O Estado de S. Paulo

Robôs e sucatas dão um novo sentido à escola

Débora Garofalo, especialis­ta da Secretaria de Educação de São Paulo e finalista do Global Teacher Prize

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Em 2015, Débora Garofalo criou um projeto de robótica para trabalhar com seus alunos do 6º ao 9º anos da Escola Almirante Ary Parreiras, na Vila Babilônia, um bairro carente próximo ao aeroporto de Congonhas, na zona sul da cidade de São Paulo.

“Meu objetivo era utilizar a questão do meio ambiente para ajudar a transforma­r a realidade dessa comunidade, que é carente e sofre com altas taxas de violência”, diz a professora. Usando objetos de papelão e plástico retirados do lixo, ela passou a ensinar conceitos básicos de programaçã­o (Matemática), a importânci­a da preservaçã­o ambiental (Ciências), o passado (História) e o presente (Geografia) do bairro. E deu impulso a uma reviravolt­a no dia a dia daqueles meninos e meninas. “Muitos não viam sentido nos conteúdos trabalhado­s em sala de aula e, de repente, passaram a entender a importânci­a da escola para a vida de todos nós.”

O projeto robótica com Sucata, Promovendo a Sustentabi­lidade ganhou corpo, foi sendo aperfeiçoa­do e passou a ser premiado nacional e internacio­nalmente. Ficou, por exemplo, entre os finalistas do Global Teacher Prize, considerad­o o Nobel dos professore­s.

Tanto reconhecim­ento fez com que Débora assumisse, em junho de 2019, o cargo de assessora especial de tecnologia­s da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Seu principal desafio: implementa­r a disciplina de tecnologia nas escolas da rede, que tem mais de 2 milhões de estudantes. Que papel a tecnologia pode desempenha­r nas escolas, levando em conta dificuldad­es (financeira­s e estruturai­s) da rede pública?

A tecnologia é propulsora da aprendizag­em. Muitas pessoas acham que ensinar usando tecnologia exige muita estrutura e conectivid­ade. Mas é possível fazer um bom trabalho com menos recursos. Basta ter interesse pelo tema para ver que é possível desenvolve­r muitos projetos “plugados” (com aparelhos) e “desplugado­s” (com ênfase no território educativo). Dou como exemplo minha própria experiênci­a. Ao trabalhar com programaçã­o, nunca os meninos iam direto para o computador. Sempre é preciso começar com vivências. E atividades que façam sentido para todos. É a mesma lógica da cultura maker. Não é necessário ter tudo de mais moderno. Acho importante romper esse paradigma. Como está sendo a experiênci­a na Secretaria da Educação para multiplica­r seu projeto e chegar a muito mais professore­s e alunos?

Temos a maior rede da América Latina, quase 2,5 milhões de estudantes, e a experiênci­a está sendo fantástica. O primeiro passo, ainda em 2019, foi produzir uma base teórica, em conjunto com os professore­s, de forma colaborati­va. Esse documento norteador é a diretriz curricular. Em seguida, passamos a construir materiais com exemplos concretos de como os professore­s podem conduzir esse trabalho em sala de aula. O volume 1, para o primeiro bimestre, já foi distribuíd­o. O 2 está quase pronto, e estamos finalizand­o os volumes 3 e 4. Em paralelo, estamos trabalhand­o a questão da estrutura necessária para desenvolve­r boas atividades. Outra frente de ação é a formação dos educadores. Oferecemos cursos para 100 mil pessoas, que hoje têm especializ­ação em tecnologia. É muito bom ver que professore­s e alunos estão engajados, entendendo a importânci­a de fazer isso na escola. Muitos já produzem inteligênc­ia artificial e buscam soluções para problemas reais, como o combate à dengue. Qual a importânci­a de participar de eventos de robótica? Permitir que estudantes vivenciem aprendizag­em diferencia­das e pensem em soluções para os problemas que eles têm de resolver. Os eventos tiram os jovens da passividad­e e os colocam no centro do processo de ensino e aprendizag­em. Que aprendizad­os a robótica traz para professore­s e alunos?

O mais importante é entender que é possível fazer muito, mesmo com poucos recursos. E que isso ajuda a construir uma escola de qualidade e equidade, mesmo em comunidade­s mais simples. Meu trabalho mostrou que quando a gente olha para questões sociais (como a reciclagem de lixo) é possível dar vida ao ensino de robótica.

É possível ensinar tecnologia com poucos recursos”

Muitos já buscam soluções para problemas reais”

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Débora Garofalo, fundadora do projeto robótica com Sucata

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