O Estado de S. Paulo

Voto latino terá mais peso na eleição nos EUA

Projeções indicam que essa comunidade será a minoria com maior representa­ção entre os eleitores aptos a votar em 2020, superando os negros, e partidos trabalham para cooptá-la; fator Trump também deve mobilizar esse eleitorado a ir em peso às urnas

- Beatriz Bulla CORRESPOND­ENTE / WASHINGTON

Uma Elizabeth Warren em tamanho real, de papelão, mãos na cintura e sorriso no rosto era a maior atração de um restaurant­e e karaokê em uma noite fria de segunda-feira em Washington. O cardápio de tacos mexicanos é tradiciona­l no bairro de Columbia Heights, que concentra a maior comunidade latina da capital americana e onde o espanhol é tão ouvido nas ruas quanto o inglês. O que é pouco comum no restaurant­e é ver as mesas afastadas para um evento de campanha eleitoral.

“Eu vejo essa eleição como uma questão de vida ou morte”, disse Jonathan Jayes-Green, de 27 anos. Foi ele quem reuniu cerca de 40 latinos dispostos a fazer campanha pela senadora Warren. A orientação é que cada um sirva como um “embaixador” de Warren.

As projeções indicam que os latinos serão a minoria com maior representa­ção entre os eleitores aptos a votar em 2020 (13%), superando os negros. Não só o número de latinos tem crescido pela mudança na demografia nos EUA, como a participaç­ão de eleitores latinos nas urnas tem aumentado. Entre os que podem votar, 40% foram às urnas na última eleição de meio de mandato, em 2018. A eleição legislativ­a anterior, em 2014, teve presença de 27% dos latinos aptos a votar. O cresciment­o superou o aumento da participaç­ão de brancos e negros.

“Os eleitores latinos e asiáticos costumam ser menos contatados pelas campanhas. Por quê? Uma resposta preguiçosa é que esses eleitores frequentem­ente falam outras línguas que não o inglês. As campanhas precisam recrutálos”, afirma Ricardo Ramírez, professor de ciência política e especialis­ta em raça e etnia na Universida­de

de Notre Dame, em Indiana. “A comunidade latina responde com uma alta taxa de participaç­ão, quando é contatada”, afirma.

Segundo Ramírez, uma das razões que explica a tendência das campanhas de não buscar essa parcela da comunidade é o fato de não haver partidaris­mo claro entre os latinos. “Então as campanhas têm menos certeza sobre o que estão mobilizand­o, preferem seguir os padrões partidário­s”, afirma.

Para 2020, o cenário tem se alterado. Luís Aguilar é mexicano e mora nos EUA há 20 anos. Como diretor estadual da associação CASA em Virgínia, que trabalha com imigrantes latinos, ele lida com a comunidade local no dia a dia. Segundo ele, os esforços das campanhas eleitorais para alcançar essa parte da sociedade americana estão “completame­nte diferentes” depois da eleição de Trump.

“Bernie Sanders e Elizabeth Warren estão especifica­mente tendo esse público como alvo na preparação para as primárias. Antes de 2016, os candidatos só buscavam os latinos bem depois das primárias”, afirmou. “O voto se tornou uma ferramenta forte para a comunidade latina. Os ataques feitos pelo governo Trump estimulam a comunidade. Já havia um cresciment­o da presença nos EUA pela demografia, mas agora há a vontade de se tornar um bloco.”

Jonathan Green faz parte dos jovens que receberam o DACA, o programa criado na época do governo Barack Obama para regulariza­r temporaria­mente imigrantes em situação ilegal que chegaram

Voto contra

“Claro que tudo dependerá de quem será o candidato democrata e o quanto ele abraça as questões que afetam a comunidade latina, mas provavelme­nte o voto não é tanto sobre quem estão apoiando, mas sobre contra quem estão votando”

William Frey

PESQUISADO­R DO

BROOKINGS INSTITUTE

aos EUA ainda menores de idade. Mas, segundo o panamenho, a política de imigração de Trump pode mudar seu destino nos EUA. “Estou vendo o que esse governo fez nas nossas comunidade­s. Nossos sistemas e nossas leis colocaram pessoas como eu e minha família em risco”, afirmou.

A campanha da senadora democrata não é a única de olho nos latinos. Bernie Sanders, também democrata, e a campanha de reeleição de Donald Trump têm investido nessa parcela da comunidade americana. No caso de Sanders, a campanha é a que mais arrecadou verba da comunidade latina entre os democratas. Já os “Latinos for Trump” têm trabalhado em campanhas nos Estados considerad­os pêndulo, ou seja, que podem oscilar entre maioria democrata ou republican­a na eleição de 2020, como Nevada e Flórida.

A retórica anti-imigração atual faz com que a comunidade latina se energize nas campanhas contrárias ao presidente. Um levantamen­to da organizaçã­o Equis Labs mostra que mais de dois terços dos latinos em 10 de 11 Estados pesquisado­s afirmaram que pretendem votar em um democrata. Uma pesquisa conduzida pelo instituto Pew Research aponta que mais de 50% dos consultado­s concordam que se tornou mais difícil ser um latino nos EUA nos anos recentes.

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BEATRIZ BULLA/ESTADÃO Campan h a . Em restaurant­e do bairro de Columbia Heights, uma Elizabeth Warren de papelão é a maior atração

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