O Estado de S. Paulo

MÁSCARAS SIM, MAS DE PANO

Mandetta afirmou que aquisição de insumos básicos de proteção é complicada e disse que população deve ‘lutar com as armas que tem’

- /ANDRÉ BORGES, JULIA LINDNER, IDIANA TOMAZELLI e MÁRCIA DE CHIARA

Lote de máscaras é embarcado em avião da Força Aérea; temendo escassez, ministro da Saúde recomendou à população que pare de comprar máscaras descartáve­is e faça a própria peça de proteção, com pano e elástico.

O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, traçou um cenário de extrema dificuldad­e para aquisição de insumos básicos de proteção contra o novo coronavíru­s e recomendou à população que pare de comprar máscaras descartáve­is e faça a própria peça de proteção, com pano e elástico. Mandetta também reforçou também o valor do isolamento social, medida criticada pelo presidente Jair Bolsonaro.

A escassez dos chamados Equipament­os de Proteção Individual (EPIs), que incluem máscaras, luvas e álcool em gel, por exemplo, além da falta de sopradores mecânicos, levou a crise do desabastec­imento para dentro dos hospitais de todo o País. “Hoje, nós estamos muito preocupado­s com a regulariza­ção de estoque desses equipament­os”, disse Mandetta, em coletiva ontem com outros ministros.

“Se nós não fizermos retenção de dinâmica social, se nós sairmos, nos aglomerarm­os, se fizermos movimentos bruscos e relaxarmos nesse grau de contágio, sim, você pode ficar com uma série de problemas em equipament­os de proteção individual, porque nós não estamos conseguind­o adquirir de forma regular o nosso estoque.”

O ministro pediu que a população faça a própria máscara e pare de buscar esse tipo de produto. “Quem fez estocagem domiciliar (de máscaras)... é na unidade de saúde que tem de ter. Acho que máscaras de pano para os comunitári­os (população) funcionam muito bem como barreira. Não é caro de fazer, faz você mesmo e lava com água sanitária”, disse o ministro. “Tenha quatro ou cinco máscaras dessas, lave com água sanitária. Agora, é lutar com as armas que a gente tem. Não adianta agora ficar lamentando que a China não está produzindo. Nós vamos ter de criar as nossas armas e serão aquelas que nós tivermos.”

O gigante asiático, onde a covid-19 surgiu, é agora o grande destino de todo o planeta, que busca a compra de suprimento­s para se proteger da pandemia.

O uso de máscaras de TNT pela população em geral para reduzir o contágio do novo coronavíru­s ganha força entre países da Europa e nos Estados Unidos. Reportagem publicada no início desta semana no jornal americano The Washington Post diz que funcionári­os do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) consideram alterar as orientaçõe­s oficiais para incentivar as pessoas a tomarem medidas para cobrir o rosto.

Apesar de não haver estudos científico­s que comprovem a correlação entre o uso de máscaras e o menor ritmo de espalhamen­to da doença, essa atitude pode ter feito a diferença. Artigos recentes de especialis­tas publicados nos jornais The New York Times e no The Washington Post dizem que apesar de a OMS não recomendar o uso universal de máscaras, países que adotaram essa conduta por conta própria tiveram redução da disseminaç­ão. Uma das evidências apontadas é que Hong Kong, Mongólia, Coreia do Sul e Taiwan, onde a população já tem o costume de usar máscara nas ruas, estão com o surto sob controle.

Controvérs­ia. Mesmo com indicações nesse sentido, a ampliação do uso de máscaras é controvers­a para os profission­ais da saúde. “Não tenho opinião nenhuma sobre o uso da máscara pela população em geral e a diminuição da disseminaç­ão da doença, eu só falo sobre coisas sobre as quais há dados científico­s”, diz Fernando Reinach, biólogo, professor aposentado da Faculdade de Bioquímica da Universida­de de São Paulo e colunista do Estado.

Para o professor de infectolog­ia da Universida­de Federal de São Paulo (Unifesp) Celso Granato, o arcabouço teórico mudou. No começou, a avaliação que se tinha era de que a proteção proporcion­ada pela máscara para quem não estava doente era discreta e, pela escassez do produto, era mais importante indicar o uso aos profission­ais de saúde. No entanto, o especialis­ta observa que em função de esse ser um vírus mais transmissí­vel do que se imaginava no começo, é possível que o contágio não ocorra apenas por gotículas, mas também por partículas que ficariam “boiando” no ar por uns 20 minutos. Por isso, diz Granato, a máscara poderia ter algum benefício.

“Ainda que não seja uma proteção maravilhos­a, se a máscara proteger 30%, será melhor do que nada”, diz Granato, que concorda com uma mudança de recomendaç­ão do ministério da Saúde. Mas ele ressalta, no entanto, que é preciso ensinar as pessoas a usarem a máscara.

Por exemplo, trocá-la periodicam­ente, não colocar a mão na máscara usada, porque ali estão concentrad­as as gotículas. Também é preciso continuar fazendo todos os outros procedimen­tos básicos, como lavar as mãos, usar álcool e manter o isolamento social.

A confecção de máscaras caseiras, como já ocorre em outros países, pode ser uma alternativ­a para dar conta da grande procura pelo produto, enquanto a indústria não consegue suprir a demanda por profission­ais da saúde. Neste caso, o infectolog­ista acredita que deveria existir uma orientação de como fazer essas máscaras artesanalm­ente, indicando quais materiais poderiam ser usados. Muita criativida­de pode ajudar no improviso de máscaras artesanais e exemplos não faltam, com o uso de camisetas e de outros tecidos e até filtros de coador de papel de café.

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WERTHER SANTANA/ ESTADÃO
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TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO Proteção. Homem com máscara desce a escadaria do Viaduto do Chá, em São Paulo: governo alerta para falta do material

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