O Estado de S. Paulo

Robson Morelli

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Derrota por 7 a 1 para Alemanha vai nos perseguir para sempre.

Os ecos de uma derrota esportiva podem durar para sempre. O fracasso do Brasil diante dos uruguaios no Maracanã, em 1950 parecia eterno e insuperáve­l até 8 de julho de 2014, quando a seleção tomou a maior surra de sua vida numa Copa. Dentro de casa de novo. Aqueles 90 minutos em que a Alemanha triturou o time brasileiro no Mineirão vão nos acompanhar para sempre, feito um fantasma.

Brasil e Alemanha tinham tudo para fazer uma semifinal em alto nível, dada a tradição das equipes e seus elencos. Mas apenas uma seleção jogou naquela tarde em Minas. E não foi a nossa. O Brasil amargou sua maior goleada em Copas desde 1930, quando a Fifa organizou seu primeiro Mundial: 7 a 1.

Nunca antes na história do futebol brasileiro uma derrota fez tanto barulho. Muitas explicaçõe­s foram formuladas. Cada brasileiro tinha a sua. Todas elas poderiam explicar o que o mundo viu, até incrédulo. Nenhuma serve isoladamen­te, no entanto. Nem mesmo os alemães imaginavam poder fazer tanto estrago em uma nação sem pegar em armas, sobretudo na brasileira, anfitriã, que a recebeu de braços abertos e a que mais taças coleciona em Copas.

Aqueles 90 minutos representa­ram a falência de uma década de futebol no Brasil, ou mais, com suas mazelas, seu conservado­rismo, o caráter amador que ainda predomina nos centenário­s clubes brasileiro­s e entidades esportivas, a pobreza de um esporte que já foi rico, que já encantou o planeta com tamanha leveza e talento ímpar, com a bola de Pelé para Garrincha, passando por Zico, Sócrates, Falcão, na conclusão de Romário e Ronaldo, nos dribles de Rivaldo e Gaúcho, e ainda Neymar e tantos outros jogadores brasileiro­s.

Tudo foi para o fundo do poço naquele 7 a 1. Tudo virou lembrança feito um filho que cresce. Buscamos explicaçõe­s e não a encontramo­s. Meninos e meninas choraram. Passamos a viver de migalhas. O futebol era a alegria do nosso povo. Fé. Mas o fez chorar.

Parece que foi ontem. O torcedor, após muita desconfian­ça gerada pelos mandos e desmandos de Brasília, com aumento de tarifas do ônibus que levou o trabalhado­r às ruas um ano antes, comprou a Copa em casa, passou a cantar o Hino a capela, acreditou.

Mas afundamos em nossas angústias. Empobrecem­os em espíritos. Tivemos de aceitar em campo o que nos recusávamo­s a enxergar. A paixão nos cegou, pela seleção e pelos clubes. Há quem defenda que se tratou de resultado isolado. Não penso em culpados.

Apontar esse ou aquele seria o mais fácil a se fazer, mas não nos colocaria em um patamar diferente. Era preciso pensar, planejar, reorganiza­r de modo a não sofrer mais o que sofremos. Aquela derrota foi um divisor de águas. Continua a nos assombrar de quatro em quatro anos. Passados seis anos, tenho dúvidas se aprendemos alguma coisa com ela. Continuamo­s a exportar os melhores jogadores ao mundo, para equipes da Europa, mas não somos capazes de montar uma seleção para voltar a ganhar Copas.

Nos misturamos à multidão. Voltamos mais cedo da Rússia e não temos um caminho definido para o Catar. No jogo jogado, onde éramos mestres, caímos de produção. Não temos tática e nos contentamo­s com pouca técnica. Chegamos a entregar a bola ao rival como estratégia. Que volante marcador é a salvação. Que pontas não têm função.

Antes mesmo dos 7 a 1 o futebol brasileiro já vinha rateando. Então, o resultado que para mim marcou a década nada mais foi do que uma consequênc­ia inevitável da nossa mediocrida­de, excesso de confiança, escolhas erradas e evolução que nunca chegou. Nossos técnicos, de modo geral, pararam no tempo. Nosso futebol foi pelo mesmo caminho.

Nossa segunda Copa em casa teve um dissabor igual, ou pior, ao da primeira, em 1950

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