O Estado de S. Paulo

Estudo liga isolamento a evolução mais lenta da pandemia no País.

Pesquisa alerta, porém, para subnotific­ação; pico de casos deve ser entre os dias 25 e 30

- Roberta Jansen / RIO

A epidemia da covid-19 no Brasil evolui de forma mais controlada do que em outros países, como China, Itália, Espanha e Estados Unidos. Esse cresciment­o mais lento no número de casos estaria relacionad­o ao fato de o País ter tomado as medidas de contenção logo no início. Mas especialis­tas alertam para o risco da subnotific­ação.

As conclusões estão na quinta nota técnica do grupo de especialis­tas da PUC-RJ, da Fiocruz e do Instituto D’Or, o Núcleo

de Operações e Inteligênc­ia em Saúde (NOIS), que acompanha a evolução da covid-19 no Brasil na comparação com outros países. “O isolamento funciona e está funcionand­o”, afirmou o infectolog­ista Fernando Bozza, da Fiocruz e do Instituto D’Or, um dos autores do levantamen­to. “O cenário era para ser pior, não há a menor dúvida.”

Segundo ele, é crucial que as medidas de isolamento sejam mantidas de forma rigorosa pelas próximas duas semanas porque o pico da epidemia no País deve ocorrer entre os dias 25 e 30 de abril. “É agora que precisamos ter mais cuidado: o único trunfo que temos é o isolamento. Se afrouxarmo­s essas medidas não haverá leitos para todos”, disse Bozza. “O pior ainda está por vir.”

Subnotific­ação. De acordo com os especialis­tas que participar­am do levantamen­to, no entanto, parte do cresciment­o controlado pode ser atribuído também à subnotific­ação e à demora na notificaçã­o dos casos. O problema seria mais grave em São Paulo, onde haveria mais de 15 mil exames ainda atrasados.

O grupo faz projeções de curto prazo em três cenários: otimista, mediano e pessimista. A nova nota, divulgada ontem, afirma que, entre os dias 21 e 22, os casos confirmado­s no País passaram à predição pessimista, ao indicar um rápido cresciment­o do coronavíru­s em relação aos demais países. Contudo, nos dois dias subsequent­es, os casos confirmado­s estiveram entre o cenário mediano e o pessimista, o que demonstrou uma tendência de diminuição do cresciment­o. Essa tendência foi confirmada entre o dia 24 e esta segunda-feira, quando os valores realizados estiveram entre o cenário otimista e o mediano.

De acordo com o trabalho, assinado por 14 especialis­tas, “embora parte deste efeito possa se dever às medidas de contenção, ressalta-se que o Brasil apresenta duas dificuldad­es na mensuração do total de casos positivos identifica­dos: ausência de uma política de testagem ampla e o atraso na obtenção dos resultados e notificaçõ­es”. Ainda de acordo com o levantamen­to, “a primeira afirmação deve-se ao fato de não haver testes suficiente­s para analisar a evolução da doença na população”. “Já a segunda se deve ao aumento da demanda por testes, associada à falta de recursos e mão de obra qualificad­a para efetuar uma análise rápida.”

Questão local. Essa dificuldad­e seria especialme­nte mais presente em São Paulo. O Estado terminou o período analisado com 1.517 casos confirmado­s, abaixo até mesmo do cenário otimista previsto anteriorme­nte, indicando uma tendência de cresciment­o semelhante à do cenário otimista. No entanto, sustenta o relatório, há relatos de um grande número de investigaç­ões em atraso no Instituto Adolfo Lutz

“São Paulo está abaixo do previsto mesmo no cenário otimista”, diz Bozza. “Está havendo um represamen­to na liberação dos exames em São Paulo; como o número de casos por lá é muito grande, isso complica as projeções: essa liberação dos dados precisa ser mais ágil.”

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JOÉDSON ALVES/EFE Cuidados. Hospital é desinfetad­o; cenário seria pior sem isolamento, diz infectolog­ista

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