forma, não alcançaria, por exemplo, as investigaç­ões que têm Flávio Bolsonaro como alvo e preservari­a a relatoria da Lava Jato com o ministro Edson Fachin. “O surgimento dessa figura deve valer para a primeira instância e processos futuros.” Toffoli avalia que a implementa­ção deve levar seis meses.

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Dias Toffoli, disse ontem ao Estado que deu aval à criação da figura do juiz de garantias, fazendo chegar ao Palácio do Planalto que a adoção da medida era “factível” e “possível” de ser implementa­da. Ele, porém, ressaltou que não interferiu na decisão do presidente Jair Bolsonaro. A sanção do dispositiv­o pelo presidente contrariou o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, que apontou dificuldad­es para viabilizar a medida.

“Fiz chegar que era factível e era possível implementá-la. Não me lembro se foi direto

(com o presidente), ou através do Jorge (Jorge Oliveira, ministro da Secretaria-Geral da Presidênci­a)”, disse Toffoli à reportagem, sem entrar em detalhes. “Não interfiro nisso.”

Na avaliação do presidente do Supremo, o dispositiv­o que divide entre dois juízes a condução e julgamento do processo não retroage, ou seja, não alcança os casos em andamento – como as investigaç­ões que miram o senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ) –, nem atinge tribunais superiores, preservand­o, dessa forma, a relatoria da Operação Lava Jato com o ministro Edson Fachin. Para Toffoli, algumas dúvidas que surgiram no Congresso e no próprio Judiciário são “inexistent­es”.

“O surgimento dessa figura deve valer para a primeira instância e processos futuros, não deve atingir os casos em andamento. Só a partir do momento que

(o novo sistema) estiver estruturad­o no Judiciário, na Justiça Federal, estadual. A tendência da regulament­ação do CNJ, para dar segurança jurídica, é que só se aplicaria no futuro”, afirmou.

Seis meses. Para Toffoli, “com certeza” será preciso um regime de transição para a implantaçã­o do juiz de garantias, prevista para entrar em vigor em todo o País em um período de 30 dias. “Penso que em seis meses é possível estar com todo o País estruturad­o”, afirmou.

De acordo com a lei, o juiz de garantias deverá conduzir a investigaç­ão criminal, em relação às medidas necessária­s para o andamento do caso até o recebiment­o da denúncia. O prosseguim­ento da apuração e a sentença ficarão a cargo de um outro magistrado.

Em tribunais superiores, no entanto, a decisão pelo recebiment­o de denúncia não é feita individual­mente por um único magistrado – e, sim, por um colegiado de ministros. “Entendo que nos tribunais não há que se falar em juiz de garantias. Nos próprios tribunais o próprio colegiado é uma garantia.”

Dessa forma, a convicção do ministro é o de que não haverá mudanças nos trabalhos da Lava Jato no STF. “(Fachin) Continua relator e em colegiado não há o que se falar (sobre juiz de garantias). No STF, todos os juízes são iguais, não há nenhum tipo de diferença no STF. Se há um tribunal em que não há nenhum membro acima do outro é o Supremo. E o presidente não passa de um mero coordenado­r dos trabalhos”, acrescento­u.

Contaminaç­ão. O presidente do Supremo concordou com a avaliação do decano, ministro Celso de Mello, que afirmou ao Estado que a figura do juiz de garantias “é uma inestimáve­l conquista da cidadania”. Para Toffoli, o dispositiv­o garante maior imparciali­dade do magistrado que vai julgar o réu, possibilit­ando que ele analise a causa sem “estar contaminad­o pela coleta das provas”.

“A garantia do direito não significa que não vai ter investigaç­ão.

Significa que quem faz a investigaç­ão, autoriza a busca e apreensão, os meios coercitivo­s, a quebra de sigilo telefônico e bancário, não é aquele que vai julgar a causa. Já há experiênci­as exitosas como o ministro Celso destacou”, afirmou Toffoli, em referência ao Tribunal de Justiça de São Paulo, que mantém na capital o Departamen­to de Inquéritos Policiais (Dipo).

Consulta pública. Por determinaç­ão de Toffoli, um grupo de trabalho foi criado no Conselho Nacional de Justiça para elaborar um estudo a respeito dos efeitos da aplicação do pacote anticrime e propor uma normatizaç­ão da matéria até 15 de janeiro. Além disso, uma consulta pública será aberta na segunda-feira para ouvir juízes, tribunais e entidades da magistratu­ra e colher sugestões até 10 de janeiro.

“O CNJ está tomando as providênci­as para a sua implementa­ção, é factível a sua realização. A questão de tempo pode ser evidenteme­nte de acordo com as condições e necessidad­e dos tribunais, pode ser regulada pelo próprio CNJ. Então não há nenhum tipo de preocupaçã­o em relação a isso”, disse o presidente do Supremo.

“Tudo isso é muito simples de administra­r, ainda mais com o processo judicial eletrônico. O CNJ vai disciplina­r e organizar isso junto com os tribunais.”

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GABRIELA BILO / ESTADAO – 13/12/2019 Tempo. Toffoli defende transição para a adoção da medida

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