Estudo liga isolamento a evolução mais lenta da pandemia no País.
Pesquisa alerta, porém, para subnotificação; pico de casos deve ser entre os dias 25 e 30
A epidemia da covid-19 no Brasil evolui de forma mais controlada do que em outros países, como China, Itália, Espanha e Estados Unidos. Esse crescimento mais lento no número de casos estaria relacionado ao fato de o País ter tomado as medidas de contenção logo no início. Mas especialistas alertam para o risco da subnotificação.
As conclusões estão na quinta nota técnica do grupo de especialistas da PUC-RJ, da Fiocruz e do Instituto D’Or, o Núcleo
de Operações e Inteligência em Saúde (NOIS), que acompanha a evolução da covid-19 no Brasil na comparação com outros países. “O isolamento funciona e está funcionando”, afirmou o infectologista Fernando Bozza, da Fiocruz e do Instituto D’Or, um dos autores do levantamento. “O cenário era para ser pior, não há a menor dúvida.”
Segundo ele, é crucial que as medidas de isolamento sejam mantidas de forma rigorosa pelas próximas duas semanas porque o pico da epidemia no País deve ocorrer entre os dias 25 e 30 de abril. “É agora que precisamos ter mais cuidado: o único trunfo que temos é o isolamento. Se afrouxarmos essas medidas não haverá leitos para todos”, disse Bozza. “O pior ainda está por vir.”
Subnotificação. De acordo com os especialistas que participaram do levantamento, no entanto, parte do crescimento controlado pode ser atribuído também à subnotificação e à demora na notificação dos casos. O problema seria mais grave em São Paulo, onde haveria mais de 15 mil exames ainda atrasados.
O grupo faz projeções de curto prazo em três cenários: otimista, mediano e pessimista. A nova nota, divulgada ontem, afirma que, entre os dias 21 e 22, os casos confirmados no País passaram à predição pessimista, ao indicar um rápido crescimento do coronavírus em relação aos demais países. Contudo, nos dois dias subsequentes, os casos confirmados estiveram entre o cenário mediano e o pessimista, o que demonstrou uma tendência de diminuição do crescimento. Essa tendência foi confirmada entre o dia 24 e esta segunda-feira, quando os valores realizados estiveram entre o cenário otimista e o mediano.
De acordo com o trabalho, assinado por 14 especialistas, “embora parte deste efeito possa se dever às medidas de contenção, ressalta-se que o Brasil apresenta duas dificuldades na mensuração do total de casos positivos identificados: ausência de uma política de testagem ampla e o atraso na obtenção dos resultados e notificações”. Ainda de acordo com o levantamento, “a primeira afirmação deve-se ao fato de não haver testes suficientes para analisar a evolução da doença na população”. “Já a segunda se deve ao aumento da demanda por testes, associada à falta de recursos e mão de obra qualificada para efetuar uma análise rápida.”
Questão local. Essa dificuldade seria especialmente mais presente em São Paulo. O Estado terminou o período analisado com 1.517 casos confirmados, abaixo até mesmo do cenário otimista previsto anteriormente, indicando uma tendência de crescimento semelhante à do cenário otimista. No entanto, sustenta o relatório, há relatos de um grande número de investigações em atraso no Instituto Adolfo Lutz
“São Paulo está abaixo do previsto mesmo no cenário otimista”, diz Bozza. “Está havendo um represamento na liberação dos exames em São Paulo; como o número de casos por lá é muito grande, isso complica as projeções: essa liberação dos dados precisa ser mais ágil.”