O Estado de S. Paulo

‘O presidente não vai botar a mão na cumbuca eleitoral’

Ministro da Secretaria de Governo, Ramos afirma que Bolsonaro não quer se indispor com possíveis novos aliados no Congresso

- Vera Rosa Julia Lindner / BRASÍLIA

Informado de que o Aliança pelo Brasil praticamen­te não tem chance de sair do papel a tempo de disputar as eleições de 2020, o presidente Jair Bolsonaro disse a correligio­nários que não vai subir em palanque de candidatos filiados a legendas com as quais pretende formar uma base de sustentaçã­o no Congresso. Ao menos no discurso, ele afirmou que não usará a “caneta Bic” para interferir nas disputas municipais.

“O presidente não vai botar a mão nessa cumbuca”, disse ao Estado o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos. “No Rio, todo mundo fala que o candidato dele é o Crivella. Será?”, perguntou, em referência ao prefeito Marcelo Crivella (PRB), hoje muito impopular, segundo pesquisas.

Articulado­r do Palácio do Planalto, Ramos admitiu que Bolsonaro sabe que tanto pode eleger alguém como perder capital político, caso o seu apadrinhad­o não decole. Nesse caso, a derrota seria atribuída ao governo.

“Então, isso é uma faca de dois legumes”, brincou o ministro. Recentemen­te, ao comentar a saída do PSL, Bolsonaro disse que sua participaç­ão nas campanhas de 2020 será definida pelo entendimen­to do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No seu diagnóstic­o, o Aliança pelo Brasil tem apenas “1% de chance” de conseguir ser criado até o fim de março do ano que vem, prazo necessário para conseguir concorrer às eleições. “Por enquanto eu estou livre, estou solteiro. Não vou casar”, afirmou o presidente.

A decisão de Bolsonaro foi tomada após líderes de partidos do Centrão avisarem ao Planalto que estão preocupado­s com o comportame­nto do governo na campanha pelas prefeitura­s. No mês passado, em entrevista ao Estado, Ramos havia dito que, mesmo se o Aliança não disputasse, Bolsonaro poderia apoiar candidatos nas corridas municipais. O plano era que esses nomes, se eleitos, migrassem depois para o Aliança. Diante da revolta de possíveis novos parceiros no Congresso, porém, Bolsonaro arquivou a ideia, por enquanto.

Movimento. Ramos assumiu o ministério responsáve­l pela interlocuç­ão do governo com o Congresso em julho, no lugar de Carlos Alberto dos Santos Cruz, o general que entrou em confronto com o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filho “02” do presidente.

“Peguei um trem em movimento, a 200 quilômetro­s por hora”, comparou. “Mas tenho esperança de que 2020 será um ano mais sereno. Antes, muitos pensavam “ih, aí vem mais um general’. Viram, no entanto, que não é isso. Sou uma pessoa extroverti­da e me sinto bem no Congresso.”

Amigo de longa data de Bolsonaro, Ramos ainda não virou alvo de Carlos, embora a Secretaria de Comunicaçã­o Social (Secom) – dirigida por Fábio Wajngarten e subordinad­a ao ministério comandado pelo general – tenha recebido ácidas críticas do vereador. Em mensagem postada no Twitter, no último dia 19, Carlos disse que a comunicaçã­o do governo “sempre foi uma bela de uma porcaria”.

Ninguém respondeu. Nem mesmo o porta-voz da Presidênci­a, Otávio do Rêgo Barros, escanteado pelo próprio Bolsonaro, que todo dia tenta passar o seu recado ao vivo em “quebraquei­xos” – como são conhecidas as rápidas entrevista­s, em pé – na entrada do Alvorada. Ramos, por sua vez, virou uma espécie de marqueteir­o do governo. Ainda ontem, por exemplo, ele circulou de moto pela Esplanada. Saiu de casa, na Asa Sul, e foi para o Planalto em dez minutos, pilotando uma Harley-Davidson, comprada em 2013. Depois, partiu para o Alvorada.

“Que negócio é esse?”, perguntou Bolsonaro, ao saber da “aventura” do ministro. “Da próxima vez, nós vamos juntos para o trabalho de moto”, emendou o presidente. No Natal, Bolsonaro também deu umas voltas com sua Honda 750 X, mas apenas ao redor dos amplos jardins da residência oficial.

A estratégia de Bolsonaro e Ramos consiste em apostar cada vez mais no bordão do apresentad­or Chacrinha, segundo o qual “quem não se comunica, se trumbica”. “Eu não vou ficar aqui nesse castelo do Planalto de braços cruzados. Faço questão de pôr a mão na massa”, disse o ministro, em alusão às suas negociaçõe­s no Congresso.

“Isso (apoio de Bolsonaro a candidatos em 2020) é uma faca de dois legumes.”

“Eu não vou ficar aqui nesse castelo do Planalto de braços cruzados. Faço questão de pôr a mão na massa.”

Luiz Eduardo Ramos

MINISTRO DA SECRETARIA DE GOVERNO

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO HarleyDavi­dson. Ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, foi trabalhar de moto e circulou pela Esplanada

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