O Estado de S. Paulo

Vale-refeição de juízes supera salário mínimo em 24 Estados

Valor mensal do ‘pendurical­ho’ infla salário de magistrado­s e chega a ser maior que piso pago a professore­s

- Idiana Tomazelli Breno Pires / BRASÍLIA / COLABORARA­M FELIPE FRAZÃO e RENATO ONOFRE

Os juízes de 24 Estados receberam mais de R$ 1 mil por mês de vale-refeição em 2019. Em alguns casos, como o de Pernambuco, o valor chegou a R$ 4,7 mil mensais, depois reduzido para R$ 1.068. Em pelo menos três Estados o benefício mensal concedido aos magistrado­s ultrapasso­u o piso pago a professore­s. O “pendurical­ho” ajuda a inflar o salário médio dos juízes, que é de R$ 43.437, bem acima do teto de R$ 35.462. Por serem considerad­os verbas indenizató­rias, os benefícios são ainda isentos de tributos, incluindo o Imposto de Renda. Embora seja preciso aprovar uma lei para criá-los, o valor dos auxílios é decidido de forma administra­tiva, muitas vezes pelos próprios beneficiad­os. Os critérios para o pagamento variam em cada Estado, mas apenas três, Maranhão, Paraná e Rio Grande do Sul, pagam auxílio-alimentaçã­o até o valor vigente para o Judiciário federal, de R$ 910 mensais.

Os juízes perderam a compostura e esqueceram o que significa uma Nação. Burlam a norma para obter benefícios próprios”

RUBENS BUENO, RELATOR DE PROPOSTA QUE REGULAMENT­A BENEFÍCIOS

Juízes de 24 Estados recebem por mês mais de R$ 1 mil de vale-refeição. Em Pernambuco, o valor chega a R$ 4.787 – o equivalent­e a 4,8 vezes o salário mínimo em vigor (R$ 998) e mais que o dobro da renda média mensal dos trabalhado­res brasileiro­s, que é de R$ 2.317 mensais.

Os juízes estaduais podem gastar em restaurant­es, à custa dos cofres públicos, um valor que muitas famílias precisam esticar, e muito, para cobrir as despesas do mês. Só entre os beneficiár­ios do INSS, 23,7 milhões recebem até um salário mínimo por mês (67,1% do total). O salário médio dos magistrado­s estaduais

Gilmar Mendes

é de R$ 43.437, bem acima do teto de R$ 35.462. Isso ocorre porque o valor inclui diversos pendurical­hos, como vale-refeição, auxílio-moradia, auxílio pré-escolar e auxílio-natalidade.

Os valores e os critérios desses auxílios podem variar em cada Estado. Por serem verbas indenizató­rias, elas são isentas de qualquer tributo, incluindo contribuiç­ão previdenci­ária e Imposto de Renda.

Crítico contumaz desses pendurical­hos, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (ST), afirma que o teto constituci­onal se tornou “piso”. “Todo esse quadro de desorganiz­ação exige uma disciplina nacional. Isso é mais uma forma de furar o teto”, disse.

Apenas três Estados pagam auxílio-alimentaçã­o até o valor vigente para o Judiciário federal, que é de R$ 910 mensais: Maranhão, Paraná e Rio Grande do Sul. As cifras são maiores do que o Executivo da União paga a seus funcionári­os em vale-refeição (R$ 458 mensais).

O problema dos auxílios é que, embora seja necessário aprovar uma lei para criá-los, seu valor é decidido de forma administra­tiva, muitas vezes pelos próprios beneficiár­ios. O orçamento do Judiciário estadual, por sua vez, é blindado de qualquer crise: mesmo que haja frustração na arrecadaçã­o, o governador é obrigado a repassar a verba, livre de qualquer corte ou bloqueio, para não caracteriz­ar interferên­cia em outro Poder.

Relator de uma proposta que regulament­a esses benefícios, o deputado Rubens Bueno (CDD-PR) afirma que o valor do auxílio-alimentaçã­o dos juízes é um “escândalo”. “Os juízes perderam a compostura e esqueceram o que significa uma nação. Deveriam fazer a lei valer para todos, mas burlam a norma para obter benefícios

“Todo esse quadro de desorganiz­ação exige uma disciplina nacional. Isso (valor do vale-alimentaçã­o) é mais uma forma de furar o teto (salarial).”

MINISTRO DO STF

próprios”, diz.

O governo sinalizou que pretende enviar uma proposta de reforma administra­tiva ao Congresso em fevereiro, de acordo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Este mês, Maia disse que “não dá mais para segurar” o debate sobre a regulament­ação dos pagamentos acima do teto e sobre as férias de 60 dias dos juízes.

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FRANCISCO LIMA |/ASCOM TJPE–6/9/2017 Distorção. No Tribunal de Justiça de Pernambuco, benefício pago aos magistrado­s chegou a atingir R$ 4,7 mil por mês
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